Na véspera da reunião do Copom (Comitê de Política Monetária), que deve manter os juros inalterados em 15% ao ano, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) retomou a carga sobre o Banco Central pela redução da Selic. Durante participação em evento do Banco J.Safra nesta terça-feira, 16, Haddad afirmou em duas oportunidades que a taxa deve cair nos próximos meses e de maneira sustentável. A maioria do mercado, entretanto, aposta que o processo de cortes só terá início em 2026.
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O ministro disse acreditar que, superada a alta no IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) no primeiro semestre que preocupou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e levou a autoridade monetária a levar a taxa 15% ao ano, o ciclo de cortes pode ser iniciado.
“Eu acredito que superada essa fase que nós vivemos no primeiro semestre, de uma inflação que causou uma preocupação grande no presidente da República e uma reação do Banco Central, nós vamos entrar numa trajetória de queda de juros com sustentabilidade”, afirmou Haddad.
No mesmo painel, Haddad ressaltou que a queda no preço do dólar favorece o controle da inflação e abre espaço para a redução da Selic nos próximos meses.
“Nós estamos com o câmbio a R$ 5,30. Isso é muito positivo. O impacto do câmbio sobre a inflação é notável no Brasil. Eu penso que nós estamos reancorando as expectativas de inflação. Acredito que vai se abrir um espaço para a queda dos juros. Não sou do Banco Central, mas tudo me leva a crer que o ciclo de corte de juros vai se iniciar em algum momento dos próximos meses, não sei precisar quando. Não é da minha alçada”, disse.
Curva de juros mostra queda em 2026
Apesar das pressões governistas, o mercado ainda avalia que a redução da Selic só deve ocorrer no próximo ano. Para o economista Tony Volpon, ex-diretor do BC, as falas de Haddad são um sinal de que o governo quer dar um “empurrãozinho” e expressar sua visão de que o ciclo de corte da Selic deveria começar antes do que o economistas e investidores precificam.
Entretanto, ele afirmou que é improvável que a queda ocorra nos próximos meses, como esperado pelo ministro da Fazenda. Segundo Volpon, a previsão, com base na curva de juros futuros, é de início do ciclo de corte somente a partir de maio de 2026.
“Antes de cortar os juros, o BC precisa mostrar ao mercado uma projeção crível de convergência da inflação para algo mais perto da meta, não necessariamente o objetivo central. E que essa convergência não seria revertida ou negada por algum tipo de ajuste no nível da taxa. Essa decisão e essa estratégia são do próprio Galípolo (Gabriel Galípolo, presidente do BC). É importante entender como ele quer conduzir esse processo e como ele vê os impactos na credibilidade da própria instituição, que não é diferente da sua. Ele não quer ser acusado de cortar de maneira precoce ou política”, disse.
Haddad não é o primeiro crítico
O economista-chefe da Genial Investimentos, José Márcio Camargo, lembra que as declarações de Haddad se somam às manifestações recentes pela queda de juros do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do ex-ministro José Dirceu, do ministro do Trabalho, Luiz Marinho, da ministra de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, e do líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ).
“Claramente há uma pressão do governo e do Haddad pela queda de Selic. Eu espero que o Galípolo tenha poder e força suficientes para manter os juros inalterados enquanto achar necessário. Essa decisão de corte da taxa tem que ser técnica. Nesse momento, ele nem deveria sinalizar que pretende iniciar a queda de juros daqui a uma ou duas reuniões. Ele deve manter a comunicação igualmente dura”, defendeu.
A retomada da carga sobre o BC pelo corte de juros ocorre após uma trégua oferecida a Galípolo por Lula e Haddad, que eram vozes ativas pela redução da Selic durante a gestão de Roberto Campos Neto na presidência da autoridade monetária. Nos dois primeiros anos do mandato, o presidente da República fez duras críticas a Campos Neto e à taxa vigente