A equipe econômica ficou refém do “protocolo de silêncio” imposto pela Fazenda para se proteger do fogo amigo dentro do governo e, agora, tenta desfazer o clima de desconfiança que a trapalhada em torno da elevação do IOF criou com o mercado financeiro.
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Durante a entrevista da semana passada para anunciar os cortes no orçamento, o próprio ministro Fernando Haddad fez questão de destacar que, “na Fazenda e no Planejamento, as pessoas sabem que têm o dever funcional de guardar sigilo”. “É uma questão de protocolo”, frisou.
A afirmação foi uma resposta aos questionamentos de jornalistas sobre declarações dadas minutos antes pelo ministro Renan Filho (Transportes) antecipando a elevação do imposto, que seria anunciada após as 17 horas, quando as operações no mercado financeiro já estivessem encerradas, para evitar impacto na bolsa ou no mercado de câmbio.
O “protocolo” antivazamento é uma política da gestão Haddad, marcada por uma tentativa de controlar conversas externas de toda a equipe sobre temas sensíveis. Há, inclusive, recomendações expressas do gabinete para que os secretários, nesses casos, só façam declarações oficiais.
O que, inicialmente estava focado no relacionamento com a imprensa foi ampliado após o debate do pacote fiscal no final de 2024, atingindo até mesmo colegas de outros ministérios e do governo em geral. Na linha do dito popular de que gato escaldado tem medo de água fria, Haddad e seu time temem ver propostas ainda em análise serem bombardeadas antes mesmo de serem submetidas à avaliação do presidente Lula.
A equipe econômica acredita que o fogo amigo em torno de temas delicados, como a desvinculação do crescimento dos gastos com saúde e educação das receitas oficiais, por exemplo, inviabilizou a medida no nascedouro. Desde então, o “protocolo” foi reforçado.
Desta vez, Haddad levou a proposta de compensar a frustração de receita com o aumento do IOF à discussão do Palácio do Planalto evitando que o Banco Central, contrário à medida, opinasse previamente.
Quebra de combinado
A polêmica ficou por conta do aumento do IOF para as aplicações dos fundos de investimento no exterior. O BC é radicalmente contra e, algumas vezes, negou em conversas com analistas e investidores que qualquer medida nesse sentido seria adotada.
O anúncio da elevação na semana passada quebrou o combinado. “Para quem investe, foi a pior coisa porque, agora, ficou a sensação de que isso pode ser adotado, sim, a qualquer momento que o governo precisar arrecadar mais”, avalia o diretor de um grande banco. “O governo cruzou uma linha que é difícil voltar atrás, apesar de a medida ter sido anulada.”
O Ministério da Fazenda se esforça para desfazer o mal-entendido. “Mas a dúvida é a certeza, agora”, diz o mesmo executivo. Nesta terça-feira, 27, um questionamento feito nas mesas de operação era sobre o que pode acontecer, por exemplo, se Haddad deixar o ministério para se candidatar para o Senado Federal e outro ministro assumir o cargo.
Outro argumento do ministério é que, com a autonomia do Banco Central, a autoridade monetária não é mais “integrante da equipe econômica” e, com isso, não há obrigação de se discutir ou negociar previamente com os diretores da instituição. Ao contrário, o BC deve lidar com os fatos dados. E o “conceito” das medidas, observam os técnicos, envolvia corrigir distorções na cobrança do IOF e alinhar as políticas fiscal e monetária. Não funcionou e o medo do fogo amigo levou a um tiro no pé.