Players de investimentos globais, principalmente aqueles institucionais, estão aumentando suas apostas em títulos públicos da Argentina e da Turquia. Analistas creem que medidas de ambos os governos estão diminuindo os riscos de calote desses países e, em paralelo, prometendo retornos exponenciais.

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Em determinadas obrigações de baixa notação, como a Argentina, por exemplo, o potencial de valorização vai além do ambiente global de taxas de juro, inflação e crescimento. Por isso, investidores estão acompanhando de perto as medidas do novo presidente da Argentina, Javier Milei, que promete libertar a economia do país da inflação, atualmente acima dos 211% ao ano.

Neste mês, o país sul-americano conseguiu entregar US$ 1,5 bilhão em pagamentos de juros aos detentores de títulos e fechar um acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) que desbloqueia cerca de US$ 4,7 bilhões em financiamento.

Entre as condições acordadas com o FMI, a Argentina buscará um superávit fiscal primário de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano. Além disso, Milei prepara mais medidas para levantar a economia do país.

Com isso, os títulos públicos argentinos subiram na semana passada devido às notícias positivas sobre o pagamento da dívida e o acordo com o FMI. O rendimento extra que os investidores exigem para manter a dívida do país caiu, em média, para 19 pontos percentuais em relação aos títulos do Tesouro dos EUA, face a 27 pontos percentuais em outubro, segundo dados do J.P. Morgan.

Já na Turquia, o presidente do país, Recep Erdogan, traçou um caminho para a elaboração de políticas ortodoxas, nomeando antigos banqueiros de Wall Street para cargos governamentais. Então, o banco central turco começou a aumentar as taxas de juros.

A dívida do país em dólares proporcionou ganhos de 18% no ano passado, e o rendimento extra que os investidores exigem para as obrigações despencou desde a reeleição de Erdogan, de acordo com dados do JPMorgan. Na sexta-feira, 12, a Moody’s Investors Service elevou a perspectiva da classificação de crédito do país para positiva, citando mudanças decisivas na política econômica.

Exposição a investimentos de alto risco

Para o sócio do multi family office, RC Wealth Management, João Atem, o movimento dos investidores ocorre pelo fato de competidores globais de Argentina e Turquia, entre eles Brasil, México e Rússia, terem se tornado inviáveis no sentido de um upside [quando o fôlego dos investimentos se esgotam e os rendimentos diminuem] para rentabilidades altas.

“O investidor, principalmente aquele institucional, está sempre buscando oportunidades de ganhos exponenciais. Quando se trata de títulos públicos, você deve olhar para o risco soberano e para o poder fiduciário daquela economia. Olhando hoje para Turquia e Argentina, eles chegaram a um patamar de retorno muito alto. No entanto, a alocação desses recursos deve estar atrelada à confiança na capacidade daqueles países em pagar as dívidas num futuro próximo”, avalia.

Segundo Atem, cerca de 98% do mercado global aloca seus recursos em países ocidentais. O índice aumentou após a Rússia, antes considerado um país emergente relevante no cenário financeiro, entrar em uma guerra contra a Ucrânia e acabar se isolando de países europeus e ocidentais.

Já o México, um concorrente natural de Argentina, Turquia e Brasil, aplicou nos últimos anos algumas políticas econômicas de controle fiscal, atraindo investidores por seus títulos, mas chegou ao seu upside.

“Vejo o Brasil seguindo um caminho contrário”, comenta Atem. Ainda segundo o analista, apesar do alto risco dos títulos turcos e argentinos, atualmente eles representam ‘a menina dos olhos’ do mercado global, pois “estão garantindo retornos consideráveis e apresentando mais garantias de pagamento de suas dívidas, além de maior controle fiscal”, complementa.

Risco para investimentos de pessoa física é maior

Conforme explica o diretor de negócios da Comdinheiro/Nelogica, Filipe Ferreira, geralmente, em títulos de divida, o rendimento está atrelado a probabilidade de default (chance do credor que está tomando a dívida não realizar os pagamentos). Ele concorda que os títulos das dívidas argentina e turca estão pagando mais porque há altas chances de serem pagas ou, ao menos, não nos termos acordados.

“Isso explica por que esse mercado é acompanhado por players globais. Será que vale a pena? Grandes players possuem uma carteira diversificada, pois se você perde um titulo ou recebe um calote, terá outros títulos sustentando seu portfólio”, afirma.

Ferreira entende que o risco para o investidor pessoa física é ainda mais alto, e ressalta que o jogo do mercado financeiro é para “especialistas”.

“Uma pessoa física entrar pelo número face ou apenas pelo rendimento alto é um baita problema. Especialmente se entrar com parte representativa do seu patrimônio. Não faz sentido uma pessoa física colocar seu recurso num título desse sem conhecer. Considero que é um risco semelhante ao de ganhar na Mega-Sena. Agora, para fundos experientes, se tudo correr conforme as reformas que estão em andamento nesses países, o retorno realmente pode ser bastante significativo”, completa Ferreira.