Uma das atuais características dos filmes do cineasta americano Woody Allen é entremeá-los com um institucional sobre a cidade que abriga as cenas da sua história. Ele se aproxima do prefeito da cidade, pede apoio e dinheiro para fazer seu longa e acaba dando uma boa colher de chá para o turismo local. Tem sido assim desde o londrino Ponto-Final – Match Point, de 2005. Em seu último lançamento, Meia-Noite em Paris, em cartaz no Brasil, aconteceu uma particularidade. Como Allen costuma viajar com as duas filhas pequenas, sua mulher, Soon-Yi, fez questão de se hospedar em um hotel que tivesse cozinha no quarto. O Le Bristol foi o escolhido por atender a essa exigência e por outros atrativos, que o credenciaram a, inclusive, virar um dos cenários do filme. 

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Estadia palaciana: na suíte della Gherardesca, do Four Seasons de Florença,
o hóspede usufrui de 234 m2 de luxo e história renascentista por 15 mil euros

O Bristol  ocupa uma construção que data do século 18, cujo terreno pertenceu ao rei Luís XV (1710-1774), e que, desde os primórdios, serviu de hotel ou residência para nobres. As festas dadas por um de seus antigos proprietários, o conde Jules de Castellane, marcaram a história de Paris. Atualmente propriedade da família alemã Oetker, a mesma das farinhas e gelatinas, depois de uma reforma que custou 5 milhões de euros, o hotel ganhou ainda mais ares de um lar aristocrático e virou um dos grandes marcos da hotelaria de luxo da Cidade Luz.  A diária de sua suíte mais cara, com cerca de 300 m2, vale 12,6 mil euros. “Lógico que o tamanho dos dormitórios, a tecnologia embutida neles e as obras de arte expostas dimensionam a sofisticação de um hotel”, diz Didier Le Calvez, CEO do Le Bristol. “Mas o luxo mesmo está no intangível.” 

Explorando ao máximo sua alma aconchegante de bem receber, essa casa itinerante de milionários tem abrigado hóspedes como o casal Brad Pitt e Angelina Jolie, com os filhos, e residentes como a socialite brasileira Bethy Lagardère, viúva do magnata francês Jean-Luc Lagardère (1928-2003), que atualmente faz de uma das suítes do lugar seu endereço fixo. A modelo Luiza Brunet recentemente tomou café na suíte de Bethy. “O atendimento é espetacular desde o minuto em que se coloca o pé no hotel”, diz a modelo e empresária, para quem a primeira impressão é fundamental. As duas, bem como outros habitués do lugar, conhecem um morador muito particular. Trata-se de Fa-raon, um gato da raça sagrado-da-birmânia. Ele circula por entre as pernas de quem se hospeda e vive no Le Bristol, todo empertigado e paramentado com uma coleira que leva as novas cores do hotel, verde-limão e rosa. Uma peculiaridade de casas aconchegantes.   

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Entre e fique à vontade: o Le Bristol, em Paris, oferece aconchego em suítes de até 300 m2 (à esquerda).
“O luxo está no inatingível”, diz Didier Le Calvez, CEO do hotel (à direita)

Quando se trata de fazer o hóspede se sentir em casa, poucos espaços têm mais importância do que o banheiro. Afinal, é nesse ambiente que ele irá estar mais vulnerável e, portanto, é onde também precisa se sentir extremamente à vontade e confortável. Pensando nisso, o tradicional Palazzo Sasso, na Costa Amalfitana, Itália, investiu 1 milhão de euros na reforma de seus 43 banheiros. “Abastecemos todos com produtos de linhas diferentes da Bulgari, das quais o hóspede escolhe os que mais lhe convêm”, diz Aaron Kaupp, gerente geral do hotel, instalado num palácio do século 12. 

Oferecer serviços e ambientes únicos, mesmo que em espaços gigantescos, tem sido a tendência das grandes bandeiras hoteleiras internacionais. “É de suma importância oferecermos aos hóspedes uma extensão de sua casa”, afirma Bernard Lackner, gerente-geral do Plaza Athénèe, de Nova York, que oferece suítes a preços que vão de US$ 495 a US$ 11 mil (cobertura). A canadense Four Seasons, que este ano completa 50 anos, também consegue levar a casa de milionários para dentro de suas exuberantes penthouses espalhadas pelo mundo. A cobertura Ty Warner, do FS de Nova York abriga, em seus 400 m2, um jardim com espelho d’água, spa privativo, biblioteca e outros cômodos luxuosamente decorados.

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Casas de milionários: 1. Nos banheiros do Palazzo Sasso, na Itália, produtos Bulgari no banheiro
2. Na suíte Ty Warner, do Four Seasons de Nova York, sala com biblioteca e vista 360 da cidade por US$ 35 mil a diária

Ou seja, mais do que uma suíte de hotel, é um apartamento. Além do luxo e da riqueza de seus elementos, inclui serviços e mordomias que deixariam recém-chegados ao mundo encantado do alto luxo, como os empresários Eike Batista e André Esteves,  morrendo de inveja. Faz parte da lista de mimos, ligações telefônicas globais ilimitadas, mordomo particular, personal trainer e um Rolls-Royce Phantom, com motorista particular, à disposição. Para completar, o menu fornecido é assinado pela equipe do badalado chef francês Joël Robuchon, que mantém um restaurante no andar térreo do hotel. Claro que, tudo isso, tem um preço, à altura: US$ 35 mil a diária. 

Também, para quem voa e pensa alto, o Four Seasons de Florença oferece noites de reis e rainhas. A modalidade está disponível a quem se hospeda na suíte della Gherardesca. Localizada na ala antiga do Palazzo della Gherardesca, o espaço de 234 m2 foi todo restaurado de maneira a manter a atmosfera florentina da renascença, período de construção do local. Os afrescos espalhados pela suíte não deixam o hóspede se esquecer disso nem por um minuto. Além de dois quartos, abriga uma sala de jantar para oito pessoas. Ou seja, é possível organizar até um baile de máscaras en petit comité.   

A palavrinha que traduz essa nova hotelaria de luxo é serviço. “O setor chegou a um ponto de oferecer serviços de chefs renomados que cozinham dentro do quarto”, afirma Roberto Miranda, reitor de escola paulistana que leva seu nome e ministra MBAs em hotelaria de luxo. Segundo Miranda, há hotéis que preparam até trilha sonora e aromas de ambiente identificados com o perfil do hóspede. Tudo para que o fazer e desfazer de malas seja o mais prazeroso  possível. Luxo é viajar sem, teoricamente, sair de casa. 

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