Nem o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), nem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O político mais seguido no TikTok no Brasil é o deputado federal Tiririca (PL-SP). Levantamento feito pela Universidade Federal Fluminense (UFF) a pedido do Estadão mostra que, entre os dez políticos mais seguidos na plataforma de vídeos curtos, prevalecem os parlamentares que são de centro ou e de direita, e que defendem, no geral, a pauta da defesa dos animais e da segurança pública.

O Centrão tem seis do top 10 políticos brasileiros no aplicativo que tem 88,3 milhões de usuários apenas no Brasil. Bolsonaro (5,5 milhões) e Lula (4,3 milhões), ocupam, respectivamente, a segunda e terceira posições do ranking. Tiririca é seguido por 6,1 milhões de pessoas.

Diferente dos demais, Tiririca desponta no TikTok sem falar de política. Ele publica vídeos de humor, de dancinhas e de memes, seguindo uma tendência particular do uso da plataforma no Brasil: políticos que quiserem ter mais alcance precisam falar de algo além da política. O que não significa que não se beneficie disso para se eleger.

“O TikTok tem uma funcionalidade diferente das demais redes”, afirma Viktor Chagas, professor da UFF, responsável pelo levantamento. “Há, no TikTok, uma grande quantidade de políticos que atuam muito no sentido de trabalhar uma linguagem que simultaneamente despolitiza e politiza. Eles estão trabalhando com uma dimensão muito próxima do humor e da denúncia.”

Lula é o único político de esquerda entre os 10 políticos mais seguidos e está à frente do quarto colocado, o deputado Delegado Matheus Laiola (União-PR), por apenas 200 mil seguidores. Veja o resto da lista abaixo.

Enquanto a esquerda ignora o TikTok, a direita tem utilizado a ferramenta para atrair os jovens. Um levantamento do Núcleo de Tecnologia do Departamento de Comunicação da Pontifícia Universidade Católica (PUC) Rio mostra que, na Argentina, Javier Milei tem sete vezes mais presença no TikTok do que Patricia Bullrich e 34 vezes mais do que Sergio Massa, seus principais adversários.

Lá, Milei usa da ferramenta do diálogo direto e espontâneo. Os vídeos costumam seguir um padrão. Uma voz faz uma pergunta e ele responde, de imediato, em imagens gravadas em ambientes públicos, fora de estúdios. No final de cada produção, o candidato presidencial grita um bordão que se tornou lema da sua candidatura na Argentina: “Viva la libertad carajo”.

“Javi (apelido do candidato), para quê você será presidente?”, pergunta uma voz. “Vou ser o presidente dos argentinos para terminar com a decadência que dura mais de dez anos”, afirmou. O vídeo tem 7 milhões de visualizações e repete um questionamento comumente feito no perfil dele na plataforma.

“O TikTok faz aflorar o tipo de conteúdo feito em linguagem descontraída, há um ambiente que favorece aquele que produz um conteúdo no calor do acontecimento, de uma forma direta ou coloquial, ainda que, na verdade, seja um conteúdo extremamente planejado”, afirma Viktor Chagas, pesquisador da UFF.

No Brasil, Lula é o único político de esquerda que tem mais de 1 millhão de seguidores no TikTok. A direita foi mais ágil e consolidou espaço enquanto o aplicativo crescia no País. Como mostrou o Estadão, estudo do Laboratório de Combate à Desinformação e ao Discurso de Ódio em Sistemas de Comunicação em Rede (DDosLAB) da UFF detectou 300 políticos com conta no TikTok, com 265 contas ativas que somam mais de 23 mil vídeos. Há quase duas vezes mais políticos de direita do que de esquerda na rede social. O primeiro grupo tende, estatisticamente, a acumular mais seguidores e mais curtidas.

União Brasil é o partido com mais políticos no top 10 mais seguidos

No Congresso, o deputado Matheus Laiola é totalmente desconhecido. Mas no TikTok ele fala com 4,1 milhões de pessoas. Na rede social, mostra suas ações como deputado, dá dicas de cuidados com pets e denuncia maus-tratos aos animais. Os conteúdos alcançam, em média, 20 mil a 30 mil pessoas. No primeiro mandato, foi eleito com 132 mil votos no rastro dos seus vídeos.

O número de seguidores de Laiola no TikTok é oito vezes superior à sua conta no Instagram, rede mais utilizada pelos políticos brasileiros.

O grande diferencial do aplicativo em relação a outras plataformas é a duração dos vídeos, com possibilidade de fazer edições, além de oferecer a opção de inserção de recursos interativos, que vão de enquetes a lives. Se antes a plataforma era de vídeos com “dança e coreografia”, hoje ela pode oferecer informação imediata.

Aos 27 anos, Kim Kataguiri (União-SP), é o mais jovem entre os políticos brasileiros mais influentes no Tiktok. “Hoje, no Brasil, a rede social elege presidente da República, como foi com Bolsonaro. Quem não souber usar as redes está politicamente morto”, sentencia.

Um dos fundadores do Movimento Brasil Livre (MBL), Kim usa a rede para publicar memes, provocações a Lula e à esquerda e divulgar o trabalho como deputado federal. Ele disse acreditar que os memes feitos pelo MBL no passado serviram como uma “vanguarda” que ajudou a criar um formato hoje também seguido por Lula, Bolsonaro e demais políticos.

Hoje, no Brasil, a rede social elege presidente da República, como foi com Bolsonaro. Quem não souber usar as redes está politicamente morto

Kim Kataguiri (União-SP)

São com os memes, aliás, que Kim tem mais facilidade de “hitar” e alcançar mais pessoas. Um vídeo publicado por ele, em que faz uma crítica social ao comparar desenhos atuais com os do passado, tem 5,3 milhões de visualizações.

“A principal função dessas redes, em especial o TikTok, é alcançar públicos novos, pessoas que não conhecem o seu trabalho. A pessoa vê um vídeo seu, vê outro, até que no terceiro quer saber quem é e segue o perfil”, afirma. “Eu gosto muito de fazer paródia de abertura de anime (desenho japonês). Onde mais viralizava é o TikTok. O público de 16 a 25 anos assiste em massa isso.”

Em uma pesquisa do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) publicada no ano passado, o TikTok é a rede social mais usada por crianças e adolescentes. 34% do público brasileiro entre 9 e 17 anos afirmou acessar o aplicativo em 2021. O Brasil é o país com o terceiro maior grupo de usuários na plataforma, atrás apenas de Estados Unidos e Indonésia. Segundo o TSE, 13,74% dos eleitores brasileiros têm de 16 a 24 anos.

Deputado de cueca e memes de cachorros

No seu TikTok, Tiririca apresenta apenas o seu lado humorístico, deixando de lado as suas ações como parlamentar. Em um vídeo no dia 26 de agosto, o deputado ironiza a onda de calor no País jogando água na cabeça enquanto anda em uma rua apenas de camiseta e cueca. A postagem já conta com quase 5 milhões de visualizações até o fechamento desta reportagem. E não traz nada sobre o debate climático.

Grande parte das postagens feitas no perfil de Lula são para a divulgação de ações feitas pelo governo federal. Porém, no perfil do presidente também há espaço para a descontração. Um dos vídeos com maior engajamento do petista nos últimos meses foi um encontro com a atleta do Corinthians e da Seleção Feminina de Futebol, Tamires Cássia, onde ele disse “vai Corinthians”, em referência ao time de coração do chefe de Executivo e onde Tamires atua profissionalmente. O post teve mais de 400 mil visualizações, número superior aos de informações sobre projetos públicos.

O TikTok é uma das redes que o ex-presidente Jair Bolsonaro é mais ativo. Por lá, o ex-presidente faz publicações voltadas aos seus apoiadores, com críticas ao governo de Lula e lembranças do seu mandato na Presidência. Uma das postagens recentes com melhor desempenho no seu perfil é um vídeo do ex-chefe do Executivo tomando um café enquanto dava uma entrevista exclusiva ao Estadão.

O conteúdo da entrevista, quando Bolsonaro foi questionado sobre a sua atuação no esquema de venda ilegal de joias no exterior e sua convivência com o hacker Walter Delgatti Neto, foi ignorado pela postagem e substituído com uma música viral utilizada na plataforma. A publicação do ex-presidente alcançou 371 mil visualizações.