30/11/2021 - 17:31
A aprovação apertada do projeto que mantém os repasses do orçamento secreto, na sessão do Congresso desta segunda-feira, 29, contou até mesmo com um voto da oposição. O senador Rogério Carvalho (PT-SE), único do seu partido a apoiar a proposta, alegou que defendeu a medida em nome da “autonomia” do Legislativo. Para a presidente da legenda de oposição ao governo, deputada Gleisi Hoffmann (PR), no entanto, o posicionamento do correligionário foi um “fato grave”.
A proposta aprovada manteve a possibilidade do uso político das chamadas emendas de relator, base do orçamento secreto, com repasses bilionários para redutos eleitorais dos parlamentares sem mostrar quem apadrinhou essas verbas nos dois últimos anos. Na prática, os recursos poderão superar R$ 16 bilhões no ano eleitoral de 2022. Os deputados e senadores avalizaram um projeto de resolução, apresentado pelas cúpulas da Câmara e do Senado, ocultando os nomes de quem se beneficiou com o pagamento em 2020 e 2021 e dando nível de transparência reduzido, questionado até por técnicos, somente para as verbas no futuro. O orçamento secreto foi revelado em série de reportagens do Estadão desde maio.
A Câmara aprovou a proposta com 268 votos a favor, 31 contra e uma abstenção. No Senado, o placar foi apertado: 34 a 32. As verbas do orçamento secreto foram suspensas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e, agora, caberá à relatora da ação na Corte, ministra Rosa Weber, dizer se o projeto atende as exigências feitas para que os pagamentos sejam retomados.
Segundo Carvalho, seu voto não entrou no “mérito” da questão do orçamento secreto, mas foi no sentido de evitar que o Judiciário não interfira em assuntos do Legislativo. “A minha votação ontem foi em função de garantir autonomia, uma vez que isso foi aprovado, a execução do Orçamento, por unanimidade, a forma, por este Parlamento. Foi votação simbólica e isso significa votação unânime. Essa Casa precisava se posicionar contra a ingerência de outros Poderes, assim como a Câmara”, disse Carvalho, durante reunião da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). “Com relação ao mérito, quero deixar claro que, neste ano, na votação, apresentaremos voto em separado pela extinção da RP-9 (código das emendas de relator).”
Em nota, a presidente do PT classificou o voto “isolado” de Carvalho como um “fato grave” e que “não se justifica diante das manifestas posições do partido sobre a questão fundamental para o País”. De acordo com Gleisi Hoffmann, o voto “contrariou a orientação da bancada do PT no Senado, além das posições conhecidas da direção partidária”. “Denunciamos e combatemos o orçamento secreto pelos danos que causa ao país e ao equilíbrio democrático, em sintonia com o sentimento da sociedade. A resolução aprovada ontem volta-se contra esses princípios constitucionais”, afirmou Gleisi.
“O PT defende a transparência, a publicidade e a responsabilidade com o país na destinação de emendas orçamentárias, na mesma linha do que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal, não cabendo ao relator do Orçamento dispor de recursos bilionários para distribuir aos parlamentares”, diz ainda a nota divulgada no site do partido.
Como mostrou o Estadão, senadores do PT chegaram a ser beneficiados com o esquema do orçamento secreto no ano passado, mas na cota do ex-presidente do Senado Davi Alcolumbre (DEM-AP). Após ver frustrada sua tentativa de reeleição no cargo, ele buscou o apoio do partido para ajudar a eleger Rodrigo Pacheco (PSD-MG) em fevereiro.
Cobrado a se explicar, Carvalho disse que “como membro da Mesa Diretora do Senado não podia deixar de ter uma posição em defesa do Congresso Nacional, que tem sua autonomia para fazer o orçamento”.
“Se a forma como este orçamento foi definido e como vai se dar a execução está na lei e eu fui derrotado, como membro da Mesa do Senado Federal que subscrevi todas as ações com os demais membros ao STF, caberia a mim ter a coerência na defesa da institucionalidade do Congresso Nacional”, declarou.
As emendas de relator-geral do orçamento (RP-9) vêm sendo usadas pelo Palácio do Planalto para conquistar apoio no Congresso em troca de repasses do Orçamento da União a municípios e Estados nos redutos eleitorais dos parlamentares. Diferentemente de outras indicações de gasto feitas pelo Congresso, como as emendas individuais ou as de bancada, no caso da RP-9 os nomes dos políticos contemplados não são amplamente divulgados, diminuindo a possibilidade de controle e fiscalização.