22/09/2004 - 7:00
Com uma incorrigível mania de atuar na contramão do mercado, a operadora da telefonia Brasil Telecom tem tudo pronto para agir outra vez. Em silêncio, os executivos da companhia separaram US$ 300 milhões do caixa da empresa, contrataram mil novos funcionários, montaram 16 mega pontos-de-venda, fecharam uma aliança tecnológica com seis das maiores operadoras do planeta, firmaram um convênio operacional com o Banco do Brasil e agora, doze meses depois do primeiro movimento, estão prestes a fazer o que quase ninguém recomenda ? lançar até o sábado 25, em nove Estados e no Distrito Federal, a quinta grande operadora de telefonia celular, a Brasil Telecom GSM. Ambição, ousadia e agressividade são as marcas registradas desse plano. As dificuldades para sua implantação, enormes. O mercado da região em que a nova companhia passa a atuar já está ocupado por três das maiores operadoras do País ? Vivo, Claro e TIM ?, vai sendo sacudido por guerras tarifárias, marcado pela necessidade de pesados investimentos em marketing e, ainda, assiste ao crescimento da base de clientes perder velocidade. Suas metas são a conquista de 400 mil clientes até o final do ano e de 1 milhão dentro de doze meses. O mais impressionante é que pode dar certo. ?O mercado está saturado?, reconhece a presidente da Brasil Telecom, Carla Cico. ?Nossos clientes virão das nossas concorrentes?.
A grande aposta da nova companhia de GSM é conectar seus futuros clientes de telefonia celular na base administrada pela Brasil Telecom com 11 milhões de telefones fixos e quase 300 mil aparelhos públicos. Um movimento ainda guardado em segredo é a entrega, grátis, de aparelhos celulares para centenas de pessoas entre os melhores clientes da sua malha de telefonia fixa. Nos últimos meses, a nova companhia comprou o equivalente a US$ 500 mil em aparelhos celulares de todas as marcas. Terá em sua rede de lojas a oferta de aparelhos com preços abaixo de R$ 100 e acima de R$ 2 mil. Um produto inédito no mercado nacional é o cartão de créditos para aparelhos pré-pagos que poderá ter seu saldo utilizado também nas ligações a partir de telefones residenciais e públicos da rede da Brasil Telecom. Detalhe: é redondo. Outro diferencial será a emissão de extratos únicos, descriminados, para contas de telefonia fixa e celular de um mesmo cliente. Interurbanos a partir de telefones fixos que utilizem o 14, número da companhia, serão recompensados com descontos nas tarifas para ligações de celulares. Promete-se, de saída, a oferta de um serviço pelo qual seus clientes poderão realizar operações bancárias com o Banco do Brasil, em razão do convênio firmado meses atrás. As lojas irão operar sob o conceito de serem verdadeiros supermercados de telecomunicações, nos quais o consumidor vai encontrar todos os produtos da empresa. ?Estamos criando um grande programa de fidelidade?, resume Ricardo Sacramento, presidente da operação de GSM da Brasil Telecom.
Antes de abordar o mercado brasileiro, a empresa olhou o mundo. Contratou a consultoria Spectrum para descobrir produtos de telefonia celular que, em operação noutros países, pudessem cair no gosto do consumidor brasileiro. Descobriu-se onde menos se esperava ? nas Filipinas, Venezuela e Colômbia ? alguns serviços que casaram à perfeição com a estratégia de conectividade da companhia. Na esteira das pesquisas, os executivos afinaram conversas com gigantes mundiais como a British Telecom e a Suisscom. O resultado foi a formação, meses atrás, do fechado grupo FMCA ? Fix Mobile Convergence Alliance ?, no qual seis operadoras de países diferentes realizam pesquisas comuns sobre convergência na utilização da telefonia fixa, celular e internet de banda larga. A Brasil Telecom GSM é a única representante da América Latina. ?Em menos de um ano, nossos celulares poderão ser transformados em fixos assim que o cliente chegar em sua casa ou local de trabalho?, garante Sacramento. ?Eles terão, naturalmente, todas as vantagens tarifárias decorrentes dessa mudança.?
Mas que ninguém duvide ? a nova companhia vai agir como uma predadora faminta sobre a concorrência. ?A competição na telefonia é a mais democrática e saudável do mundo?, acredita a italianíssima Carla. ?Nós disputamos e o consumidor sai ganhando.? É prudente ouvir o que ela diz. Três anos atrás, quando todas as concorrentes optaram por antecipar metas na Agência Nacional de Telecomunicações para chegarem mais cedo à telefonia celular, Carla colocou a Brasil Telecom na contramão do mercado e manteve a programação normal de instalação de telefonia fixa. Eram tempos em que o conselho da empresa estava rachado entre os sócios brasileiros, liderados pelo banco Opportunitty, e os italianos da Telecom Italia, controladores da TIM. A disputa societária virou uma briga rasgada que, a partir da sexta-feira 17, começou a ser julgada no tribunal de arbitragem de Londres. No Brasil, os italianos tiveram de sair da empresa, mas tentam voltar com ações na Anatel, Cade e SDE. Mais tarde, quando as concorrentes disputavam leilões para novas concessões de telefonia celular, outra vez a Brasil Telecom preferiu recuar. Agora, quando o senso comum diz que é hora de esperar, Carla põe seu exército sobre um território ocupado com o aval da licença obtida em leilão em janeiro deste ano.
A Brasil Telecom será a quinta grande empresa de celulares do País. Hoje, a Vivo tem 24 milhões de clientes, a Claro tem 12 milhões, a TIM vem em terceiro com 10 milhões e a Oi alcançou 5 milhões. Somando tudo, incluindo outras empresas, o mercado brasileiro chega a 55 milhões de aparelhos. Cresceu 40% em 2003 e irá crescer quase 30% em 2004, chegando a 70 milhões de usuários. Será o quarto maior mercado do mundo, atrás da China, EUA e Japão.
Há prós e contra na estratégia da Brasil Telecom GSM. Uma vantagem é o fato de a empresa ter investido até aqui, incluindo o arremate da licença da Anatel, cerca de US$ 300 milhões. É pouco, o que melhora a perspectiva de retorno financeiro da operação. Outras empresas gastaram mais. A TIM, por exemplo, US$ 1,5 bilhão. A Oi, cerca de US$ 1 bilhão. No mercado, os analistas se dividem. Ricardo Kobayashi, chefe da área de análise do banco Pactual, é um dos mais otimistas. ?Eles têm uma estratégia muito inteligente de convergência dos serviços fixo e celular?, afirma. Kobayashi lembra que, todos os anos, 25% dos clientes trocam de aparelho e até de operadora, um dado a favor da nova concorrente. O analista Mario Epelbaum, do banco Morgan Stanley, em Nova York, está recomendando a compra das ações da Brasil Telecom. Ele se apóia na extraordinária capacidade de geração de caixa da empresa: mais de US$ 815 milhões por ano. Outro analista, que preferiu não se identificar, acha que dificilmente a empresa terá sucesso no projeto de conquistar 1 milhão de clientes em um ano.
Os concorrentes estão na muda. Francisco Padinha, presidente da Vivo, diz que o nível ideal de competição é aquele com apenas três concorrentes. Mario Cesar Araújo, presidente da TIM, acha que o mercado vai crescer. Agora, a palavra está com sua majestade o cliente.
Colaboraram: Leonardo Attuch e Tina Evaristo
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6 são os sócios da Fix Mobile Convergence Alliance |
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