17/04/2002 - 7:00
O empresário Curt Otto Baumgart, 65 anos, uma das maiores fortunas de São Paulo, não tem uma sala. Dono dos grupos Center Norte e Vedacit, ele divide o mesmo espaço de trabalho com 20 funcionários e comanda os negócios da família de uma mesinha acanhada, de ferro, dessas de repartição pública. De vez em quando entra um office-boy avoado e aproxima-se dele querendo saber:
?Chefia, preciso entregar esses papéis para o doutor Curt, sabe quem é?? Baumgart sorri e devolve: ?Pode deixar comigo que eu entrego?. Assim é o ?alemão da zona norte?, como costuma chamá-lo o presidente Fernando Henrique Cardoso. Assíduo freqüentador da lista da Receita Federal que enumera os dez maiores pagadores de imposto de renda do País, Baumgart é conhecido pela simplicidade e pela falta de vaidade. Terno e gravata para trabalhar, nem pensar. Ele prefere camisas de mangas curtas e, apesar do que recomenda o bom gosto da mulher, Glorinha, combina sapatos pretos baratos com meias brancas esportivas. ?Faço questão de estar junto dos meus funcionários para mostrar que, sem eles, eu não seria nada?, diz, emocionado, enxugando as lágrimas por trás dos óculos pesados.
No quesito (falta de) vaidade, no entanto, recentemente Baumgart surpreendeu os amigos ao encomendar um busto seu, de bronze, para colocar no hall de entrada de novo empreendimento do grupo: uma arena multiuso para 8 mil pessoas, que abrigará congressos, shows e eventos esportivos. ?Esse busto vai ser o meu primeiro e último ato de exibicionismo?, diz ele. O objetivo principal da futura arena será criar mais demanda para os dois hotéis do grupo. Não que eles estejam às moscas. Pelo contrário. O Parthenon Nortel, que consumiu investimentos de R$ 30 milhões e foi inaugurado no começo do mês, fechou a primeira semana de funcionamento com 45% de seus 345 apartamentos ocupados. Ainda em fase de projeto, a arena ocupará uma área de 130 mil m2 na zona norte da cidade, na mesma região onde já estão todas as empresas da família ? a Vedacit, fábrica de impermeabilizantes para construção civil; e a Cidade Center Norte, complexo que reúne os shoppings Center Norte e Lar Center, o pavilhão de feiras Expo Center Norte e os hotéis Novotel e Parthenon Nortel. Juntas, elas fecharam 2001 com
R$ 147 milhões de faturamento e dívida zero.
Baumgart jamais recorreu ao governo ou aos bancos para levantar o seu império. E o exemplo mais recente dessa heterodoxa estratégia foi a compra do terreno onde será construída a tal arena. Preço:
R$ 50 milhões. Baumgart, que costuma pendurar o cafezinho que toma todas as tardes no Center Norte, fez caixa durante 30 anos até juntar todo o dinheiro e pagou à vista pela área. ?Eu economizo sempre 70% de nossos resultados para investir mais tarde?, entrega. ?Dinheiro é muito caro para pedir emprestado.? Mas em função da arena, pela primeira vez ele pensa em recorrer a um financiamento do BNDES, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. ?Ainda não estou certo se devo mudar os métodos?, titubeia. ?Vou consultar o meu primo Norberto Odebrecht, que tem mais experiência nessa questão de endividamento?, brinca o empresário, que é engenheiro de formação e já tem 600 mil m2 de terras na região, pelas quais paga mais de R$ 2 milhões por ano de imposto à prefeitura da cidade. Somando terrenos e edificações, o patrimônio da família beira os R$ 700 milhões.
Há dois anos, Baumgart se submeteu a uma cirurgia para a
retirada de um tumor benigno no cérebro. A operação lhe deixou
a perna esquerda semi-paralisada, o que o obrigou a andar de bengala e a mudar-se da mansão de três andares para um apartamento. A cabeça continua boa, matutando todos os dias para apontar em que direção os negócios ainda podem crescer. Segundo Baumgart, a zona norte paulistana carece de boates onde os hóspedes de seus hotéis possam se divertir. ?Mas precisam ser ambientes familiares, algo como a velha casa das mulatas do Sargentelli?, explica. Estaria aí o alvo das novas investidas do grupo? ?Eu não descarto negócio nenhum.?
Apesar de ter os três filhos na direção das empresas, nada indica que Baumgart esteja batendo em retirada. ?Aqui ninguém se aposenta?, diz, enfático, repetindo o lema de seu pai, Otto. Mas este empresário de fala lenta e pensada parece cansado. Senão, o que explicaria o fato de ter se emocionado outras duas vezes na entrevista que concedeu à DINHEIRO? Baumgart chorou ao lembrar que, quando jovem, comia na casa dos peões da Vedacit. E também ao explicar por que não faz compras no Center Norte: ?Eu sou muito querido pelos lojistas, nenhum deles teriam coragem de me apresentar a conta?, contou, aos soluços.
As idéias do rei da Zona norte |
DÍVIDAS DINHEIRO FILHOS |