O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, está dobrando aposta na pressão contra o bloco de economias de rápido crescimento do Brics, incluindo Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, alertando que as iniciativas do bloco para minar o domínio do dólar americano ameaça a supremacia econômica dos EUA.

No momento em que os líderes do Brics se reuniram no Rio de Janeiro para sua cúpula anual, Trump prometeu, no domingo, 6, impor uma tarifa adicional de 10% a qualquer nação que apoie as “políticas antiamericanas” do grupo, aumentando a pressão sobre as taxas comerciais existentes e as que ameaçou lançar.

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A pausa de 90 dias do governo Trump nas tarifas mais altas deve expirar nesta quarta-feira, 9, e cartas foram enviadas para informar dezenas de países sobre a nova taxa de importação dos EUA, de acordo com a Casa Branca.

Embora sua última ameaça seja muito mais comedida do que as tarifas de 100% prometidas em janeiro para os países que “brincam com o dólar”, Trump continua inflexível quanto à necessidade de proteger a moeda de reserva mundial.

Na última década, o Brics aumentou seu tamanho de quatro para 10 membros, incluindo a Indonésia, que aderiu em janeiro. A Arábia Saudita está listada como membro, mas ainda não confirmou seu status. O bloco também tem nove países parceiros, enquanto dezenas de outros estão fazendo fila para entrar.

O bloco, apresentado como a alternativa da China para as nações ricas do G7 (Grupo dos Sete), agora representa um quarto da economia global e quase metade da população mundial.

“Trump tem um motivo para se preocupar”, diz Alicia Garcia-Herrero, pesquisadora sênior do think tank Bruegel, com sede em Bruxelas. “O Brics é claramente antiocidental. Parte de seu mantra é mudar a ordem global.”

Sem alternativa real ao dólar

O Brics recentemente intensificou os esforços para reduzir a dependência do dólar, promovendo o comércio em moedas locais entre os membros.

Atingidos pelas sanções e tarifas ocidentais, a Rússia e a China estão liderando o chamado movimento de desdolarização, fechando acordos de energia em rublos e yuans. A Índia, por sua vez, tem pago pelo petróleo russo barato desde 2023 em yuan, rublos e até mesmo no dirham dos Emirados Árabes Unidos.

Ambições maiores, como uma moeda comum lastreada em ouro, apelidada de “Unidade”, até o momento foram paralisadas em meio a divergências internas entre os poderosos membros do Brics. A Índia, preocupada com o domínio do yuan da China, rejeitou o plano, enquanto o Brasil, anfitrião da cúpula de 2025, também quer priorizar o comércio em moeda local em vez de uma moeda unificada.

“A Índia, juntamente com o Brasil, está tentando equilibrar a mensagem antiocidental do Brics, que é dominado pela China e pela Rússia”, afirma Garcia-Herrero, que também é economista-chefe (Ásia-Pacífico) do banco de investimentos francês Natixis.

De acordo com o site do Brics, dos cerca de 33 trilhões de dólares (R$ 180 trilhões) de comércio global realizado em 2024, o comércio intra-Brics representou apenas 3%, ou cerca de 1 trilhão de dólares.

“A maior parte do comércio mundial ainda é liquidada em dólares e outras moedas tradicionais”, explica o economista Herbert Poenisch. “Será preciso muito para destronar isso.”

A moeda americana é usada em 90% das transações globais e em 59% das reservas cambiais, o que leva vários economistas a argumentar que a desdolarização continua sendo uma ameaça distante.

Eles acreditam que qualquer alternativa do Brics será prejudicada pelos controles de capital do yuan, pela volatilidade do rublo e pela relutância de alguns membros em abandonar o dólar.

Crescimento rápido, pouco progresso

Com a recente adesão do Egito, da Etiópia, do Irã, dos Emirados Árabes Unidos e da Indonésia, e com novas nações parceiras ou afiliadas, como a Argélia e a Malásia, o Brics está claramente em um caminho de rápido crescimento.

Muitos países são atraídos para o bloco por motivos pragmáticos, buscando uma ordem mundial multipolar menos dominada pelo Ocidente. Eles acreditam que o Brics ampliará a voz do Sul Global no cenário mundial.

Aqueles que temem as sanções ocidentais, como o Irã e a Rússia, contam com o Brics para ajudar a proteger suas economias por meio do Brics Pay e do Brics Bridge – alternativas planejadas para o sistema de mensagens de pagamento ocidental, o SWIFT.

Outros, incluindo a Etiópia e o Egito, buscam financiamento para o desenvolvimento sem as amarras políticas que geralmente acompanham a ajuda ocidental. Mas a última ameaça de Trump pode fazê-los pensar duas vezes.

“De repente, fazer parte do Brics passa a ter um custo”, diz Garcia-Herrero. “Isso provavelmente desencorajará alguns, especialmente os países mais pobres.”

No entanto, apesar de seu crescente número de membros e de suas promessas grandiosas, o Brics tem tido dificuldade para transformar a ambição em ação. O bloco carece de coesão institucional e sofre com profundas divisões geopolíticas, principalmente entre a Índia e a China.

Os esforços para criar instituições financeiras alternativas também têm sido cautelosos e de escopo limitado. O Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), apresentado como um rival do Banco Mundial, aprovou até o momento 39 bilhões de dólares em empréstimos, em comparação com os mais de 1 trilhão de dólares do Banco Mundial.

Os líderes do Brics estão percebendo rapidamente que expansão não é igual a influência. Sem uma visão estratégica clara, uma coordenação mais forte e alternativas tangíveis, alguns observadores acreditam que o bloco corre o risco de se tornar um clube simbólico em vez de uma força transformadora.

“Trump não deveria se preocupar”, avalia o economista Herbert Poenisch. “O Brics ainda está nos estágios iniciais, e superar as muitas diferenças de prioridade será uma tarefa difícil.”

Diferenças ideológicas difíceis de conciliar

Apesar de suas muitas diferenças, os líderes do Brics assumiram uma posição firme sobre as tarifas de Trump durante a cúpula no Brasil. Em uma declaração publicada nesta segunda-feira, os líderes criticaram as sanções unilaterais e as tarifas protecionistas, sem citar Trump diretamente. O bloco alertou que tais medidas “distorcem o comércio global” e violam as regras da OMC.

Expandindo a partir de um fórum principalmente econômico, os líderes enfatizaram a cooperação em governança de inteligência artificial (IA), mudanças climáticas e saúde global, além de denunciar conflitos globais.

Os líderes do Brics disseram que os ataques ao Irã do mês passado foram uma “violação do direito internacional”, sem mencionar os EUA ou Israel. Também reafirmaram o apoio à criação de um Estado palestino e denunciaram o uso da “fome como arma” em Gaza.

A declaração evitou criticar a Rússia diretamente, refletindo uma abordagem cautelosa devido à participação da Rússia no bloco, entretanto condenou os ataques da Ucrânia à infraestrutura russa e pediu um “acordo de paz sustentável”.

Os líderes do Brics também reafirmaram seu compromisso com o multilateralismo, o direito internacional e as reformas no Conselho de Segurança das Nações Unidas, incluindo assentos permanentes para o Brasil, a Índia e uma nação africana.