O empresário Joesley Batista, presidente da holding que controla o frigorífico JBS, abandonou sua postura comedida na segunda-feira, 14 de março, ao anunciar um acordo com o banco gaúcho Matone. Batista, que capitaneou o processo de internacionalização do JBS, agora quer avançar na seara  dos bancos. ?Vamos conceder empréstimos consignados?, diz. Apesar de a JBS ter colecionado vários sucessos nos últimos anos, a experiência dos empresários de outros ramos que se arriscaram no sistema financeiro não tem sido muito encorajadora. O caso mais recente é o do apresentador Sílvio Santos, dono do SBT, que por pouco não perdeu todo o seu patrimônio com a quebra de R$ 4,3 bilhões do PanAmericano. Não foi a maior derrocada. José Eduardo Andrade Vieira, do Bamerindus, viu seu banco deixar um buraco estimado em R$ 5,7 bilhões em 1997. Batista diz não se assustar. ?O problema não é industrial que vira banqueiro, é quando banqueiro resolve ser industrial?, afirma. A seguir, a entrevista exclusiva concedida à DINHEIRO:

 

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Por que comprar um banco? 

Percebemos que é um bom negócio.

 

Simples assim?

Essa é nossa filosofia.

 

A atividade bancária é arriscada. Isso não preocupa o senhor?

Trabalho no grupo há mais de vinte anos. Fizeram essa pergunta para mim quando começamos a internacionalizar nossas atividades. Depois, quando entramos na área de laticínios. Quando investimos em frango, em eucalipto e na área de celulose, foi a mesma coisa. Todo mundo me pergunta se tentar uma nova atividade não é correr muito risco. Há risco em tudo, inclusive em não tentar nada novo. Se ficar pensando só no risco, você não faz muita coisa na vida.

 

Não é uma mudança grande?

Não, porque banco não é uma novidade para nós. O grupo não está apenas na pecuária. A maior das nossas atividades é a proteína animal, mas já atuávamos no mercado bancário há tempos. Nós concedemos crédito para os pecuaristas muito antes de negociarmos essa associação com o Matone. Começamos a fazer isso do nosso jeito, devagar, usando recursos próprios. Só que, quando você começa a emprestar dinheiro, percebe que o mais natural e eficiente é ter um banco. Por isso, há três anos, a holding lançou o Banco JBS, fazendo a mesma coisa, mas com a diferença de que assim podemos captar recursos de terceiros no mercado. Não estamos dando um passo fora do nosso negócio, absolutamente. O que vai mudar, agora, é o enfoque.

 

O que muda?

Em vez de financiar o pecuarista, vamos avançar nos empréstimos consignados e também vamos aproveitar o conhecimento que o Matone tem do mercado de crédito imobiliário. Além dos grandes bancos de varejo, ele é o único a ter uma carteira relevante. Vamos partir para cartão de crédito, empréstimos imobiliários, tudo o que diz respeito à operação bancária de varejo. E o crédito, especialmente para a pessoa física, é a melhor maneira de ganhar com essa fase de prosperidade do Brasil. No País, ainda se empresta pouco, e o potencial de crescimento desse mercado é fantástico.

 

Qual vai ser o porte desse negócio dentro do grupo?

Hoje temos um banco com patrimônio de R$ 100 milhões. Após a fusão e as capitalizações, vamos chegar a um patrimônio de R$ 600 milhões, o que é pouco perto dos R$ 20 bilhões de patrimônio total do grupo. No caso dos ativos, como o banco vai trabalhar mais alavancado, a ideia é que tenhamos, ao fim de um ano e meio, ativos de R$ 6 bilhões, para uma carteira total do grupo de R$ 25 bilhões. Dá para emprestar uns R$ 3,5 bilhões nesse período. 

 

Quanto a JBS vai investir?

É importante notar que o banco não é do JBS, é da holding J&F, que controla a JBS e as outras empresas do grupo. A holding vai investir R$ 200 milhões e teremos 60% do negócio. Os outros 40% são do grupo Matone, que vai investir R$ 100 milhões. 

 

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De onde vêm esses recursos? Do BNDES?

Não, é do caixa. Há muita confusão sobre essa história, então deixa eu esclarecer. A holding J&F não tem nenhuma relação com o BNDES. Quem tem ligação é o JBS, que não deve para o BNDES. Ele é um acionista da JBS, porque possui debêntures que só podem ser resgatadas por meio da conversão das ações. Não há nenhum dinheiro do BNDES nessa operação com o Matone.

 

Qual vai ser a estratégia?

Começar pequeno, depois ir estruturando até ganhar condições de crescer. O Matone é forte na região Sul, tem parcerias com lojas, e também vamos estudar esse mercado. No momento, só não estamos pensando em entrar no financiamento automotivo, porque as margens são muito estreitas. No começo, nossa principal aposta vai ser no crédito consignado. Esses empréstimos são os mais seguros que existem, porque quem toma o financiamento é um funcionário pago pelo setor público. Ou seja, o nosso risco não é do cliente, é do governo, e o governo é um bom pagador.

 

Mesmo agora, quando o Banco Central impõe limites ao consignado? O momento não é ruim?

Essa não é essa a nossa percepção. Nós consideramos o consignado um produto novo. Esse negócio deu tão certo que virou o principal instrumento de crédito à pessoa física no Brasil. A necessidade de cercear um pouco essa atividade é, justamente, a prova que ela deu certo. Ao impor limites para o consignado, o BC mostra que está tratando de um bom problema.

 

Outros empresários se aventuraram no setor bancário e tiveram problemas. Isso não assusta vocês?

Isso nos lembra que é preciso entrar com cuidado. Mas aí há um detalhe importante. Quem teve problema não foram os industriais que investiram em banco, foram os banqueiros que investiram na indústria.

 

Como assim?

Os exemplos são o [José Eduardo] Andrade Vieira, do Bamerindus, que investiu na celulose e quebrou  porque a Inpacel consumia muito capital. Ou o grupo Safra, que tinha uma fatia da Aracruz. Eles perderam dinheiro com derivativos de câmbio, assim como aconteceu com a Sadia ? que, aliás, não tinha nem banco, tinha apenas uma corretora e mesmo assim teve problemas. Nosso caso é totalmente diferente. Não vamos correr tanto risco. Depois, o que não te mata, te ensina, e é melhor aprender com os erros dos outros.

 

Vocês querem ser um banco grande? Pretendem atuar no Exterior também?

Não pensamos em internacionalização agora, mas não vejo por que não podemos ser o maior banco que financia a pecuária no mundo. 

 

Não é ambição demais?

Nosso jeito de fazer as coisas é começar pequeno, ir aprendendo e então crescer. Nós começamos todos os nossos empreendimentos fora da pecuária com cuidado. Começamos devagar nos laticínios e a Vigor é a líder em derivados de leite do Estado de São Paulo. Fizemos a mesma coisa como o eucalipto e hoje somos o produtor independente com mais florestas. Vamos inaugurar uma fábrica de celulose no fim do ano que vem e já temos 60 mil hectares de eucaliptos plantados, muito mais do que vai poder ser consumido. É aquela coisa de colocar um tijolo por dia, todos os dias. Fazendo assim, no fim do ano você tem um castelo.

 

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