A relação entre aquecimento e desaquecimento da economia e inflação é altamente questionável”. A fala de André Lara Resende, economista e ex-presidente do BNDES, repercute a partir do questionamento de Miriam Leitão no programa da GloboNews desta quarta-feira (30). De olho na meta de inflação, o Banco Central eleva os juros básicos da economia brasileira – Selic – a 13,75%, taxa muito criticada pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

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Lara Resende acha que o BC está errado. “É inequívoco que taxa de juros alta comprime, espreme a economia, provocando desemprego e recessão, mas isso não significa necessariamente capacidade de reduzir a inflação. Muito pelo contrário, pode, inclusive se a inflação for de oferta, você pode agravar o problema de insuficiência de oferta e agravar a inflação”, declarou em entrevista.

Nessa defesa, um governo não teria restrições de gastos, pois, se o país tem um BC que emite sua moeda, ele pode financiar esses gastos com imprimindo dinheiro e o nível de endividamento deixa de ser tão relevante, pois a chance de calote tenderia a zero. “Desde que seja obedecida a condição da taxa de crescimento da economia ser maior que o nível da taxa de juro em curso, não haveria restrições orçamentárias, como ocorre hoje em dia”, diz o professor de economia do Ibmec RJ, Alexandre Espírito Santo.

“Lara Resende é adepto da teoria monetária moderna, onde economistas seguem a linha de que o Banco Central não deve combater a inflação via aumento de juros, e sim através de uma política fiscal mais restritiva e com corte de gastos do governo”, explica o professor de economia do Ibmec RJ, Haroldo Monteiro.

Quando vemos o BC colocando uma Selic a 13,75% com expectativa de inflação entre 5,5% e 6%, explica Monteiro, isso gera, ‘grosseiramente falando’, uma taxa de 7% de juros reais. Isso faz com que os investimentos deixem de existir.

“Os agentes econômicos precisam de uma taxa de juros mais baixa para que o investimento seja rentável. Falando de uma outra forma: adeptos da teoria monetária moderna acreditam que os juros praticados pelo BC devam ser os menores possíveis”, acrescenta o professor do Ibmec RJ.

Leonardo Roesler, advogado tributarista da RMS Advogados, acredita que há uma defesa da ideia de que a inflação pode ser menos influenciada pela taxa de juros do que o BC acredita.

“A inflação no Brasil tem raízes na indexação, nas expectativas e outros fatores estruturais ao invés de ser estritamente determinada por uma política monetária. Aumentar as taxas pode não ser a melhor estratégia para combater a inflação. Uma vez que essa ação pode ter efeitos colaterais negativos para a economia, como desacelerar o crescimento econômico e aumentar o endividamento do setor público”, avalia. 

Especialistas também levantam a bandeira de que é preciso levar em consideração que o controle da inflação com o aumento da taxa de juros e consequente redução dos investimentos é instrumento possível no curto e médio prazo.

“Uma inflação pela desorganização da oferta exige mais tempo para ter seus efeitos percebidos pela economia. A injeção de recursos para melhorar a oferta acaba por aumentar a inflação no curto prazo, haja vista que a oferta dos produtos leva um tempo para se concretizar. Um ponto de atenção crucial é que a economia brasileira é altamente indexada, ou seja, os contratos são reajustados pela inflação passada”, explica Thiago Fogaça Almeida, economista e consultor da Berardini Sociedade de Advogados.

Para que o BC baixe as taxas, deve haver sinalização de regra fiscal e corte de despesas. E aí sim conseguimos ancorar expectativas inflacionárias e o BC pode vir a reduzir a taxa de juros”, conclui Monteiro, do Ibmec RJ.

Confira aqui a íntegra da entrevista:

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