O governo português decidiu pedir assistência financeira à Comissão Europeia, anunciou o primeiro-ministro José Sócrates nesta quarta-feira, em discurso transmitido pela televisão, no qual citou a “dramática” situação das finanças em seu país.

O pedido de ajuda foi confirmado pela Comissão Europeia, em Bruxelas, através de um comunicado de seu presidente, o português José Barroso, afirmando que o assunto será estudado rapidamente porque confia na capacidade de Portugal de superar dificuldades.

Já em Washington, o Fundo Monetário Internacional (FMI) anunciou sua disposição de também ajudar.

Depois de resistir por meses às pressões dos mercados, assim como dos parceiros europeus, Sócrates justificou o pedido nas necessidades do país, que se tornaram prementes, após o Parlamento rejeitar seu novo programa de austeridade, “agravando a já dramática situação financeira do país”.

“Estou firmemente convencido de que se agravará ainda mais caso nada seja feito”, completou Sócrates, que renunciou ao cargo em 23 de março depois da rejeição do Parlamento, abrindo o caminho para eleições em 5 de junho.

“Como vocês sabem, durante todo o ano passado lutei para que isso não acontecesse. A rejeição ao programa de estabilidade e de crescimento e a crise política debilitaram o país”, disse Sócrates.

Existe uma “ameaça real sobre o financiamento da República, do sistema bancário e da economia”, afirmou ainda o primeiro-ministro renunciante.

“Sempre encarei um pedido de ajuda externa como último recurso. Não tomar esta decisão, no entanto, implicaria riscos que o país não pode correr”, concluiu.

A crise havia sido motivo do rebaixamento da nota de Portugal por parte das principais agências de classificação financeira, com o aumento do custo dos empréstimos do Estado.

Os bancos “chegaram a uma situação-limite ante o BCE”, o Banco Central Europeu, explicou Antonio de Sousa, presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB), justificando a decisão das entidades portuguesas, anunciada na terça-feira, de não voltar a comprar dívida pública. “Não podem emprestar mais dinheiro ao Estado”, estimou.

Desta forma, várias empresas públicas correm o risco de ficar sem fontes de financiamento a curto prazo. Depois do Metrô do Porto, a empresa lisboeta de transporte fluvial Transtejo anunciou nesta quarta-feira que “o pagamento de salários só está garantido até o final do primeiro semestre”.

Nos últimos dias, os principais banqueiros portugueses pediram ao governo que solicitasse uma “ajuda de emergência” para “enfrentar as necessidades mais imediatas”.

Os presidentes dos bancos BCP e BES defenderam a solicitação de um “crédito interbancário” à União Europeia de entre 10 bilhões e 15 bilhões de euros.

Recentemente, o presidente do Eurogrupo, o primeiro-ministro de Luxemburgo, Jean Claude Juncker, havia evocado uma ajuda de 75 bilhões de euros.

O FEEF (Fundo Europeu de Estabilidade Financeira), que pode captar dinheiro nos mercados através de garantias aportadas pelos países da Zona do Euro, é a única forma de ajudar Portugal, disse um porta-voz do ministério alemão das Finanças.

Descartou, no entanto, rumores sobre uma eventual e excepcional ajuda que permitiria a Portugal aguentar até a posse do governo que sair das eleições legislativas antecipadas de 5 de junho.

Na manhã desta quarta-feira, o governo chegou a reiterar que o estado português “estava em condições de cumprir seus compromissos financeiros”, apesar das preocupações relativas à solvência do país, que enfrenta nas próximas semanas importantes vencimentos da dívida.

Lisboa deve reembolsar cerca de nove bilhões de euros de dívida até meados de junho: 4,252 bilhões de euros no próximo dia 15 de abril e 4,899 bilhões em 15 de junho.

Pela manhã, o país conseguiu captar mais de 1 bilhão de euros em bônus da dívida a curto prazo, embora a taxas de juros recordes (5,902% para os bônus a 12 meses).

Em uma nota publicada pouco depois desta captação, o ministério das Finanças afirmou que a emissão “confirmou a deterioração das condições financeiras provocadas pela recusa, pelo Parlamento, do novo programa de austeridade do governo”.

“As taxas de juros atuais permitem concluir que os danos causados pela rejeição ao programa são irreparáveis”, afirmou o ministério de Finanças.

Uma das emissões, de 455 milhões de euros a 12 meses, foi absorvida com uma taxa de juros de 5,902%, bem acima dos 4,331% de uma operação similar em 16 de março.

A outra emissão, a seis meses, captou 550 milhões de euros, com taxas a 5,17%, muito superiores aos 2,984% exigidos pelo mercado em uma operação similar em 2 de março.

As emissões aconteceram sob forte pressão, depois que as agências Moody’s, Fitch e Standard and Poor’s rebaixaram a nota da dívida de Portugal.

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