08/10/2008 - 7:00
DINHEIRO – Nos últimos dias, a economia americana parece ter entrado em colapso. Várias instituições financeiras quebraram e a própria General Motors enfrenta uma crise sem precedentes. O sr. acha que o cenário nebuloso irá durar quanto tempo?
WAGONER – Certamente, a economia dos Estados Unidos passa por um momento difícil e medidas importantes estão sendo tomadas para enfrentar os desafios que surgiram. A longo prazo, entretanto, acredito que tanto a economia americana quanto a global permanecerão sólidas e saudáveis como um todo. No caso da GM, espero que a demanda global por carros e caminhões continue Entrevista / Richard Wagoner forte, especialmente em mercados emergentes como Rússia e Brasil. De acordo com nossas estimativas, as vendas da indústria global para 2008 estão estimadas em cerca de 70,3 milhões de unidades, contra 70,6 milhões em 2007. Trata-se praticamente do mesmo patamar.
DINHEIRO – O que a GM tem feito para enfrentar o enfraquecimento da economia americana?
WAGONER – Em resposta a esse enfraquecimento e também para amenizar o impacto da alta do preço do petróleo, nós tomamos recentemente algumas medidas duras, porém necessárias, com o objetivo de posicionar melhor a empresa. Para responder à rápida mudança no mix de vendas da indústria automobilística, 11 dos 13 lançamentos nos Estados Unidos e 18 dos 19 lançamentos futuros serão carros ou crossovers. Estamos aumentando a produção em várias de nossas fábricas de carros e encerrando a produção de caminhões em quatro. Anunciamos vários programas de novos produtos importantes. Entre eles, o Chevy Cruze, um novo compacto global, a nova geração do subcompacto Chevy Aveo e um novo motor pequeno de extrema eficiência, apenas para citar alguns.
DINHEIRO – Desde 2005, os prejuízos da GM no mundo totalizaram US$ 70 bilhões. Quais são os seus planos para diminuir as perdas financeiras?
WAGONER – Em julho, colocamos em prática inúmeras iniciativas para alavancar a liquidez da GM em US$ 15 bilhões até o final de 2009 (entre outras medidas, a empresa anunciou a venda de ativos e o corte de compensações financeiras para funcionários). Somadas às ações que foram tomadas nos três últimos anos como parte da estratégia de recuperação na América do Norte, pode-se dizer que conseguimos mais avanços do que muitos acreditavam ser possível. No momento em que a economia dos Estados Unidos iniciar a sua recuperação, a General Motors certamente estará bem posicionada.
DINHEIRO – No dia em que completou 100 anos, a General Motors apresentou oficialmente o carro elétrico Volt. A impressão que se tem é que a GM aposta todas as suas fichas neste automóvel, que funcionaria como uma espécie de símbolo da transformação da empresa. É isso mesmo? Afinal, qual é a importância do Volt para o futuro da GM?
WAGONER – A nossa indústria está começando a se afastar de sua quase total dependência histórica do petróleo. Enquanto isso ocorre, vemos muitas opções novas e animadoras sendo desenvolvidas. O carro elétrico é uma das primeiras nessa lista. É justo dizer que nenhum automóvel conceito desenvolvido durante minha carreira na GM gerou mais entusiasmo do que o Chevy Volt. O Volt funciona como um veículo elétrico tradicional a bateria e tem autonomia de 64 quilômetros apenas com energia elétrica. Caso o motorista necessite ir além dos 64 quilômetros, um pequeno motor é acionado para fornecer a eletricidade para recarregar as baterias, mantendo o veículo em movimento por mais 480 quilômetros. Considerando-se que 75% dos americanos dirigem menos que 64 quilômetros em seu trajeto diário para o trabalho, o Volt pode ter um enorme impacto na dependência que a América tem do petróleo. Logo, fica evidente que o Chevy Volt é muito importante para a GM em particular e para a própria indústria.
DINHEIRO – Quando o Volt começará a ser vendido?
WAGONER – Continuamos focados em nosso objetivo de colocar o Volt nos showrooms das concessionárias Chevrolet até o final de 2010.
DINHEIRO – Na festa em comemoração dos 100 anos da GM, o sr. afirmou que a indústria automobilística terá de reinventar o automóvel e que só quem estiver absolutamente envolvido nesse processo de transformação conseguirá sobreviver no futuro. Que reinvenção é essa?
WAGONER – O forte crescimento da indústria automobilística observado hoje em dia, especialmente nos mercados emergentes como Brasil, China, Rússia e Índia, aliado aos preços recordes do petróleo que devem continuar em sua tendência crescente tornam o momento incrível para a indústria automobilística. O mundo inteiro está de olho, esperando por um avanço no transporte pessoal que atenda os desafios concretos em termos de energia e meio ambiente enfrentados por um grande número de pessoas. É por esse motivo que na GM acreditamos que o desenvolvimento de propulsão por meio de combustíveis alternativos seja a questão mais importante que enfrentaremos na próxima geração. Atender a essa questão exigirá nada menos do que a reinvenção do automóvel. Quem não tiver consciência disso certamente ficará para trás.
DINHEIRO – A demanda ambiental, que certamente continuará forte nos próximos anos, provocará a extinção dos carros movidos a gasolina? Eles continuarão a ser produzidos a longo prazo ou sua era já acabou?
WAGONER – Acreditamos que a chave para atender os desafios globais em termos de energia e meio ambiente é oferecer aos clientes uma série de opções. Os veículos podem ser movidos por inúmeras fontes de energia, ou, como costumamos dizer, “gas friendly to gas free” (soluções que variam entre a redução no consumo de gasolina e aquelas que dispensam totalmente esse combustível). Além dos avanços da eletricidade em veículos como o Chevrolet Volt, estamos também fazendo avanços em células de combustível, biocombustíveis, híbridos e melhorias em motores a gasolina e a diesel. O mundo vem dependendo do petróleo para mover seus automóveis há muito tempo e acredito que ainda continuaremos a depender dele ainda por vários anos. O importante é desenvolver alternativas para o petróleo agora e iniciar o mais rapidamente possível a transição para fontes opcionais ao petróleo.
DINHEIRO – No começo de 2008, a subsidiária brasileira enviou lucros e dividendos à matriz da GM nos Estados Unidos, algo que parecia improvável até pouco tempo atrás. Como o sr. explica o sucesso do mercado brasileiro num momento em que o mercado americano vive a sua maior crise?
WAGONER – Existem muitas diferenças entre o mercado brasileiro e o americano. Vamos examinar as duas principais: mix de produtos e fontes de combustível. A indústria automobilística brasileira é dominada por veículos relativamente menores, enquanto o mercado dos Estados Unidos é mais voltado para os veículos grandes, especialmente caminhões e utilitários esportivos. Com o aumento nos preços da gasolina, percebemos o mercado americano voltando-se para os carros e veículos crossover, porém ainda não na mesma proporção que no Brasil. Outra diferença importante é o uso do álcool. O Brasil realizou um trabalho incrível ao longo das últimas três décadas ao desenvolver uma grande e competitiva indústria do álcool. Como resultado desse processo, hoje há mais de 90% de todos os veículos de passageiros rodando com álcool, o que é realmente impressionante. Nos Estados Unidos, começamos o desenvolvimento do álcool mais tarde e, embora o número de carros e caminhões no sistema flexfuel cresça a cada ano, a maioria dos veículos ainda roda com gasolina. Apesar dessas e de muitas outras diferenças, a fórmula básica de sucesso em ambos os mercados é a mesma de outros mercados no mundo: para vencer, é preciso ter grandes produtos com projeto e tecnologia inovadores, marcas fortes (como a Chevrolet no Brasil) e grande experiência com consumidores.
DINHEIRO – Nesse cenário de mudanças, qual é a importância do mercado brasileiro para o futuro da GM?
WAGONER – Crescer em mercados emergentes como o Brasil é fundamental para o sucesso a longo prazo da GM. De hoje a 2012, estimamos que 80% do crescimento da indústria automobilística global virá de mercados emergentes. É uma participação surpreendente. E o Brasil é muito importante para a estratégia de crescimento da GM. Nos últimos três anos, a GM do Brasil aumentou suas vendas em mais de 20% ao ano. Em 2008, esperamos vender mais de 600 mil unidades no Brasil, que é o terceiro maior mercado da GM no mundo e o segundo maior para a marca Chevrolet.