30/10/2023 - 15:17
Os preços da carne vermelha alcançaram níveis recordes nos Estados Unidos (EUA), impulsionados pelo forte consumo, mas, sobretudo, por uma progressiva redução do gado bovino, fortemente afetado pela seca.
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Mary Skinner deve consumir carne vermelha por recomendação médica.
“Tenho necessidade extrema de proteína”, conta a mulher ao sair do Grand Central Market, em Nova York.
“Antes, podia comprar picanha ou bife. Mas agora, recorro cada vez mais à carne moída”, que é mais barata, completou.
Embora a inflação tenha registrado índice moderado, 3,7% em 12 meses em setembro nos Estados Unidos, no caso dos melhores cortes de carne bovina no varejo, o aumento atingiu 9,7% em um ano. Em três anos, o bife, corte mais procurado correspondente ao filé mignon, saltou 27%.
No mesmo mercado nova-iorquino, um homem de 30 anos conta que assinou o serviço de entrega ButcherBox para economizar.
“Recebo seis cortes por US$ 150-160 (entre R$ 751 e R$ 801, na cotação atual) a cada duas ou três semanas. Claramente o preço subiu”, resumiu o empreendedor que mora em Connecticut.
“Chegou a um ponto em que comecei a comprar carne que exige cozimento lento, é mais barata e dura mais”, acrescentou.
O duro golpe da seca
Com uma imagem muito associada a ranchos e numerosos gados bovinos, os Estados Unidos sofrem uma severa escassez de gado”.
“O pasto de gado bovino para carne está no nível mais baixo desde a década de 1960”, afirmou Scott Brown, professor da Universidade do Missouri.
Em cinco anos, a quantidade de bovinos caiu quase 10%, de acordo com os números do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA, na sigla em inglês).
“A principal razão é a seca” que atinge as regiões de reprodução, sobretudo nas grandes planícies americanas, “há vários anos”, explicou Scott Brown, que associa este fenômeno ao outono (primavera no Brasil) de 2020.
A falta de chuva reduz o volume de pastagens onde o gado se alimenta e aumenta o preço da forragem.
Neste contexto complexo, os pecuaristas reduziram maciçamente o número de animais que alimentam. Em 2022, os frigoríficos registraram os níveis mais altos de abate “desde o início da década de 1980”, destaca Ross Baldwin, da consultoria agrícola AgMarket.Net.
Esta redução foi somada ao aumento da mortalidade devido à brutal onda de calor de agosto, agravada pela taxa de umidade acima da média.
Os pecuaristas compensam parcialmente estas perdas com a melhora do gado, que produz mais volume de carne do que há 10 anos, e devido à possibilidade de conseguir mais vacas com partos bem-sucedidos, explica Brown.
Aumento da demanda
Simultaneamente, a demanda de carne vermelha aumenta.
Em 2022, americanos consumiram em média 26,8kg de carne bovina (em torno de 500g por semana), 0,3kg mais do que 2021. Enquanto isso, desde 2015, o crescimento do consumo foi de quase 10%, segundo o USDA.
Com a oferta reduzida e a procura crescente, o preço do gado é mais do que o dobro do registrado em março de 2020 (+133%).
Diante do preço recorde, muitos pecuaristas vendem seus gados mais cedo, com menos idade e peso, o que impede o crescimento da população bovina, indica Ross Baldwin, que não prevê uma mudança neste cenário nos próximos 12 meses.
“Serão necessários mais três anos (a partir do próximo) para que a população (de gado) realmente comece a aumentar”, disse.
Enquanto isso, “manter bezerros para reprodução (…) reduziria a produção de carne a curto prazo e os preços subiriam” ainda mais, alerta David Anderson, professor da Texas A&M University. Encontrar pasto suficiente para um rebanho reconstituído e aumentado também seria um desafio.
“O sudeste registrou seca, mas não tanto como no resto do país”, afirma Brown, acrescentando que é possível que o gado bovino seja transferido para esta região.
O USDA antecipa um novo declínio no setor em 2024. “Os preços permanecerão firmes e, no final, isso levará os consumidores a questionar se devem pagar tanto” pelo produto, prevê Ross Baldwin.
Segundo este analista, o mercado poderá se ajustar devido ao esgotamento da procura, embora neste momento não dê sinais de mudança de tendência.