22/05/2024 - 12:16
A Prefeitura de São Paulo recusou emendas das deputadas Tabata Amaral (PSB) e Erika Hilton (PSOL), aliada de Guilherme Boulos (PSOL), para construir quatro Centros de Atenção Psicossocial (Caps) em projetos que ela própria cadastrou no Programa de Aceleração do Crescimento Seleções (PAC Seleções). Tabata e Boulos são pré-candidatos à Prefeitura de São Paulo e disputarão a eleição contra o atual prefeito Ricardo Nunes (MDB).
A Prefeitura disse ao Estadão que preferiu priorizar a construção de Unidades Básicas de Saúde (UBS), mas mudou a justificativa apresentada a Tabata para recusar os recursos. No total, as emendas das duas parlamentares somam R$ 10 milhões.
Ao rejeitar a emenda, a Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo (SMS) havia informado ao gabinete da deputada do PSB que não tinha a titularidade dos terrenos onde as obras seriam realizadas e que o dinheiro destinado pelas parlamentares era insuficiente para bancar as construções. Contudo, as áreas onde os Caps seriam construídos foram definidas pela própria SMS. Já o valor das obras é tabelado pelo Ministério da Saúde.
A Hilton, a pasta disse que o terreno tem um “declive acentuado” que impossibilita a construção. A parlamentar do PSOL remanejou a emenda para o Rio Grande do Sul, destruído pelas chuvas e enchentes que assolam o Estado.
Em nota ao Estadão, porém, a SMS disse que as emendas “não são suficientes nem para começar as obras”, mas não detalhou quanto as ações custariam em sua avaliação.
“Para as Unidades Básicas de Saúde (UBS), o PAC ofereceu 50%, e a SMS optou por priorizar a construção de novas UBSs por se tratar de uma prioridade da população e porta de entrada do Sistema Único de Saúde (SUS)”, acrescentou. O percentual é referente à parcela que seria custeada com recursos do PAC. Pela tabela, uma UBS pode custar de R$ 2 milhões a R$ 6,5 milhões a depender do modelo.
A pasta também afirmou que a prefeitura é dona dos terrenos, mas não explicou o motivo de ter dito o oposto ao gabinete de Tabata. A reportagem perguntou se houve erro da secretaria ao indicar um terreno em que o Caps supostamente não poderia ser construído, mas não houve resposta.
“É lastimável e completamente anti-republicano o prefeito se apequenar ao ponto de recusar recursos que seriam tão importantes para as periferias de São Paulo. Esse cálculo político mesquinho só demonstra que ele não pensa na população, só na eleição”, disse a deputada Tabata Amaral.
Erika Hilton, por sua vez, afirma que Nunes recusou receber milhões de reais em emendas por “pura questão ideológica”. “Depois que a Prefeitura negou nossa emenda, eu e Guilherme Boulos quebramos a cabeça pra encontrar uma solução pra não perdermos o recurso que Nunes negou”, disse ela.
Secretário declarou ter posse dos terrenos; pasta disse o contrário em e-mail à parlamentar
O governo federal criou uma regra para incentivar os deputados federais a indicarem recursos das emendas individuais para as obras do PAC Seleções: a cada emenda destinada ao programa, os parlamentares ganharam direito a indicar outra no mesmo valor e para o mesmo tipo de obra.
Tabata Amaral indicou R$ 2,5 milhões para a construção de uma nova sede do Caps Álcool e Outras Drogas (AD) de Ermelino Matarazzo e mais R$ 2,5 milhões para o novo prédio do Caps AD do Jardim Nélia, ambos na Zona Leste.
As novas instalações são necessárias para as unidades passarem da modalidade assistencial nível II para nível III, o que permitiria o funcionamento 24 horas das unidades, inclusive aos feriados e fim de semana, com até cinco leitos para acolhimento noturno.
Como “bônus”, a deputada ganhou direito de indicar R$ 5 milhões para obras em dois outros Caps. Ela escolheu passar o Caps Infantojuvenil de Guaianases, também na zona leste, para o nível III, e construir um Caps dessa mesma categoria na cidade de Campinas.
Todos os projetos são cadastrados pelas prefeituras, que precisam indicar em quais terrenos as obras serão feitas. Foi o que fez o secretário municipal de Saúde de São Paulo, Luiz Carlos Zamarco.
Ele enviou três ofícios ao Ministério da Saúde no dia 10 de novembro de 2023 nos quais declara que o município tem a “posse mansa, pacífica e regular” dos três terrenos indicados para a construção dos Caps ou a “titularidade” destes.
A declaração da posse pacífica ou da titularidade é uma exigência do governo federal para que as propostas apresentadas pelas prefeituras sejam habilitadas e possam receber recursos do PAC Seleções. Cabe aos deputados escolher para quais projetos aprovados enviar as emendas.
Mesmo com as declarações do secretário, a SMS informou ao gabinete de Tabata por e-mail no dia 9 de maio que “torna-se inviável o recebimento do recurso, visto que as unidades beneficiadas não dispõem da titularidade do imóvel pretendido para a implantação do Caps”.
“Acrescentamos que o valor de R$ 2.496.000,00 (aproximadamente R$ 2,5 milhões) disponibilizado para investimento do Programa Nova PAC [sic], não alcançará o valor total da obra, que está estimado em R$ 8.000.000,00 (R$ 8 milhões)”, continuou a pasta.
O valor de cada Caps, como acontece com os demais equipamentos de saúde, segue uma tabela do Ministério da Saúde e varia conforme a região e a modalidade. Para 2024, cada Caps AD nível III na região Sudeste, segundo a pasta, custa R$ 2,5 milhões, o que corresponde à verba destinada pela deputada para cada uma das três unidades escolhidas por ela.
Prefeitura cita ‘declive acentuado’ de terreno
Erika Hilton indicou recursos para a construção de um Caps III na cidade de Guarulhos e afirma que, em articulação com Boulos, decidiu usar a emenda extra para construir o mesmo equipamento em São Miguel Paulista, na zona leste da capital paulista. Cada emenda teve o mesmo valor de R$ 2,5 milhões.
A Prefeitura de São Paulo recusou a emenda, mas dessa vez justificou que a área onde a unidade seria construída “apresenta um terreno com declive acentuado, inviabilizando o recebimento e o cadastramento do recurso disponibilizado”, conforme e-mail enviado à deputada no dia 2 de maio.
De acordo com Hilton, ela perderia a emenda, pois não poderia remanejar o recurso. Porém, a negativa da Prefeitura coincidiu com as chuvas no Rio Grande do Sul, Estado para o qual o governo federal permitiu que os deputados remanejassem suas indicações.
Ela, então, destinou a verba para erguer um Caps II na cidade de Alvorada (RS), conforme cadastrado pela prefeitura da cidade gaúcha no PAC Seleções. Segundo Erika Hilton, o município é um dos mais atingidos e vulneráveis do Estado. Novamente, a parlamentar disse ter contado com a ajuda de Boulos e do deputado estadual gaúcho Matheus Gomes (PSOL).
“Juntos para cuidar da saúde do povo do Rio Grande do Sul”, escreveu Boulos nas redes sociais, citando Hilton e Gomes ao anunciar a emenda.
“Conseguimos articular o envio de R$ 2,2 milhões em emendas para a construção de Centro de Assistência Psicossocial (CAPS) na cidade de Alvorada, para auxiliar na atenção à saúde mental da população, extremamente abalada com a catástrofe que continua assolando o Rio Grande do Sul”, continuou. O valor da emenda diminuiu para acompanhar a tabela do Ministério da Saúde para Caps II construídos na região Sul.
Prefeitura muda versão
“A Secretaria Municipal da Saúde (SMS) informa que desde 2017 a Prefeitura de São Paulo entregou 19 novos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) para a cidade, sendo que seis deles foram construídos e entregues na atual gestão mediante uma demanda da população local. A pasta ressalta que os terrenos pertencem à Prefeitura, e os recursos oferecidos pelas parlamentares para as construções dos CAPS, por meio do PAC, não são suficientes nem para começar as obras.
Para as Unidades Básicas de Saúde (UBS), o PAC ofereceu 50%, e a SMS optou por priorizar a construção de novas UBSs por se tratar de uma prioridade da população e porta de entrada do Sistema Único de Saúde (SUS).
A pasta lamenta a tentativa de fazer uso político de um tema tão importante para a população paulistana e reitera que segue um planejamento técnico rigoroso para executar projetos de saúde. Todas as propostas, incluídas as demandas parlamentares, são avaliadas frente as prioridades já atestadas por estudos técnicos realizados com a supervisão dos Conselhos Regionais de Saúde do Município e não por questões de cunho político.”