O presidente da Gerdau, Gustavo Werneck, afirmou que a companhia está sob a iminência de promover demissões por conta do cenário atual que a indústria do aço vive no País. A fala foi feita durante o 33.° Congresso Aço Brasil, realizado nesta quarta-feira, 27, em São Paulo.

O executivo avaliou o momento atual em que a indústria siderúrgica brasileira vive, apontando que o forte aumento no volume do aço importado, sobretudo da China, vem prejudicando a produção brasileira. Werneck acrescentou que a Gerdau já tem 600 trabalhadores em suspensão temporária do contrato de trabalho por conta da redução da produção na empresa.

“Se não forem tomadas decisões por parte do governo nos próximos 30 dias sobre o aumento da tarifa de importação, a situação ficará preocupante. É preciso a adoção de ações urgentes para que a tarifa suba 25%, ou então teremos muita dificuldade”, afirmou o executivo.

De acordo com Werneck, a Gerdau já tem duas plantas, uma no Ceará e outra em São Paulo, que estão paralisadas.

O diagnóstico do presidente da Gerdau foi acompanhado pelo presidente da ArcelorMittal Brasil e presidente do conselho diretor do Instituto Aço Brasil, Jefferson De Paula, que confirmou a possibilidade de problemas sociais caso o cenário se mantenha.

“Vamos produzir 1,3 milhão de toneladas de aço a menos por causa do cenário atual de importações. A nossa capacidade está entre 15 milhões a 16 milhões de toneladas, mas vamos produzir menos. Se o cenário continuar igual, haverá um problema social no País”, afirmou De Paula.

Reforçando a gravidade do assunto, o presidente executivo do Instituto Aço Brasil, Marco Polo Lopes, afirmou que a decisão do governo de antecipar o fim do desconto de 10% na alíquota de importação de 12 produtos siderúrgicos foi “inócua”.

O executivo comparou a taxa de importação do Brasil em relação a países como Estados Unidos, México e União Europeia, onde a tarifa é de aproximadamente 25%, segundo aponta a entidade.

Importações em alta

Segundo Jefferson De Paula, as importações de aço vão aumentar cerca de 40% em 2023 na comparação com o ano passado. O executivo acrescentou ainda que a projeção para o final do ano é de que ocorra uma queda de 6% nas vendas internas.

Segundo ele, um dos principais impeditivos para a aceleração do crescimento no País são os juros. “A queda continuada dos juros nos parece factível, mesmo que consequentes do risco inflacionário do passado recente”, afirmou.

O executivo defendeu ainda a adoção de incentivos por parte do governo para iniciativas de baixo carbono voltado para a indústria e desenvolvimento de pesquisas: “A indústria siderúrgica será transformada completamente em termos de tecnologia e processamento”.

De Paula afirmou que a disponibilidade de sucata e oferta de gás natural com preços compatíveis serão vitais para a redução das emissões de CO2 no setor. “A neutralidade de carbono passa necessariamente pela oferta de energia limpa, um dos pilares da ‘neoindustrialização’ no Brasil.”

De acordo com Lopes, 2023 deve também registrar uma queda no consumo aparente de aço de 2,6%. Considerando esses dados, o executivo avaliou que a siderurgia brasileira pode estar vivendo um momento de dificuldades que ele classificou como “tempestade perfeita”.

“Trazemos uma figura que conceituamos como uma tempestade perfeita, porque temos uma previsão das vendas caindo. Uma ociosidade do setor, e a alternativa que teríamos seria aumentar as exportações, mas isso tem se mostrado impossível pela situação adversa do cenário internacional e, por último, as importações impactando de maneira forte”, afirmou Marco Polo.

Alíquota de 25%

A principal agenda da indústria brasileira do aço é o estabelecimento de medidas de defesa comercial no mercado doméstico. O setor defende uma alíquota de importação para produtos siderúrgicos em 25% por um ano. O cenário é de aumento expressivo das importações, principalmente da China.

Jefferson De Paula afirmou que há um excesso de 564 milhões de toneladas de aço no mundo. Neste cenário, União Europeia, Estados Unidos e México adotaram medidas de defesa comercial para proteger a produção interna contra o aumento de uma concorrência avaliada como desleal pela entidade.

“Somos a favor da economia de mercado, mas não podemos ser ingênuos e ignorar o grave dano que a política comercial de siderúrgicas chinesas e russas estão causando à produção de aço dos demais países ao inundar o mercado de produtos siderúrgicos a preço subsidiados”, afirmou De Paula.

O executivo avaliou que a operação de siderúrgicas brasileiras pode parar caso não sejam adotadas medidas mais firmes de defesa comercial. De Paula acrescentou que as medidas não representam uma ação contra a China, a maior produtora global de aço, mas uma medida temporária de proteção à indústria brasileira.

Ela não descartou a possibilidade de revisão de investimentos por parte da empresa caso o cenário de entrada de aço importado permaneça no Brasil. No setor nacional, a previsão para os próximos quatro anos é de R$ 63 bilhões em investimentos voltados para expansão, melhoria da eficiência e descarbonização. Nos últimos 14 anos, cerca de R$ 170 bilhões foram investidos.

“Estamos fazendo obras e permanecemos pensando no futuro, mas se o País é atacado com aço subsidiado, não conseguimos combater isso. Se o governo não proteger o mercado interno, as empresas vão ter que parar”, afirmou De Paula.

Marco Polo de Mello Lopes disse que o governo tem sido sensível à questão. “Temos conversado e participado de reunião com ministros, mostramos que estamos investindo e gerando renda”, afirmou.

Em relação à alíquota em 25%, ele justificou que o valor segue a referência adotada em países e que tem como propósito apenas garantir o mesmo nível de competitividade dos importados.

Dificuldade

Durante o 33° Congresso Aço Brasil, no painel que discutiu o cenário atual e perspectivas para o setor, o professor do Instituto de Economia da Universidade Federal de Uberlândia Germano de Paula (UFU) afirmou que vê com dificuldade a possibilidade de o Brasil adotar medidas de defesa comercial, sobretudo contra a China, em função do País ter uma posição geopolítica mais enfraquecida no cenário global.

“O Brasil é comercialmente dependente da China e grande parte das decisões importantes do setor são decididas mais em Pequim do que em Brasília, então a capacidade de retaliação chinesa aumenta consideravelmente se o Brasil adotar medidas de defesa comerciais”, afirmou de Paula.

A secretária de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic),Tatiana Lacerda Prazeres, afirmou que o governo tem fiscalizado práticas ilegais e desleais de comércio que possam prejudicar as exportações do setor do aço brasileiro.

Ela destacou ainda a recente medida do governo, aprovada na semana passada, de antecipação do fim do desconto de 10% na alíquota de importação de 12 produtos siderúrgicos. A previsão é que a regra prevaleça até o fim deste ano. A decisão será publicada no Diário Oficial da União e passará a valer a partir de outubro, quando a taxa de importação voltará a ser de 9% a 14,4%.