O presidente interino da Câmara de Deputados, Waldir Maranhão, anulou nesta segunda-feira, para a surpresa geral, a votação realizada em 17 de abril que aprovou o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff, acolhendo, assim, um pedido da Advocacia-Geral da União.

Esta decisão deixou todos em Brasília atônitos, uma vez que é tomada 48 horas antes de o Senado votar, a partir de quarta-feira, a abertura formal do processo de impeachment contra Dilma por maquiagem de contas públicas, as chamadas “pedaladas fiscais”.

A sessão do Senado em que devia ser lido o informe aprovado pela comissão especial sobre o impeachment foi suspensa, informou a Presidência da Casa.

Desconhece-se se será mantida a votação, a partir de quarta-feira, no plenário de 81 senadores sobre a acolhida ou não o parecer da comissão de impeachment do Senado que recomendou, por ampla maioria, na semana passada, o prosseguimento do processo contra a presidente.

Se confirmado, durante a tramitação do processo até o anúncio da sentença, a presidente ficaria 180 dias afastada do cargo.

O vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP), ex-aliado de Dilma e seu atual rival, já se preparava para assumir a presidência interina e anunciar a formação de um novo governo ainda esta semana.

Contudo, nesta segunda, Maranhão – que votou contra o impeachment em abril – considerou que a votação pelos deputados constituía um pré-julgamento e uma “ofensa ao amplo direito de defesa” da presidente.

“Por essas razões, anulei a sessão realizada nos dias 15, 16 e 17 (de abril) e determinei que uma nova sessão seja realizada para deliberar sobre a matéria”, ressaltou o deputado em um comunicado à imprensa.

Ele também questionou o fato de os deputados terem antecipado seu voto e limitado a atuação da defesa de Dilma.

“Não poderiam os senhores parlamentares antes da conclusão da votação terem anunciado publicamente seus votos, na medida em que isso caracteriza prejulgamento e clara ofensa ao amplo direito de defesa que está consagrado na Constituição. Do mesmo modo, não poderia a defesa da senhora Presidente da República ter deixado de falar por último no momento da votação, como acabou ocorrendo”, disse em sua declaração.

Os deputados haviam aprovado, por uma esmagadora maioria de 367 votos de um total de 513, o processo de impeachment da presidente Dilma, passando o bastão para o Senado, que tem a decisão final sobre a questão.

Dilma nega ter cometido qualquer crime de responsabilidade e denuncia um “golpe de Estado parlamentar” sem base legal.

A presidente recebeu com prudência a notícia de anulação da votação durante uma cerimônia pública.

“Soube agora da mesma forma que vocês souberam, apareceu nos celulares que todo mundo tem aqui, que um recurso foi aceito e portanto o processo está suspenso. Eu não tenho essa informação oficial. Estou falando aqui porque não podia de maneira alguma fingir que não estava sabendo da mesma coisa que vocês estão. Mas não é oficial, não sei as consequências. Por favor, tenham cautela. Nós vivemos uma conjuntura de manhas e artimanhas”, disse Dilma.

Vários parlamentares da oposição expressaram surpresa e incredulidade, denunciado uma decisão “intempestiva” e, segundo eles, ilegal.

A oposição deverá contestar a decisão, seja na assembleia plenária do Congresso dos deputados, ou ante o Supremo Tribunal Federal (STF).

O senador Aécio Neves (PSDB-MG) afirmou que cabe ao presidente do Senado, Renan Calheiros, decidir se a votação deve prosseguir na Câmara alta, como previsto.

Nem Temer, nem Calheiros se pronunciaram até o momento. Os dois são do mesmo partido, o PMDB, mas têm fortes desavenças: Calheiros apoia Dilma, enquanto o vice se prepara nos bastidores para assumir o governo caso o impeachment avance.

Waldir Maranhão assumiu temporariamente a liderança da Câmara na semana passada, quando substituiu Eduardo Cunha, inimigo político da presidente e cérebro por trás do impeachment.

Cunha foi suspenso de seu mandato pelo STF por tentativa de obstrução das investigações sobre o escândalo de corrupção na Petrobras, em que está envolvido.

Em 17 de abril, Maranhão, membro do Partido Progressista (PP, direita), ele próprio suspeito de corrupção no caso de corrupção na Petrobras, votou contra o impeachment de Dilma “em defesa da democracia”, ainda que jurando sua total de lealdade a Eduardo Cunha.

Nesta segunda-feira, Maranhão usou como justificativa o direito de defesa de Dilma Rousseff.

“Em qualquer processo, o direito de defesa é um elemento fundacional do devido processo legal. Portanto, a defesa da presidenta tinha o direito de apresentar seus argumentos na sessão final da câmara”, o que não aconteceu, disse a jornalistas José Guimarães, líder do governo na Câmara de Deputados.

Humberto Costa, líder do PT no Senado, mostrou-se confiante de que a Câmara dos Deputados deverá fazer nova votação do impeachment. “Aí, estaríamos em condições de reverter o resultado e também pode haver um entendimento de que podemos recorrer ao Supremo para analisar o mérito e, quem sabe, até a suspensão definitiva” de todo o processo, afirmou, esperançoso.

Pauderney Avelino, líder do opositor DEM (AM), considerou a decisão de “intempestiva e extemporânea”, disse que Maranhão agiu de forma temerária e anunciou que apelará ao Supremo.

A menos de três meses dos Jogos Olímpicos do Rio, o Brasil é sacudido pela batalha do impeachment, uma recessão econômica que se anuncia como a pior em um século e uma ampla investigação por corrupção na Petrobras que coloca dezenas de políticos e grandes empresários na mira.

A presidente Dilma não é alvo de nenhuma investigação ou acusação de corrupção. Mas tanto seus maiores aliados, quanto seus inimigos mais ferrenhos são investigados ou acusados no âmbito do maior escândalo de corrupção da história do Brasil, que desviou da empresa mais de dois bilhões de dólares e engordou os bolsos de políticos do PT e aliados, bem como os cofres de seus partidos.

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