O terremoto que abala o futebol mundial teve mais um forte abalo nesta quinta-feira, com a detenção dos presidentes da Conmebol e da Concacaf, a pedido da justiça americana, que indiciou 16 altos dirigentes da Fifa, entre eles Marco Polo Del Nero, presidente da CBF, que pediu licença do cargo.

O dia teve ares de ‘déjà-vu’. Juan Ángel Napout, presidente da Conmebol, e o hondurenho Alfredo Hawit, presidente da Concacaf, foram detidos às 06H00 (03H00 de Brasília) no hotel Baur au Lac, de Zurique, onde estavam participando de uma reunião do Comitê Executivo da entidade.

No dia 27 de maio, outros sete cartolas, que participavam do mesmo tipo de reunião, foram detidos no mesmo hotel de luxo, entre eles José Maria Marin, predecessor de Del Nero na presidência da CBF, que foi extraditado para os Estados Unidos e cumpre prisão domiciliar em Nova York.

Como aconteceu há sete meses, horas depois do anúncio das detenções, o Departamento de Justiça dos Estados Unidos divulgou os nomes de outros indiciados.

“Cada um desses 16 novos suspeitos foi indiciado por extorsão organizada e por outras infrações ligadas a abusos cometidos no exercício de suas funções, durante um longo período”, explicou a procuradora-geral dos Estados Unidos, Loretta Lynch, num comunicado.

“O nível de traição de confiança neste caso é revoltante, e o nível de corrupção é inconcebível”, enfatizou.

Na lista constam nomes de peso do futebol latino-americano, entre eles Del Nero e Ricardo Teixeira, que foi presidente da CBF durante 23 anos, de 1989 a 2012, quando Marin assumiu o cargo.

Poucas horas depois da divulgação dessa lista, a CBF emitiu nota oficial no seu site para informar que o presidente da entidade pediu licença do cargo.

“O presidente Marco Polo Del Nero apresentou pedido de licença do cargo com a finalidade de se dedicar à sua defesa, em vista de ter seu nome mencionado em acusações relatadas pela Justiça norte-americana e pelo Comitê de Ética da Fifa”, anunciou o comunicado.

Desde a prisão de Marin, Del Nero não viaja mais para fora do Brasil. O presidente da CBF renunciou na semana passada ao cargo do Comitê Executivo.

O Brasil foi representado na reunião por Fernando Sarney, 60 anos, vice-presidente da CBF e filho do ex-presidente da República José Sarney.

Durante o período de licença de Del Nero, o vice-presidente Marcus Antônio Vicente exercerá a função de presidente interino da CBF.

Lynch fez questão de mandar “um recado claro” aos dirigentes indiciados que “permanecem na sombra”, uma ameaça velada contra Del Nero e Teixeira. “Saibam que vocês não vão escapar da nossa mira”.

O ministério da justiça da Suíça informou que os presidentes da Conmebol e da Concacaf foram detidos como suspeitos de aceitar “propinas milionárias em troca da venda de direitos de marketing ligados à transmissão de torneios na América Latina e partidas das eliminatórias para a Copa do Mundo.

Napout, de 57 anos, preside a Conmebol desde 2014, e Hawit, 64, ocupa o cargo de presidente interino da Concacaf desde maio, após a primeira onda de detenções de dirigentes da Fifa, durante a qual o então presidente da Concacaf, Jeffrey Webb, foi detido.

O Departamento Federal de Justiça (OFJ) informou que os os dois acusados se opõem a sua extradição para os Estados Unidos.

De acordo com o estatuto da Conmebol, o uruguaio Wilmar Valdez vai assumir a presidência como interino, na qualidade de primeiro vice-presidente da entidade.

Já o ex-presidente da Federação de Honduras, Rafael Callejas, disse ter conversado com Hawit, que garantiu “não estar envolvido em nada”.

A Federação de Futebol dos Estados Unidos (US Soccer) afirmou, por sua vez, que nenhum dos dois dirigentes participa diretamente da organização da Copa América do Centenário, que foi confirmada para 2016, em território americano, e chegou a ser ameaçada por conta do escândalo.

A justiça americana solicitou a detenção dos dirigentes em 29 de novembro com o objetivo de iniciar o procedimento de extradição, por “atos que teriam sido em parte estimulados nos Estados Unidos e pagamentos que teriam transitado por bancos americanos”.

“A Fifa está a par das ações realizadas hoje pela justiça americana. A Fifa continuará cooperando plenamente com a justiça americana dentro da lei suíça, assim como dentro da investigação realizada pelo Ministério Público suíço”, afirmou a entidade em um comunicado.

Joseph Blatter, presidente demissionário e atualmente suspenso da Fifa, não está entre as pessoas procuradas em Zurique, segundo o jornal americano New York Times, que foi o primeiro a noticiar a operação.

Assim como aconteceu em maio, a operação ocorre no momento em que a Fifa reúne seu comitê executivo. Por ironia do destino, a pauta principal do encontro, que começou na quarta-feira, é justamente a questão das reformas que a entidade precisa lançar para sair da crise e recuperar a credibilidade.

O presidente interino da Fifa, o camaronês Issa Hayatou, que assumiu em outubro, quando Blatter foi suspenso por 90 dias pela comissão de ética, disse em entrevista coletiva que “os eventos mostram a necessidade de reformas”.

Já o suíço François Carrard, presidente da Comissão de Reformas da Fifa, vê a crise atual como “uma oportunidade única para iniciar uma nova era”.

O Comitê executivo aprovou nesta quinta-feira por unanimidade a primeira grande medida neste sentido, a limitação a 12 anos acumulados dos mandatos do presidente, e dos membros do próprio comitê, assim como uma maior transparência dos salários dos principais dirigentes.

O programa também visa a reforçar o controle dos membros do Comitê Executivo e um reequilíbrio dos poderes da presidência da Fifa.

Não foi tomada nenhuma decisão, porém, em relação ao limite de idade do presidente, após a comissão sugerir num relatório anterior a idade de 74 como máxima para se exercer o cargo.

Blatter, de 79 anos, está no cargo desde 1998, e foi reeleito pela quarta vez no dia 29 maio, mas acabou colocando o mandato à disposição quatro dias depois, diante da forte pressão internacional, em meio ao escândalo causado pela primeira onda de detenções.