O Papa emérito Bento XVI morreu neste sábado (31), aos 95 anos, em um mosteiro no Vaticano. Joseph Aloisius Ratzinger nasceu em 16 de abril de 1927 na cidade de Marktl am Inn, na região da Baviera, Alemanha, e foi Papa da Igreja Católica e bispo de Roma de abril de 2005 a fevereiro de 2013, quando renunciou ao cargo mais importante dessa instituição religiosa. Desde que abdicou ao trono de Pedro, Bento XVI tornou-se Bispo emérito da Diocese de Roma e vivia recluso no Mosteiro Mater Ecclesiae, nos jardins vaticanos, entre orações, leituras, correspondências e um pouco de música. A saúde de Bento XVI se deteriorou nos últimos dias, embora o Vaticano tenha dito, na sexta-feira (30), que ele se encontrava em condição “estável” e que havia participado, na véspera, de uma missa celebrada em seu quarto no mosteiro vaticano.

Ratzinger alcançou os holofotes mundiais ao ser eleito o 265º Papa, aos 78 anos e três dias, no conclave de 2005, substituindo João Paulo II e precedendo o Papa Francisco, atualmente o líder máximo da igreja católica. Na época, chamou a atenção por ser alemão, provavelmente o sexto germânico a ocupar tal posição desde Vítor II (há dúvidas se Estêvão VIII, nascera na Itália ou na Alemanha).

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Poucos anos após ser nomeado Papa, Bento XVI renunciou à função, alegando que sua idade avançada não permitia que tivesse forças para ocupar importante papel e exercer a função adequadamente.

Durante seu pontificado, seu nome esteve envolvido em escândalos de pedofilia na igreja. Um relatório independente publicado em janeiro de 2022 acusava o Papa emérito de encobrir casos de abusos sexuais contra crianças na Igreja Católica da Alemanha. Segundo o documento, Bento XVI, então Arcebispo de Munique e Freising de 1977 a 1982, não teria impedido que um padre abusasse de quatro meninos.

Pouco depois, em fevereiro do mesmo ano, Bento XVI escreveu uma carta, divulgada pelo Vaticano, em que pedia perdão por esses crimes cometidos por terceiros. “Tive grandes responsabilidades na Igreja Católica. A maior delas é a minha dor pelos abusos e erros que ocorreram em diferentes lugares durante o meu mandato”, escreveu ele.

“Mais uma vez, só posso expressar a todas as vítimas de abuso sexual minha profunda vergonha, minha profunda tristeza e meu sincero pedido de perdão”, continuou Bento XVI, ao falar sobre faltas graves cometidas por fiéis.

Conservador, Bento XVI não tinha o carisma de outros pontífices, como João Paulo II e o Papa Francisco, mas apostava na intelectualidade e na sobriedade em suas palavras e posturas durante as homilias. Poliglota, falava ao menos seis idiomas, como alemão, italiano, francês, latim, inglês e espanhol, com conhecimentos de português, grego antigo e hebraico.

Amante da música, Bento XVI tocava piano e preferia os clássicos, como Mozart e Bach. Antes dele, o último Papa a adotar esse nome foi Bento XV, à frente do cargo de 1914 a 1922, exercendo seu pontificado durante a Primeira Guerra Mundial.

Um tempo entre os nazistas

O jovem Joseph Ratzinger tinha 12 anos quando a Segunda Guerra Mundial começou, em 1939. Por ser tão novo, não foi chamado imediatamente para servir aos nazistas. Mas a situação mudou de figura quando, em 1943, aos 16 anos, o exército de Hitler convocou Ratzinger – já seminarista – a realizar “trabalhos auxiliares” junto com os militares. Nesse momento, começou a saga junto aos nazistas, embora Ratzinger e sua família nunca tenham apoiado Hitler e seus seguidores.

A ligação forçada com os nazistas é narrada, em detalhes, na biografia “Bento XVI – O Guardião da Fé” (Record), de Andrea Tornielli. Naquela época, como afirma o livro, Ratzinger acabou morando com militares e chegou a atuar em serviços antiáreos em Munique, até que, um ano mais tarde, foi convocado para o “serviço de trabalho do Reich”.

“Aquelas semanas de trabalho permanecem em minha memória como uma recordação opressiva. Os nossos superiores eram em grande parte provenientes da comumente chamada Legião Austríaca. Tratava-se de nazistas do primeiro time… pessoas fanaticamente ideologizadas, que nos tiranizavam com violência”, relembra o Papa emérito.

Em dado momento, Ratzinger foi designado para o quartel de infantaria de sua região e não precisou combater junto do exército nazista, mas foi obrigado a marchar com seus companheiros e a cantar canções de guerra. Segundo o Papa emérito, tal ação servia “para mostrar à população civil que o Führer dispunha ainda de soldados jovens recentemente treinados”.

Na primavera, Ratzinger decidiu fugir e voltar para seu lar. Soldados americanos acabaram identificando o jovem como soldado do Reich e Ratzinger foi retido como prisioneiro de guerra, mas libertado um tempo depois, em 19 de junho de 1945. Quando finalmente chegou em casa, a família o recebeu com festa. “Em toda a minha vida nunca eu comi uma refeição tão gostosa como aquela que minha mãe me preparou com os produtos da nossa horta”.

Piloto, sim. Motorista, não.

A aparência sisuda e conservadora parece não “combinar” com um gosto particular de Bento XVI: o de pilotar. Segundo a Agência de Notícias Católica, citada pelo The New York Times, o Papa emérito tinha até uma licença de piloto de helicóptero e costumava voar do Vaticano até a residência pontifícia em Castel Gandolfo, na Itália, pilotando o helicóptero papal. Curiosamente, Bento XVI apreciava ser piloto, mas não curtia a ideia de ser motorista: não conseguiu tirar sua carteira de habilitação, pois nunca aprendeu a dirigir automóveis.