20/09/2022 - 20:22
Autoridades instaladas por Moscou em várias regiões da Ucrânia anunciaram nesta terça-feira (20) a realização, entre os próximos dias 23 e 27, de referendos sobre a anexação à Rússia, em meio à contraofensiva ucraniana.
Os territórios separatistas pró-russos de Donetsk e Luhansk, na região do Donbass (leste da Ucrânia), bem como as regiões de Kherson (sul) e Zaporizhzhia (sudeste), todos ocupados pelo Exército russo, anunciaram as votações dias antes de o país entrar no oitavo mês de guerra. Sua integração à Rússia representaria uma grande escalada do conflito, uma vez que Moscou poderia justificar sua intervenção alegando defender seu próprio território das forças de Kiev.
Os referendos seguem o modelo usado pela Rússia para anexar a península ucraniana da Crimeia em 2014, um movimento denunciado pela comunidade internacional.
– ‘Paródia’ –
Tanto Washington quanto Berlim e Paris denunciaram a futura consulta e afirmaram que a comunidade internacional nunca aceitaria os resultados, enquanto a Otan considerou que as consultas representam “uma escalada adicional” do conflito.
O presidente francês, Emmanuel Macron, chamou-as de “paródia” e disse que a invasão da Rússia representa um “retorno à era do imperialismo” . Já a Ucrânia respondeu prometendo “liquidar a ameaça” russa.
Em seu discurso diário à nação, o presidente Volodymyr Zelensky minimizou a importância das consultas e agradeceu a “todos os amigos e parceiros da Ucrânia por sua condenação maciça e firme das intenções da Rússia de organizar outro pseudo-referendo”.
As consultas estão sendo preparadas há meses, mas seu calendário parece ter acelerado após a contraofensiva ucraniana, que obrigou o Exército russo a se retirar do nordeste do país.
– Chantagem e revés russo –
Foi o chefe do “parlamento” autoproclamado de Lugansk, Denis Miroshnichenko, que anunciou primeiramente que a consulta seria realizada em quatro dias, a partir de sexta-feira (23). Pouco depois, a agência de notícias oficial de Donetsk anunciou um cronograma idêntico, seguido pelo chefe da administração de ocupação de Kherson, Vladimir Saldo. Uma autoridade pró-Rússia fez o mesmo pela região de Zaporizhzhia.
A Ucrânia, por sua vez, alertou que a ameaça russa será “liquidada”. “A Ucrânia vai solucionar a questão russa. A ameaça só pode ser liquidada pela força”, escreveu no Telegram o chefe da administração presidencial ucraniana, Andrii Yermak, denunciando uma “chantagem” de Moscou motivada pelo “medo da derrota”.
O ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Dmytro Kuleba, garantiu que a Ucrânia “continuará a libertar seus territórios, independentemente do que a Rússia disser”.
Esses anúncios são feitos depois que a Rússia sofreu importantes reveses militares desde o começo de setembro, principalmente a retirada de Kharkiv, após o avanço das tropas de Kiev, que se beneficiam de suprimentos de armas e equipamentos militares ocidentais. A diplomacia russa alertou o embaixador da França em Moscou que considera os envios de armamento inaceitáveis.
O Exército ucraniano também lançou uma contraofensiva na região de Kherson, que avança mais lentamente. E também ataca na região de Luhansk, que a Rússia conquistou totalmente na primavera boreal, após combates sangrentos.
– Arma nuclear –
O número dois do Conselho de Segurança da Rússia e ex-presidente russo Dmitri Medvedev pediu hoje que os referendos sobre a anexação das regiões de Lugansk e Donetsk sejam realizados o mais rápido possível.
Os referendos no Donbass “são de grande importância (…) para restaurar a justiça histórica”, disse Medvedev no Telegram. Moscou considera a Ucrânia historicamente russa. “Violar o território russo é crime e, se for cometido, permite o uso de todas as forças legítimas de defesa”, alertou.
Para a analista independente russa Tatiana Stanovaya, “Putin vai realizar esses referendos para ter o direito de usar armas atômicas para defender o território russo”.
Ao receber hoje as cartas credenciais de novos embaixadores na Rússia, antes da Assembleia Geral da ONU, Putin prometeu prosseguir com sua “política soberana” e denunciou o desejo de “hegemonia” dos Estados Unidos.