06/08/2003 - 7:00
Nome: Ademir Nascimento. Idade: 38 anos. Filhos: dois. Hobby: dirigir motos. Profissão: scalper. Ademir trabalha no pregão e faz parte de um seleto grupo de operadores da Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) que não opera em nome de corretoras nem de bancos. Os scalpers são aqueles que trabalham para administrar a própria fortuna. Pagam R$ 700 mil por um título que lhes dá o direito de comprar e vender lotes de taxa de juros e dólar diretamente da Bolsa. É como se um investidor tivesse autorização para realizar negócios do pregão. Juntos, eles representam pouco mais de 10% do total de operadores e chegam a movimentar R$ 2,5 bilhões diariamente, o que equivale a 5% dos negócios da BM&F. É quase três vezes o valor negociado na Bolsa de Valores de São Paulo. Não seria muito se não fosse por um detalhe. Na quase totalidade dos casos eles operam com dinheiro do próprio bolso. ?Os scalpers dão liquidez às operações. Sem eles, o pregão não funcionaria?, afirma José Carlos Branco, diretor de operações da BM&F.
A turma de scalpers faz inveja a qualquer um. No meio de 650 operadores, eles são um grupo de 83 pessoas, com uma média de idade de 35 anos, que começaram a carreira como auxiliares de pregão e chegaram ao posto mais cobiçado entre os profissionais de Bolsa. Como? Negociando ativos e enriquecendo. Os scalpers não têm chefe. Decidem a hora de entrar e sair do mercado e compram lotes de taxa de juros e dólar como se fossem bananas. Apenas com uma diferença: o que está em jogo são milhões de dólares. Não há limite de negociação. Mas num dia de muitos negócios, um scalper chega a movimentar por volta de 2.000 lotes de dólar, que correspondem a US$ 100 milhões. Esse dinheiro todo não chega a passar pela mão do operador especial. Nem pela conta corrente. Ele apenas ganha com a diferença de preço entre o lote que comprou e o que vendeu. Por dia, um scalper agressivo (que movimenta acima da média de mercado) chega a ganhar por volta de R$ 100 mil, o valor de um apartamento classe média em São Paulo.
Mas eles também podem perder. E muito. Enquanto o operador de corretora preocupa-se apenas em executar bem uma ordem, o scalper deve ir além. Ele carrega o peso de tomar a decisão certa. Uma aposta mal feita pode ser seu fim no mercado financeiro. Na história da BM&F, pelo menos um scalper por ano vai à falência. Mais do que um coração forte, um operador especial tem outras três características. Sabe tomar decisões rapidamente, consegue identificar as estratégias dos adversários e conhece o mercado a ponto de acertar se o ativo em que ele aposta tem tendência de alta ou de baixa. A tarefa não é nada fácil. ?Tem muitos operadores que são ótimos até virarem scalpers?, diz Aparecido Ferreira, gerente de operações da corretora Souza Barros. ?Quando passam a administrar o próprio dinheiro perdem o equilíbrio emocional?, afirma.
A ganância leva muitos deles a fazer apostas pesadas que nem sempre resultam numa boa operação. ?Saber investir moderadamente é o segredo para não perder dinheiro?, diz um scalper que prefere não se identificar. Os scalpers, aliás, são avessos a entrevistas. Discretos, falam pouco e usam apelidos para não revelar o nome. Só quando estão vendendo ou comprando é que adoram chamar a atenção. Aí vale tudo: gritar, gesticular e até blefar. Numa roda de negócios, que pode ter quase 300 operadores, um segundo de diferença na hora da compra ou da venda pode significar a
perda de um negócio. Por isso a palavra mais ouvida no pregão é ?Tchado!?, que significa negócio fechado. Eles encurtam a palavra para ganhar tempo.
Mas nos últimos meses os scalpers passaram a reclamar que
perderam vantagem competitiva. Eles foram impedidos pela
BM&F de usar o telefone sem fio do pregão para se comunicar
com as mesas de operações de corretoras e bancos. ?Ficamos em desvantagem em relação ao mercado porque não temos acesso a informações de fora?, diz outro scalper, que comprou o título de operador especial há 8 anos. A BM&F não confirma, mas analistas dizem que os scalpers perderam o direito de usar o telefone para evitar operar em nome de corretoras e bancos. Isso ocorre quando a tesouraria de um banco quer se desfazer de um determinado ativo e não quer mostrar ao mercado sua estratégia. Nesse caso, usa o scalper para fazer a operação. Se eles já movimentam muito dinheiro sozinhos, imagine quando se juntam aos bancos. Aí, podem facilmente influenciar o mercado. ?Os scalpers conseguem, sim, definir tendências?, resume Ademir. Nessa hora, mais do que nunca, todo operador sonha em ser scalper.