01/10/2003 - 7:00
Cerveja não é coisa de mulher. Elas não entendem nada do assunto. Tem garota que acha que Antarctica é só um continente gelado e Bohemia é uma moça que volta de madrugada para casa todos os dias. Se você é partidário desse papo machista de boteco, que costuma divertir a turminha do chopp e do futebol, deveria conversar alguns minutos com a Dani. O nome completo é Daniela de Castro Dezordi, uma bela paranaense de 33 anos, capaz de deixar envergonhado qualquer marmanjo que se auto-proclame expert em cerveja. Ela é mestre-cervejeira da Ambev e conhece tudo do assunto. Poderia falar durante horas sobre a combinação ideal entre água, malte e lúpulo e identificar apenas com um leve gole a marca de uma cerveja. Portanto, a Skol, Brahma, Antarctica ou Bohemia que você está tomando neste momento só desce redondo porque uma moça acompanha todo o processo produtivo. Além dela, mais três mulheres na Ambev cuidam do padrão de qualidade das bebidas. Ah, sim, também há homens neste departamento.
Engenheira química de formação, Daniela vivia em Curitiba até 1994 trabalhando na indústria de papel. Até que o escritório paranaense da Ambev abriu vagas para mestres-cervejeiros. A moça passou pelo processo de seleção e ficou um ano e meio em treinamento no Brasil. ?Até ali eu era apenas uma apreciadora da bebida?, lembra Daniela. Terminado o curso, a então aprendiz foi enviada para a Bélgica. Fez pós-graduação em Alimentos e estudou técnicas de produção e degustação de cerveja durante um ano na Universidade Católica de Louvain. Quando voltou juntou-se à equipe de qualidade da fábrica de Agudos, município próximo de Bauru (SP). Passou também pela unidade de Jaguariúna e hoje está no Centro de Engenharia da Ambev, em Jacareí. O trabalho dela agora é pesquisar novas matérias-primas. A atividade de degustação continua. Todos os dias, Daniela bebe cerca de 300 ml de cerveja de diferentes tipos. ?Nada vai ao mercado sem que nossa equipe aprove?, diz.
Bohemia e malhação. Quando iniciou na companhia, há nove anos, Daniela participava ativamente de cada etapa da produção. Também é atribuição do mestre-cervejeiro provar os insumos utilizados na fabricação da bebida. ?Experimenta-se de tudo. Da água à cerveja fermentada, em maturação e no envase?, conta a moça. A degustação por fases evita que qualquer alteração na bebida passe adiante, comprometendo a qualidade do produto. ?Mas os problemas são raros, até porque usamos matérias-primas selecionadas e máquinas de última geração?, explica. No caso da Ambev, todas as plantas funcionam com técnicas idênticas de produção e usam insumos importados. O lúpulo, por exemplo, vem de fornecedores da Europa e EUA. O malte é comprado também na Europa e no
Canadá. A padronização do sistema e a tecnologia dos
equipamentos de fábrica deveriam, em tese, limitar os serviços do mestre-cervejeiro . ?Mas nada se compara ao controle sensorial de qualidade?, rebate Daniela. ?Nenhuma máquina poderá avaliar se o nível de açúcar, acidez ou amargor da cerveja é o ideal. Este equilíbrio só é detectado na degustação, em diferentes partes da língua?, ensina. Além disso, há as características retronasais. Elas identificam o aroma que se desprende da boca e entra no nariz. São vitais para a avaliação do ?buquê?.
Daniela bebe o equivalente a uma latinha de cerveja todos os dias e passa a semana convivendo com cheiro de lúpulo e malte. Seria natural que nas horas de folga ela deixasse a ?loura? de lado. Mas quer saber qual a bebida que Daniela saca da geladeira no domingão? ?Bohemia?, revela. Confesse: se você não visse a foto, imaginaria uma mestre-cervejeira barrigudinha ? afinal não dá para manter a forma bebendo uma loura gelada todos os dias. ?É lenda. Cerveja é a bebida que menos engorda?, garante Daniela. Mesmo assim, ela não dispensa a malhação. Os marmanjos do chopp deveriam seguir o exemplo.