Defensores dos animais celebram restrições à prática cultural centenária, e amantes da indústria milionária se indignam. Nova lei proíbe eventos em que touros sejam mortos ou feridos.A Cidade do México passou uma legislação para banir as touradas violentas, numa decisão celebrada pelos defensores dos direitos dos animais. Mas a indústria que lucra com esta tradição secular reagiu indignada à votação na terça-feira (18/03), que teve 61 legisladores a favor da proibição e apenas um contra.

Ficam proibidos eventos nos quais animais sejam mortos ou feridos, e os matadores não podem usar objetos afiados, como espadas. A nova legislação ainda estabelece um limite de 15 minutos para a permanência de um touro na arena.

Para a prefeita da capital mexicana, Clara Brugada, a iniciativa é uma tentativa de avançar em direção a um futuro em que as touradas sejam livres de violência. A cidade abriga a maior arena do mundo de touradas, com capacidade para 40 mil pessoas.

Legisladores a favor da medida argumentam que o objetivo não é fazer as touradas desaparecerem, mas evoluírem. Segundo Brugada, não se pode permitir “a crueldade como espetáculo, muito menos o sofrimento duradouro e a morte de um animal por entretenimento”.

A decisão também teve apoio da presidente do México, Claudia Sheinbaum, que a descreveu como uma “boa solução” que mantém empregos na indústria das touradas e previne abuso de animais.

Tradição centenária

Se os críticos afirmam que as touradas impõem um sofrimento desnecessário aos animais, os seus defensores argumentam que elas são eventos culturais tradicionais em vários países da América Latina. A prática remonta ao ano de 1529 no território que hoje pertence à Cidade do México.

As touradas também impactam a economia da capital mexicana. Em 2023, elas geraram 50 mil empregos e cerca de 50 milhões de dólares (R$ 282 milhões) na cidade. O setor gera aproximadamente 400 milhões de dólares por ano para o país (mais de R$ 2,2 bilhões), de acordo com a Associação Nacional de Criadores de Touros de Combate no México.

Em um discurso após a votação, o legislador Jesús Sesma, do Partido Verde, reconheceu que a decisão irritaria um segmento da população. “Para as famílias que se sentem frustradas hoje, estamos aqui para dizer que ninguém perdeu seu emprego. Houve um meio termo para continuar com esses espetáculos de touradas, mas agora sem violência,” disse.

Proibições progressivas

Grupos ativistas estimam que 180 mil touros por ano sejam mortos ao redor do mundo em touradas. A legislação na capital mexicana é considerada por muitos um passo importante, mas ainda insuficiente, uma vez que mesmo touradas sem sangue ainda impõem sofrimento aos animais.

“Os touros não serão mais submetidos à crueldade brutal de serem repetidamente esfaqueados e, por fim, mortos na arena, o que é algo que saudamos”, disse em nota Anton Aguilar, diretor-executivo da organização Mundo Humano Para Animais no México. “Cada passo que damos em direção a um tratamento mais humano dos animais nos ajuda a construir uma sociedade mais ética.”

Os eventos já são proibidos em vários dos 32 estados do México, bem como em outros países latinos. A Colômbia aprovou uma proibição para as touradas a partir de 2027. A capital do Equador, Quito, também não permite mais que animais sejam mortos.

Na Cidade do México, a prática sofreu um golpe quando um juiz fechou a maior arena local, determinando que as touradas violavam os direitos dos moradores a uma cidade saudável e livre de violência. Em dezembro de 2023, a decisão foi revertida pela Suprema Corte do México.

Agora, a nova legislação deve entrar em vigor 210 dias úteis após a aprovação, dando tempo ao governo para que delibere novas regras para as touradas.

Já a Catalunha proibiu as touradas em 2010, após uma petição assinada por 180 mil pessoas ser encaminhada ao Parlamento da região autônoma.

Em março, um toureiro ficou gravemente ferido após o chifre de um touro perfurar o seu corpo e mantê-lo preso por dez segundos no México. O homem de 28 anos foi hospitalizado e submetido a uma cirurgia.

ht/ra (reuters, afp, ap)