24/11/2010 - 21:00
O artista austríaco Michael Marcovici, que vive e trabalha em Viena, baseia boa parte de seu trabalho em algo vital para a vida contemporânea: o dinheiro. Uma de suas obras chamou-se cashvertise – a união das palavras inglesas cash (dinheiro) e advertise (propaganda).
Para ele, a publicidade, cada vez mais onipresente, poderia avançar até as cédulas. Além de divulgar produtos e serviços, o cashvertise pouparia os cofres públicos, pois os anunciantes arcariam com os gastos da impressão do dinheiro. DINHEIRO fez essa sugestão a quatro publicitários brasileiros que se dispuseram a colocar seus clientes nas notas de real.
Apesar de a missão ter sido cumprida, a proposta não fez muito sucesso. “Como ideia artística é uma proposta muito interessante, mas como mídia o dinheiro não seria um bom espaço”, diz André Laurentino, vice-presidente da Lew Lara /TBWA. Para o publicitário, as cédulas são um patrimônio nacional. Portanto, não devem misturar o interesse das empresas privadas ao seu significado público.
“Usar esse espaço para vender um produto é muito invasivo.” José Cascão, diretor de criação do núcleo Saint-Gobain da agência Adag, também vê problemas na proposta. “Mais do que transportar valor, a relação de uma pessoa com o seu dinheiro chega a ser mítica”, diz ele.
As complicações vão além da questão patriótica. Há impedimentos legais, pois só o governo pode mexer no meio circulante. A veiculação da publicidade seria um processo difícil de implantar. “Há muitas limitações técnicas no papel, no tipo de impressão e nas características gráficas da nota”, acrescenta Cascão.
As notas não poderiam ser descaracterizadas. As cores teriam de ser respeitadas e a durabilidade e o valor de cada uma das cédulas teriam de ser considerados, itens decisivos na escolha do anunciante e da mensagem.
As cédulas de maior valor, como as de R$ 50 e R$ 100 circulam menos e, por isso, sua duração média é de três anos. As notas menores, de R$ 2 a R$ 20, são mais usadas e desgastam-se mais depressa, durando menos de dois anos.
Se as barreiras técnicas e filosóficas fossem superadas, as cédulas seriam a única mensagem publicitária que chegaria com certeza a todos os brasileiros. Hoje, mais de 4,2 trilhões de notas estão em circulação no País e, apesar do avanço dos meios eletrônicos de pagamento, 63% das transações acima de R$ 500 foram pagas em dinheiro, segundo o Banco Central.
Para pagamentos até R$ 20, esse percentual avança para 92%. A proposta de estampar publicidade no dinheiro coloca em discussão os limites da propaganda. “Nosso trabalho é buscar, todo o tempo, novas possibilidades de veicular a imagem dos nossos clientes, mas com o dinheiro chegamos ao extremo”, diz Cascão.