Presidente russo considera que relação entre os dois países está em nível “sem precedentes”. Líder chinês deu aval para ampliar compra de gás russo em meio a esforço anti-Ocidente.Um encontro entre o presidente da China, Xi Jinping, e seu homólogo russo, Vladimir Putin, em Pequim nesta terça-feira (02/09) fortaleceu as relações entre os dois países, uma aproximação que se acelerou com a invasão russa na Ucrânia.

Putin, que se referiu a Xi como “velho amigo”, deixou a reunião afirmando que a diplomacia China-Rússia está em um nível “sem precedentes”. O russo saiu vitorioso do encontro ao conquistar o aval do líder chinês ao projeto do gasoduto Força da Sibéria 2.

O acordo era esperado há anos pelo Kremlin, que procura mercados alternativos ao seu gás. A União Europeia pretende eliminar gradualmente a compra de combustíveis fósseis russos até 2027.

“Caro amigo, tanto eu como toda a delegação russa estamos felizes por nos encontrarmos mais uma vez com nossos amigos e colegas chineses”, disse Putin a Xi em uma reunião bilateral, cujas imagens foram divulgadas no canal oficial do Kremlin no Telegram.

“Nossa estreita comunicação reflete a natureza estratégica das relações entre a Rússia e a China, que estão em um nível sem precedentes”, acrescentou o presidente russo.

China confirma acordo por gás russo

Desde o início da guerra na Ucrânia, a China se tornou o principal parceiro econômico do país comandado por Putin, fruto de uma parceria “sem limites” firmada em 2022 para buscar contornar a influência do Ocidente.

A bandeira verde para a viabilização do gasoduto, porém, ainda não estava certa. O projeto pode fornecer 50 bilhões de metros cúbicos adicionais de gás por ano à China através da Mongólia, a partir dos campos de gás de Yamal. Se sair do papel, o país asiático, maior consumidor de energia do mundo, terá mais opções para reduzir sua dependência do gás natural liquefeito (GNL) dos Estados Unidos.

O CEO da estatal russa Gazprom, Alexei Miller, anunciou que um “memorando juridicamente vinculativo” foi acordado após conversas bilaterais entre Xi e Putin em Pequim e de uma reunião trilateral com representante da Mongólia. Os preços ainda não foram definidos.

“O grande acordo está finalmente em andamento”, analisou Kirill Babaev, diretor do Instituto da China e da Ásia Contemporânea em Moscou, um think tank que assessora o governo russo sobre a China.

“Embora ainda não conheçamos os parâmetros de preço e volume, nem os subcontratados do gasoduto, as negociações políticas agora ficaram para trás, dando lugar às tarefas comerciais.” A Gazprom poderá fornecer gás à China por pelo menos 30 anos.

Pequim consolida proximidade com Moscou

A visita de Putin ocorre em um contexto de mudança na abordagem dos EUA, agora mais protecionista, em relação ao comércio internacional.

Além disso, a China vem procurando se posicionar como um parceiro estável e confiável para a Rússia, apesar de protestos do Ocidente. Durante a reunião, Xi disse a Putin que as relações entre os dois países “resistiram ao teste das mudanças internacionais”.

O líder chinês também defendeu que seu governo está pronto para trabalhar com o de Putin para “promover a construção de um sistema de governança global mais justo e razoável”.

Ao menos 20 acordos de cooperação envolvendo outros setores também foram assinados na reunião, informou a emissora estatal chinesa CCTV.

China prepara demonstração de força

Putin, que tem sido amplamente rejeitado pelo Ocidente devido à sua campanha militar na Ucrânia, está em Pequim para participar da maior parada militar já realizada no país, nesta quarta-feira. O evento comemora 80 anos do final da Segunda Guerra Mundial e a rendição do Japão, um conflito que devastou a China.

Chefes de governo dos EUA e da Europa Ocidental não comparecerão, assim como do Japão e da Coreia do Sul. Os únicos líderes ocidentais convidados são da Eslováquia e da Sérvia, dois países que têm mantido laços com a Rússia desde o início do conflito na Ucrânia.

Alguns equipamentos militares chineses serão mostrados ao público pela primeira vez, incluindo armas estratégicas terrestres, navais e aéreas, equipamentos avançados de guerra de precisão e drones.

Além de Putin, o presidente do Irã, Masoud Pezeshkian, e Kim Jong-un, da Coreia do Norte, são os líderes de maior destaque que participarão do desfile do Dia da Vitória na China.

Kim Jong-un faz rara viagem ao exterior

Relatos obtidos por agências de notícias indicam que Kim já está na China, onde pode realizar seu primeiro encontro presencial simultâneo com Putin e Xi. Uma possível cúpula que inclua também o presidente do Irã tem sido apelidada por analistas ocidentais de “eixo da revolta”, devido ao seu caráter anti-Ocidente.

Esta é a primeira visita do líder norte-coreano à China desde 2019 e a quinta desde que assumiu a liderança do país após a morte de seu pai em 2011.

A viagem ocorre no momento em que o presidente americano Donald Trump e o sul-coreano Lee Jae Myung expressaram interesse de renovar as negociações de paz com a Coreia do Norte. Pyongyang tem recusado os diálogos até o momento, enquanto trabalha para aumentar seu arsenal nuclear.

A Coreia do Norte tem apoiado ativamente a guerra da Rússia na Ucrânia, tanto com seus próprios soldados quanto com munições, em troca de assistência econômica e militar de Moscou.

Pequim, por sua vez, tem sido o principal aliado de Pyongyang há décadas e, embora as relações tenham ficado tensas durante a pandemia da covid-19, Xi e Kim prometeram fortalecer seus diálogos bilaterais em 2021.

Analistas observam se um encontro inédito entre Putin, Xi e Kim poderá sinalizar relações de defesa mais estreitas após o pacto assinado por Rússia e Coreia do Norte em junho de 2024. Uma possível aliança semelhante entre Pequim e Pyongyang altera o cálculo de poder militar na região Ásia-Pacífico.

Segundo a agência estatal russa TASS, Putin e Xi não discutiram o envio de um contingente de manutenção da paz chinês para a Ucrânia.

gq/bl (Reuters, AFP, AP, DPA, DW)