08/03/2023 - 12:29
Um dia depois do maior protesto contra a reforma da Previdência promovida pelo presidente liberal Emmanuel Macron, sindicatos e governo estão fazendo campanha por suas posições enquanto a pressão aumenta sobre ambos. Qual é a situação?
– Crescente pressão sindical –
A mobilização entrou, na terça-feira (7), em uma nova fase com o maior protesto até o momento — 1,8 milhão de manifestantes, de acordo com as autoridades, e 3,5 milhões, segundo o sindicato CGT — e com o início de greves prorrogáveis.
As manifestações têm como objetivo forçar o governo a retirar o projeto de lei que pretende adiar a idade de aposentadoria de 62 para 64 anos a partir de 2030 e de antecipar para 2027 a exigência de contribuição por 43 anos (e não 42, como atualmente) para receber a pensão integral.
Depois de cinco grandes manifestações pacíficas em janeiro e fevereiro, os sindicatos decidiram intensificar sua luta diante da recusa do governo Macron e da primeira-ministra, Élisabeth Borne, em recuar com a medida.
As ações estão concentradas em setores-chave como energia e transporte. Os sindicalistas voltaram a bloquear nesta quarta-feira o transporte de combustíveis das refinarias, dos depósitos de gás e de quatro terminais de GNL (gás natural liquefeito).
Os importantes portos de Le Havre, Rouen e Marselha amanheceram bloqueados e os trabalhadores em greve do setor elétrico continuam reduzindo a produção de eletricidade, que caiu 13.000 MW na véspera.
Os transportes também registram problemas pelo segundo dia consecutivo, com cancelamentos de voos e de viagens de trens, além de interrupções no sistema público em Paris, mas em menor escala do que no dia anterior.
Os sindicatos convocaram novas manifestações no sábado e na próxima semana (provavelmente quarta-feira). Organizações juvenis também chamaram para a participação em marchas feministas nesta quarta e quinta-feira.
– Contagem regressiva –
O governo optou por um controverso procedimento parlamentar — um projeto que altera a lei de financiamento da Seguridade Social — que limita o tempo de análise e facilita a aplicação do plano.
As duas câmaras do Parlamento têm agora até 26 de março para adotar o mesmo texto. Caso contrário, o governo pode implementar a medida por meio de portaria a partir desta data, algo que nunca aconteceu.
O Senado (Câmara Alta), controlado pela oposição de direita favorável à reforma, tem até o domingo para votar a medida. Já na Assembleia Nacional (Câmara Baixa), o prazo expirou sem que o cumprisse efetivamente.
Na próxima semana, representantes de ambas as Câmaras devem se reunir para chegar a um texto comum, sobre o qual deputados e senadores devem se pronunciar novamente.
– Macron quer ganhar tempo –
Com a contagem regressiva em andamento, o governo busca ganhar tempo. Macron está utilizando parte de seu crédito político, visto que a pandemia de covid-19 o obrigou a estacionar uma reforma previdenciária anterior e também contestada em seu primeiro mandato.
No entanto, um editorial divulgado no jornal Libération na quarta-feira considerou como “arriscada” a aposta em uma “vitória por atrito” e alertou que “nada indica que [o governo] possa confiar em uma perda de ímpeto” dos protestos.
O presidente, que enfrentou forte resposta social em 2018 e 2019 com os “coletes amarelos”, deixou Borne na linha de frente e focou na elaboração da agenda pós-reforma.
Educação, saúde, clima, migração e instituições são alguns dos temas com os quais Macron quer deixar rapidamente para trás a questão previdenciária, uma vez aprovada, e recuperar o fôlego de seu segundo mandato, iniciado em maio.
O mandatário conta com o apoio da oposição de direita para conseguir aprová-la. Esse cenário o permitiria evitar a imagem de “autoritário”, caso consiga aplicar a reforma sem ter maioria legislativa.
Na terça-feira, as centrais sindicais tentaram se concentrar em Macron pedindo-lhe uma reunião “urgente”, sem sucesso. A presidência então sugeriu que batessem à porta do governo de sua primeira-ministra, cujo porta-voz, Olivier Véran, assegurou que a decisão está no Parlamento.
Apesar disso, os sindicatos estão determinados a continuar com a pressão mesmo que a reforma seja aprovada. Em 2006, protestos estudantis forçaram o então governo a retirar um projeto deferido sobre contratos de trabalho para jovens.