Antes de embarcar para uma curta viagem à África, o presidente Lula realizou três longas reuniões com o ministro Guido Mantega, da Fazenda. Lula cobrou pressa da equipe econômica. Ele quer um pacote para acelerar o crescimento e fala em ?destravar o País?. Mas o caminho é contraditório. Ele exige aumento nos investimentos, e simultaneamente se diz contrário à reforma da Previdência, voraz consumidora de recursos públicos. Apega-se à estabilidade, mas é contra o corte de despesas e da folha de pagamento do funcionalismo. Promete ajudar Estados endividados, como o Rio Grande do Sul, e jura que a Lei da Responsabilidade Fiscal é intocável. Ao perceber a complexidade da sua equação, ele acabou revelando o que espera de sua equipe econômica. ?Precisamos mais do que um economista; precisamos de mágicos para encontrar uma saída para voltar a crescer?, disse ele em Brasília, na posse da diretoria da Confederação Nacional da Indústria, na terça-feira 28.

 

O ministro Mantega, uma espécie de curinga de Lula, é quem terá, agora, de atuar no papel de Harry Potter. E o tamanho do seu desafio foi colocado na quarta-feira 29, quando o IBGE divulgou um crescimento de apenas 0,5% no terceiro trimestre de 2005. Ao que tudo indica, o País crescerá 3% neste ano e fechará o primeiro quadriênio da ?era Lula? com uma média de expansão de apenas 2,7% ? a metade do que crescem, na média, os emergentes. E o que Mantega pode fazer para mudar o quadro? Quantos coelhos há na sua cartola? Discretamente, ele finaliza um pacote de medidas de desoneração fiscal, que será apresentado até o dia 15 de dezembro. Devem constar dele novas reduções das alíquotas do IPI, a redução dos prazos de compensação do PIS e do Cofins, que hoje incidem sobre instalações produtivas e máquinas e equipamentos. Estudam-se também a ampliação do prazo para recolhimento da Previdência e a desoneração das folhas de pagamento, em benefício das empresas que utilizam mão-de-obra intensiva. Essas medidas podem gerar um caixa extra de R$ 21 bilhões para o setor privado. Na ponta do consumo, Mantega custou mas aprovou a correção de 3% na tabela do IR Pessoa Física em 2007 e mais 3% em 2008 ? uma renúncia fiscal de R$ 900 milhões. ?No começo, fui contra, pois defendia a idéia de que a desoneração só deveria valer para investimentos?, justificou-se. ?Mas é preciso também estimular o consumo.?

Mantega diz que as condições para o País retomar um ritmo mais forte de crescimento já estão dadas. Mas o arsenal do ministro é limitado diante da ambição do presidente de marcar o segundo mandato com taxas de crescimento semelhantes às dos anos 70, época do ?milagre brasileiro?. Para recuperar a capacidade de investimento do setor público, o caminho mais curto é o corte de gastos públicos e a reforma da Previdência. Essa receita, porém, soa impopular e não conta com o aval de Lula, que hoje rejeita novos sacrifícios. Ao mesmo tempo, o quadro fiscal pode se tornar até pior com novas medidas que vêm sendo propostas em vários poderes. O Senado, por exemplo, aprovou o 13º salário para o Bolsa Família. O Supremo Tribunal Federal concedeu aumento de 5% para ministros das cortes mais altas, que já recebem salários de R$ 24,5 mil. E o Conselho Nacional de Justiça confirmou que 2,9 mil integrantes do Judiciário recebem mais de R$ 30 mil por mês. Tudo à custa do Tesouro ? ou melhor, do contribuinte ?, que já convive com uma das maiores cargas tributárias do mundo.

Ao tomar posse na CNI, o presidente reeleito Armando Monteiro Neto pôs o dedo na ferida. ?Conviver com uma carga tributária muito superior à média dos países ricos significa conformar-se com a manutenção do padrão de crescimento insatisfatório?, disse ele. Paulo Skaf, da Fiesp, também disse que o ritmo atual da economia é fruto das escolhas do governo e da falta de ousadia do Banco Central. No meio da semana, o Comitê de Política Monetária reduziu a taxa de juros em 0,5 ponto percentual, para 13,25% ao ano. Hoje, em termos reais, ela é de 8,7% ao ano ? e ainda é a maior do mundo. ?Isso claramente inibe o investimento das empresas privadas?, disse à DINHEIRO o ex-ministro Delfim Netto. E o mais grave é que o BC também sinalizou que, em 2007, as quedas serão muito mais lentas e cautelosas.