Independentemente da plataforma de rede social que você utiliza, é muito provável que se depare regularmente em seu feed com conteúdo sobre saúde mental e dicas de autoajuda. E mesmo que você não seja um usuário ativo de alguma plataforma, é provável que já tenha percebido vocabulário da psicologia em conversas diárias com amigos.

Termos como “gaslighting”, “bandeiras vermelhas”, “comportamento tóxico” ou “gatilhos de ansiedade” e até mesmo terminologias clínicas como “narcisismo”, “trauma” ou “TDAH” tornaram-se hashtags nas redes sociais, entrando nas nossas conversas diárias.

Muitas vezes, parece que a saúde mental é um dos assuntos mais prevalecentes nas redes sociais.

Para Halley Pontes, psicólogo da Birkbeck, University of London, isto pode ser uma oportunidade, já que mais pessoas estão tomando consciência sobre a saúde mental.

“Pode levar a uma maior compreensão e empatia por aqueles que sofrem de problemas de saúde mental”, disse à DW.

A popularidade desses temas na internet também é “um sinal de que as pessoas preferem ser mais abertas e diretas quando se trata de discutir questões de saúde mental, em vez de as esconderem como um problema embaraçoso”, acredita a psicóloga alemã Angelina Hahn.

Além disso, os próprios profissionais de saúde utilizam as redes sociais para compartilhar conteúdos sobre questões psicológicas, chegando a alcançar milhões de usuários.

No entanto, à medida que a fronteira entre os influenciadores e os profissionais de saúde mental se torna mais tênue, surgem desafios e potenciais problemas.

Um estudo de 2021 que analisou os 100 vídeos mais populares do TikTok sobre Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) concluiu que mais de metade deles eram enganosos.

Os vídeos com as maiores taxas de interação baseavam-se em histórias pessoais e não continham qualquer apelo para incentivar os usuários a procurar ajuda profissional. Apenas 21% dos vídeos analisados eram úteis e informativos, a maioria deles compartilhados por profissionais e organizações de saúde mental.

Os problemas do autodiagnóstico

Pontes salientou que adquirir conhecimentos gerais sobre conceitos psicológicos pode aumentar a autoconsciência de uma pessoa e ajudá-la a reconhecer padrões no seu comportamento, pensamentos e emoções. Mas isso, pondera Pontes, também tem suas limitações e pode, por vezes, ser enganoso.

Durante muito tempo, Sina, uma agente de vendas de 30 anos que deseja manter o anonimato, acreditou sofrer de “TDAH ou de um distúrbio de concentração semelhante”.

“Essa ideia não partiu só das redes sociais, também li artigos de fontes credíveis sobre o assunto”, contou à DW.

No entanto, depois de ter sido exposta a um fluxo constante de conteúdos sobre TDAH e distúrbios relacionados com a atenção, ela começou a detectar muitas semelhanças entre o que estava sentindo e o que lia na internet como sintomas de TDAH.

Por fim, acabou procurando ajuda profissional, cogitando até mesmo a necessidade de tomar medicação.

Mas, para sua surpresa, os psiquiatras disseram que seus problemas de concentração não estavam relacionados com qualquer déficit de atenção.

“No fim, a minha dificuldade em me concentrar tinha outras razões, que mais tarde descobri e resolvi através de sessões de terapia”, disse Sina.

De acordo com Hahn, adquiri conhecimentos sobre problemas de saúde mental pode servir como um passo inicial, mas não é o suficiente.

“Como seres humanos, temos tendência a pensar o melhor ou o pior de nós mesmos”, explica. “Por isso, se tentarmos aprender sobre os nossos problemas por conta própria, podemos desenvolver uma compreensão distorcida deles.”

Além disso, embora aprender sobre psicologia forneça alguns conhecimentos generalizados, “só um profissional de saúde mental pode oferecer conselhos personalizados, intervenções terapêuticas e estratégias baseadas nas circunstâncias únicas de cada indivíduo”, esclarece Pontes.

Informação muito simplificada

Embora as redes sociais possam aumentar a nossa sensibilização para a saúde mental, podem ter efeitos secundários adversos.

Para tornar a informação mais fácil de ser consumida, alguns criadores de conteúdo podem acabar divulgando explicações demasiadamente rasas sobre perturbações de saúde mental complexas. A utilização casual de terminologias da área da psicológica pode resultar em equívocos em relação aos conceitos reais.

“Por exemplo, alguém pode afirmar que tem TOC [abreviatura de transtorno obsessivo-compulsivo] porque gosta de coisas arrumadas, o que banaliza e deturpa a experiência de alguém que realmente tem transtorno obsessivo-compulsivo”, observa Pontes.

Ver outras pessoas discutindo abertamente a sua saúde mental pode convencer algumas pessoas de que o seu problema é “comum”, e, por isso, “podem aceitar os termos como rótulos que os descrevem, o que pode impedir algumas pessoas de procurar ajuda profissional”, disse Heinrich Dürscheid, membro da Associação Profissional de Psicólogos Alemães (BDP, na sigla em alemão), à DW.

Como distinguir os bons conteúdos

Os algoritmos das redes sociais também podem amplificar conteúdos pouco confiáveis sobre saúde mental. Então, como podemos distinguir os bons vídeos e textos sobre o tema?

Antes de decidir seguir uma conta que partilha conteúdos sobre saúde mental, é crucial verificar a credibilidade das fontes. “Procure os nomes dos criadores de conteúdo e certifique-se de que está seguindo profissionais formados com credenciais válidas”, recomenda Hahn.

Ela reconhece, porém, que isso está cada vez mais difícil, “especialmente porque há muitos psicólogos charlatães e autoproclamados coaches de vida que podem apresentar perfis aparentemente legítimos em seus sites ou contas do LinkedIn”.

De acordo com Pontes, os conteúdos fiáveis sobre saúde mental são honestos quanto à complexidade das perturbações e sintomas mentais, às suas origens e até à ciência que lhes é subjacente.

“Desconfie de declarações que generalizam tópicos complexos de saúde mental em termos excessivamente simplistas ou sugerem que uma única solução funciona para todos”.

Ele também adverte contra mensagens que utilizam uma linguagem sensacionalista, títulos “caça-cliques” ou que fazem afirmações exageradas.

“Isto indica frequentemente uma prioridade na obtenção de visualizações ou seguidores em detrimento do fornecimento de informações exatas”, afirmou. “Seja cético em relação a afirmações que prometem resultados imediatos ou soluções fáceis.”

A rejeição dos tratamentos convencionais é outro sinal a ser levado em conta, de acordo com Pontes.

“Os tratamentos alternativos podem ser valiosos para algumas pessoas, mas tenha cuidado com conteúdos que descartem completamente os tratamentos convencionais”, afirmou.

Ele também disse que os “discursos de venda” devem gerar desconfiança. Segundo ele, à medida que estes termos relacionados com a saúde mental se tornam moda, existe a possibilidade de serem cooptados para fins comerciais, reduzindo a seriedade na abordagem e explorando potencialmente grupos vulneráveis.

De acordo com ele, as pessoas devem ter cuidado com conteúdos que promovam ou vendam fortemente produtos, serviços ou cursos com curas milagrosas ou soluções rápidas.

“Como diz o ditado, se algo parece bom demais para ser verdade, provavelmente é”, resume Pontes.