Na quarta-feira (6 de julho), o Palmeiras venceu o paraguaio Cerro Porteño por 5 a 0, em jogo válido pelas oitavas de final da Copa Libertadores da América de 2022. Mais do que a goleada, e mais que a própria classificação do clube paulista para a próxima fase do torneio, em que jogará contra o Atlético de Belo Horizonte, o assunto da noite foi o gol de bicicleta de Rony, o quinto da partida, marcado aos 37 minutos do segundo tempo. O lance, em que o jogador se atira para o ar com as costas paralelas ao chão e gira as pernas para acertar a bola é considerado dos mais difíceis de se executar. No Google Trends, a busca por Rony atingiu seu segundo pico histórico, inferior apenas ao da conquista da Libertadores de 2020, jogada em fevereiro de 2021, e oito vezes maior que qualquer medida ao longo de 2022. Quanto vale esse gol? Caso o Palmeiras faça a captação de seus jogos – o que já faz, para seu canal oficial no YouTube – e decida ‘vender’ a cena do gol em 1 mil vídeos numerados de 0001 a 1.000 e identificados por NFTs, ele pode? E quem será o autor? Quem gravou o gol? Quem narrou? O próprio Rony? O Palmeiras? Quem deu o passe? Ou serão todos coautores? E se um torcedor, do estádio, fizer o mesmo? Gravar a cena e decidir vender? Poderá?

Mercado de NFTs desaba após frenesi de ativos digitais

Os questionamentos começam a surgir cada vez mais no campo da arte digital. E vão ser exponencialmente multiplicados com a popularização dos NFTs, os Non-Fungible Tokens (ou Tokens Não Fungíveis). Eles são uma espécie de selo que autenticam uma criação única, seja do mundo físico ou do mundo digital. Aos que ainda não se familiarizaram com o tema, os NFTs nasceram a partir da mesma base que originou as criptomoedas: o blockchain – solução tecnológica que garante a propriedade e a transparência nas transações do mercado cripto. Ao ser ‘dono’ de 1 bitcoin, por exemplo, a pessoa não tem essa moeda na carteira, como pode ter uma nota de US$ 100 ou R$ 50. Uma nota de dólar ou de real é algo fungível, que pode ser trocado por outras das mesma espécie, qualidade ou quantidade. Já um valor em criptomoeda é algo não fungível. É preciso de algo que ‘documente’ sua posse e sua ‘autenticidade’. Esse mercado movimentou globalmente US$ 15,7 bilhões em 2021, volume que deve chegar a US$ 122,4 bilhões em 2028, num crescimento de superior a 34% a cada 12 meses, segundo a SkyQuest Technology, grupo de inteligência de mercado.

Mais do que certificar o mercado criativo por meio de um documento que garante a ‘posse’ e a ‘autenticidade’ o NFT vai revolucionar o que entendemos como arte e todas as suas fronteiras. Por exemplo, a cena do gol de bicicleta de Rony, ou os memes criados a partir dele, ou a gravação do som do grito de comemoração dos torcedores. Ou o prato criado pelo chef estrelado. Disruptivo é pouco para descrever o que estamos no limiar de viver nesse universo criativo. Nos Estados Unidos, um programa de inteligência artificial (IA) intitulado Dall-E 2, desenvolvido pela associação sem fins lucrativos Open AI, pode desenhar qualquer coisa a partir de palavras. Ele funciona como uma grande rede neural que reúne palavras e um acervo imagético e a partir da combinação de comandos cria ‘imagens’. Vender essas peças como arte será possível. Mesmo que o ‘criador’ seja uma mistura de robô e ser humano.