A  primeira semana de 2011 confirmou as pressões que levaram a inflação em 2010 a fechar com os maiores índices dos últimos seis anos. E o vilão é o mesmo: o preço dos alimentos. Puxado por hortaliças e legumes, o IPC-S iniciou o ano com alta de 0,92%, acima dos 0,51% registrados na primeira semana do ano passado em sete capitais brasileiras, segundo a Fundação Getulio Vargas. A Fipe, que calcula a inflação na cidade de São Paulo, também registrou alta na primeira quadrissemana do ano. Metade do aumento de 0,61% do IPC nas quatro semanas terminadas no dia 7 de janeiro foi causada pelo componente alimentação, especialmente hortaliças, como a alface. 

 

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Sazonalidade? Alta das carnes não tem relação com o clima ou demanda aquecida

 

Para quem viu o preço da carne disparar quase 30% nos açougues e supermercados em 2010, essas variações sazonais de preços estão cada vez mais difíceis de engolir. O governo Dilma que o diga.

 

Em Brasília, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, reabriu o debate sobre a adoção de índices de inflação que não sejam influenciados pelas subidas de preço ocasionais. Ele quer um indicador para medir apenas o núcleo da inflação, excluindo itens com forte variação sazonal, como alimentos e combustíveis, que acabam tendo um efeito em cascata em outros setores da economia. 

 

“É preciso reduzir a indexação da economia”, afirmou o ministro à DINHEIRO. Ele defende uma mudança no índice de correção dos contratos, muitos deles atrelados ao IGP-M e ao IGP-DI. 

 

Calculados pela FGV, esses termômetros ficaram acima de 11% no ano passado, quase o dobro da inflação oficial medida pelo IPCA, de 5,91%. Seria o caso de riscá-los do mapa econômico? É uma discussão complexa.

 

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Não se trata de manipular índices de inflação, como era acusado o governo militar na época dos ministros Antônio Delfim Netto e Mário Henrique Simonsen (com a famosa “inflação do chuchu”) e como é questionado hoje o gabinete de Cristina Kirchner, na Argentina. 

 

O desafio é escolher o método mais apropriado para medir as variações de preços num país que almeja reduzir as taxas de juros para níveis civilizados. Nos Estados Unidos, por exemplo, o Federal Reserve (banco central) não leva em conta as variações de alimentos e petróleo na inflação que serve de parâmetro para a política monetária.

 

Já os países da União Europeia tendem a seguir o modelo adotado no Brasil. Aqui, usa-se a fórmula cheia, medida pelo IPCA e usada pelo Banco Central na definição da taxa básica de juros, a Selic.

 

Para os especialistas ouvidos pela DINHEIRO, o determinante não é o modelo, mas há quanto tempo ele é aplicado. Mudar o cálculo poderia ajudar o Brasil a não subir os juros, mas despertaria a desconfiança na população, acostumada a medir o valor da moeda a partir dos alimentos. 

 

“Não podemos querer sempre tirar os itens que vão contra a gente. O Brasil é uma economia grande e alguns setores e produtos tendem a acompanhar o que acontece lá fora. É natural”, diz Felipe Tâmega, economista-chefe do banco Modal. “O grande risco de uma mudança desse tipo é perder credibilidade”, afirma José Marcio Camargo, economista da Opus Gestão de Recursos.

 

No caso da carne, o assunto é controverso e a culpa atribuída à sazonalidade, discutível. A disparada no preço do alimento, item que mais puxou a alta no IPCA, não está atrelada a fatores sazonais nem à alta na demanda. Ela se deve à escassez de gado pronto para o abate, consequência da redução de rebanhos iniciada em 2007. 

 

Com um número menor de matrizes, a reposição dos rebanhos foi prejudicada. “Houve uma aceleração enorme no abate das fêmeas. O resultado é a falta de carne e o aumento no preço”, diz a superintendente técnica da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), Rosemeire Cristina dos Santos.

 

Enquanto não há consenso sobre um novo índice de inflação oficial, o governo trabalha para trocar o IGP-M pelo IPCA nos contratos de tarifas de serviços públicos. Desde 2008, isso já acontece em São Paulo no caso dos reajustes dos pedágios das estradas. É um caminho.