10/07/2024 - 16:22
Formada às pressas antes de eleição legislativa, Nova Frente Popular surpreendeu ao formar maior bancada de deputados. Agora, desafio da aliança é manter união e encontrar agenda de consensoImediatamente após as eleições europeias de 9 de junho, a França teve duas grandes surpresas políticas: o anúncio do presidente Emmanuel Macron de que a Assembleia Nacional seria dissolvida e novas eleições seriam realizadas. E, no dia seguinte, a esquerda francesa, que estava dividida em vários partidos, surpreendeu a todos ao formar uma aliança conjunta, a Nova Frente Popular (NFP), que também passou a atuar para impedir uma vitória eleitoral da ultradireitista Reunião Nacional (RN), de Marine Le Pen.
E a aliança de esquerda surpreendeu: formou a maior bancada no segundo turno das eleições, em 7 de julho, e agora tenta assegurar a indicação de um primeiro-ministro. “A Nova Frente Popular está pronta para governar”, disse o líder do partido populista de esquerda A França Insubmissa (LFI), Jean-Luc Mélenchon, um dos membros da NFP, na noite da eleição. “Ganhamos e agora vamos governar”, declarou Marine Tondelier, secretária-geral dos Verdes, que é considerada a principal iniciadora da nova aliança de esquerda.
“A Nova Frente Popular deve assumir o controle dessa nova página da nossa história”, declarou o líder do Partido Socialista (PS), Olivier Faure, em seu discurso, tornando claro o conflito para um futuro próximo: Faure não quer trabalhar com a coalizão centrista Ensemble (Juntos), do preidente Macron.
Quem faz parte da aliança de esquerda?
Os socialistas são o único grupo da aliança de esquerda com experiência no governo. Com François Mitterrand (1981-1995) e François Hollande (2012-2017), o partido já contou com dois presidentes franceses. O PS também tem experiência com a chamada “coabitação”, ou seja, a situação política na qual o partido do presidente não tem maioria no parlamento e precisa trabalhar em conjunto com um governo organizado por um grupo político rival. De 1997 a 2002, os socialistas contaram com o primeiro-ministro Lionel Jospin sob o presidente conservador Jacques Chirac.
No entanto, os socialistas são apenas o segundo grupo mais forte na atual aliança de esquerda: a impopularidade de Hollande em 2017 favoreceu a ascensão de seu ex-colega de partido Jean-Luc Mélenchon, cujo legenda A França Insubmissa (LFI) se concentra mais no populismo de esquerda e no ceticismo em relação à UE. O próprio Mélenchon provocou polêmica no passado com declarações acusadas de serem antissemitas, além de ter minimizado a invasão russa da Ucrânia. Ele ainda pede que a França deixe a Otan.
O terceiro maior parceiro é o Partido Verde, cujo nome completo é “Europa Ecológica dos verdes” (EELV). O Partido Comunista Francês (PCF) também está representado, embora com menor peso, bem como uma série de partidos menores ou minúsculos, como por exemplo, um grupo que é a favor da independência do distante território ultramarino da Polinésia Francesa.
A aliança de esquerda pode enfrentar o mesmo destino de seus antecessores?
A aliança de esquerda NFP surgiu de uma colaboração anterior que é considerada um fracasso: quando Macron e Le Pen se enfrentaram em 2022, Mélenchon convocou a esquerda francesa a se unir sob sua liderança. Sua aliança: a “Nova Frente Popular Ecológica e Social” (Nupes) acabou se tornando a segunda força mais forte no parlamento, mas não conseguiu converter esse sucesso eleitoral em poder político. A formação de um grupo parlamentar conjunto na Assembleia Nacional fracassou – devido aos socialistas, comunistas e verdes, que não queriam diluir seus respectivos perfis em uma aliança de oposição do eurocético Mélenchon.
Da Nupes à nova aliança de esquerda NFP, houve uma mudança fundamental: em vez de Mélenchon como figura central, os líderes dos maiores partidos estão agindo como uma liderança coletiva – e, portanto, sem um candidato principal, que seria o candidato lógico para o cargo de chefe de governo com base nos últimos resultados das eleições.
A cientista política Sophie Pornschlegel, do think tank Europe Jacques Delors, sediado em Bruxelas, acredita que a nova aliança tem mais chances de sucesso: “Eles têm mais motivos para permanecerem juntos, pois podem de fato formar um governo e exercer o poder executivo. Essa é uma grande motivação para caminharem juntos.” Além disso, os socialistas têm mais peso dentro da aliança após as recentes eleições e uma nova geração de políticos menos egocêntricos nos partidos está definindo o rumo, refelete Pornschlegel.
Da aliança à coalizão?
Ainda não se sabe se a aliança de esquerda conseguirá capitalizar politicamente sua maioria relativa: Mesmo no período que antecedeu a eleição, representantes de alguns partidos se manifestaram a favor de um governo de unidade – com Macron, contra Le Pen. No entanto, a LFI, em particular, insistiu em suas demandas políticas máximas, que não podem ser realizadas com Macron. No entanto, o presidente descartou categoricamente a possibilidade de trabalhar com Mélenchon no período que antecedeu a eleição.
“É mais uma questão de quem fica e com quais cargos no novo governo”, diz Sophie Pornschlegel: “É muito improvável que A França Insubmissa forneça o primeiro-ministro porque não funcionará com Macron. Mas as negociações estão apenas começando, por isso ainda é difícil prever.”
No decorrer desta semana, a aliança de esquerda quer chegar a um acordo sobre uma proposta para o primeiro-ministro. No entanto, uma questão ainda mais importante, afirma Marine Tondelier, dos verdes, será quais políticas o novo governo deve implementar.