A convicção de Margaret Thatcher, o pragmatismo de Angela Merkel, a dissimulação cheia de milongas de Cristina Kirchner ou a candura de Michelle Bachelet? Em qual delas a primeira presidente do Brasil, Dilma Rousseff, vai se inspirar? Nos bastidores da política ela já é chamada de Margaret – em alusão ao estilo linha dura da ex-primeira ministra britânica. Alguns acham que ela penderia mais para Angela, que é uma versão moderada de Margaret. 

 

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Elas chegaram lá primeiro: a chilena Michelle Bachelet (à esquerda), presidente de 2006 a 2010; a alemã Angela Merkel (centro), chanceler desde 2005 (está no segundo mandato); e a argentina Cristina Kirchner, presidente desde 2007 

 

Outros temem que ela se transforme numa versão verde-e-amarela de Cristina, que governou à sombra do marido, o falecido Néstor Kirchner – e, assim como ela, Dilma governaria à sombra de Lula. E muitos desejam que ela revele seu lado Michelle, mais maternal. 

 

Se o passado ilumina, Dilma estaria mais inclinada a tombar para o lado de Michelle– e o primeiro compromisso assumido pela candidata eleita, no discurso da vitória, foi feito em relação às mulheres, quando defendeu “igualdade de oportunidades” em todas as áreas. Foram sinais claros de que ela pode iniciar uma nova era no governo brasileiro: a cor-de-rosa, com políticas afirmativas em relação às mulheres. 

 

De fato, existe uma expectativa das mulheres eleitoras sobre esse primeiro governo de saia e tailleur. “Espero que ela promova políticas públicas focadas nas mulheres. Ainda temos uma luta árdua em busca da igualdade de gêneros. 

 

E uma democracia só existe completamente com essa paridade”, diz Rosane Reis Lavigne, defensora pública do Rio de Janeiro, militante da Articulação das Mulheres Brasileiras e eleitora de Dilma. E será que essa busca pela divisão igualitária vai chegar ao seu ministério? Se ela se inspirar em Michelle, com certeza. 

 

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A presidente chilena montou uma equipe ministerial com 50% de homens e 50% de mulheres. Rosane lembra que a participação feminina na política brasileira ainda é tímida. “Em comparação com outros países da América Latina, nosso quadro chega a ser vergonhoso, mas só o fato de sua eleição suscitar a discussão da paridade de gêneros, já é válido.” 

 

A pedagoga Schuma Schumaher, coordenadora-executiva da Redeh, ONG que defende direitos das mulheres, concorda com a colega feminista. “A grande conquista da eleição de Dilma já se fez e é o fato de a sociedade brasileira aceitar ser comandada por uma mulher”, analisa Schuma, escritora agraciada com o Prêmio Jabuti de literatura por seu livro Mulheres Negras no Brasil. 

 

“Por outro lado, devemos considerar que sua candidatura foi influenciada por um governo anterior, do mesmo partido, que teve uma avaliação muito positiva. Quer dizer, ela não foi avaliada por ser mulher, mas pela trajetória de seu antecessor”, diz Schuma. 

 

O sociólogo, doutor em geografia humana, escritor e membro do Grupo de Análises de Conjuntura Internacional da USP Demétrio Magnoli concorda: “Não vejo as pessoas escolhendo a Dilma por ela ser mulher. Ela foi a escolhida de Lula para sucedê-lo por não fazer sombra a ele, por não ter luz política própria. Ele mesmo disse que Dilma era seu pseudônimo”, afirma Magnoli. 

 

O sociólogo acredita que Dilma no poder é praticamente um terceiro mandato do ex-presidente. “Ele criou uma fábula eleitoral paternalista com essa história de mãe do povo. Parece estar embutido no discurso o seguinte: ‘olha eu vou precisar sair um pouco de cena, mas a mamãe vai ficar tomando conta da casa enquanto me ausento. Mas depois eu volto’.” 

 

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A mestra: informalmente, Dilma já era chamada de Margaret pelos colegas de

ministério do governo Lula, em função do estilo firme e decidido de enfrentar os problemas

 

E no mercado de trabalho? Que reflexos a eleição de Dilma poderá imprimir na vida da trabalhadora? Para Arnaldo Mazzei Nogueira, professor-doutor de administração da FEA/USP, especializado em relações de trabalho e recursos humanos, assim como a eleição de Lula ajudou na autoestima do trabalhador, o fato de Dilma assumir a Presidência também levará benefícios às mulheres. 

 

“A eleição de Dilma pode criar um clima favorável para que se promova uma melhor participação das trabalhadoras em cargos executivos e gerenciais nas organizações”, comenta Nogueira, que percebeu, nos últimos anos, como professor, um maior interesse das mulheres em cursos de formação contábil. 

 

Apesar da natural euforia inicial de se ter uma mulher presidente, Nogueira adverte: “Ainda é cedo para pensar nesses reflexos. Os movimentos do mercado de trabalho são lentos. Não se muda de um golpe só toda uma estrutura. É um processo de longo prazo, principalmente em cargos de direção.” 

 

E se a administração dela for ruim? Isso poderá provocar uma retração nessa evolução da mulher no mercado de trabalho? “Sim. Pode ser que iremos ouvir: tá vendo, você coloca uma mulher num cargo executivo e ela prova a incapacidade.”