01/09/2010 - 21:00
Nos últimos meses, uma guerra vem sendo travada pelo valioso mercado europeu de cápsulas de café, que movimenta cerca de US$ 17 bilhões anuais. De um lado está a gigante suíça Nestlé, que inaugurou esse segmento em 1986 com as já famosas máquinas Nespresso.
Do outro, despontam a americana Sara Lee e a também suíça Ethical Coffee, que, recentemente, colocaram no mercado produtos similares. Por coincidência, eles cabem perfeitamente nas máquinas da Nespresso. Um outro detalhe, no entanto, dá um aroma especial a essa disputa: o sócio e presidente da Ethical Coffee é Jean-Paul Gaillard, o criador das cápsulas originais.
Ele dirigiu a Nespresso por uma década e agora incomoda os ex-patrões com uma versão da mina de ouro da Nestlé. Com seu monopólio colocado em xeque, a corporação suíça apelou à Justiça.
“Se a Nestlé ganhar essa causa eu sou Jesus Cristo!”, diz Gaillard à DINHEIRO de seu escritório em Fribourg (Suíça), com seu estilo provocador e superlativo. Segundo ele, seu produto está longe de ser uma cópia.
“Eu criei as cápsulas usadas hoje pela Nespresso e agora encontrei uma forma de melhorá-las sem quebrar a patente. É uma evolução do produto”, afirma. A Nespresso rebate. “Nós usamos a ciência para ficar à frente da concorrência. Então, quando nossa inovação é violada, defendemos os nossos direitos”, diz Stefan Nilsson, diretor da Nespresso para a América Latina. Por enquanto, a distância que separa a Nestlé dos concorrentes em participação de mercado é abissal.
Em uma década ela vendeu 20 bilhões de cápsulas, ante 25 milhões de unidades comercializadas pela Ethical Coffee em três meses. Com o suporte da rede francesa de supermercados Casino, sócia do Pão de Açúcar no Brasil, e um discurso ecológico (suas cápsulas são biodegradáveis), Gaillard espera crescer de forma exponencial.
US$ 17 bilhões é o valor anual do mercado de cápsulas de café
A história do empresário com a Nestlé começou por volta de 1970. Especialista em gestão de negócios, ele trabalhava no instituto de pesquisas Batelle quando desenvolveu as primeiras cápsulas com grãos de café.
O produto chamou a atenção da direção da Nestlé, que comprou os direitos e registrou a primeira patente em 1976. A comercialização, porém, só começou dez anos depois, quando Gaillard foi contratado para liderar a divisão Nespresso. “Se dependesse da Nestlé, a história teria sido encerrada em 1988.
Disse que a forma como o negócio estava sendo conduzido estava errada. Se me dessem autonomia, em dois anos, a Nespresso estaria dando lucro.” Ele cumpriu o que prometeu. Tirou a divisão do vermelho ao posicionar as máquinas como um produto de luxo. Em 1997, no entanto, Gaillard deixou a companhia. “A Nestlé é uma ótima empresa, mas eu precisava de mais desafios.”
Depois de uma década trabalhando em outras empresas do setor de alimentos, como a Häagen-Dazs, Gaillard decidiu trilhar carreira solo. Em 2007, investiu cerca de US$ 2,5 milhões para realizar pesquisas e chegar ao modelo atual da Ethical Coffee. “Usei minhas economias para investir em um produto com forte apelo ambiental.
O mundo mudou, hoje eu não faria nada que não fosse sustentável”, diz ele, alfinetando a concorrente Nespresso cujas cápsulas são produzidas em plástico – um derivado do petróleo. E Gaillard não está sozinho nessa briga com a Nestlé. Em abril, a americana Sara Lee ingressou no nicho de cápsulas de café com a marca L’Or. “Já vendemos cerca de 30 milhões de cápsulas”, conta Ernesto Duran, porta-voz da subsidiária holandesa da Sara Lee.
Assim como Gaillard, Duran “jura de pés juntos” que não se trata de cópia da arquirrival. Na tentativa de blindar seu produto, a Nestlé registrou 1,7 mil patentes relacionadas ao sistema Nes-presso. Isso inclui cada peça de sua máquina. Agora, caberá à Justiça dizer quem tem razão.