DINHEIRO ? Existe uma fórmula mágica para convencer o cliente a anunciar num momento de retração do mercado?
SÉRGIO AMADO ?
O que há é um movimento inédito na indústria da propaganda que, pela primeira vez na sua história, está unida em torno de um mesmo objetivo: mostrar ao anunciante que ele precisa voltar à mídia se não quiser perder o marketing share conquistado ao longo de anos de trabalho.

DINHEIRO ? Como será a segunda etapa desse projeto?
AMADO ?
Vamos fazer uma grande campanha de valorização promocional das marcas: ?Escolha a marca do seu coração?. Será uma eleição nacional. É uma campanha que vai dar prêmios. Estamos negociando a possibilidade de entregar de 1 mil a 2 mil poupanças de R$ 1 mil. A expectativa é de um retorno de 30 milhões de cupons, que será um recorde no País. Serão selecionadas marcas por segmento, de carro a alimentos. Todos os setores relevantes serão colocados em pauta. O que é mais importante: vamos ter condições de traçar um perfil segmentado e regionalizado da performance das marcas no Brasil. Isso é um instrumento de trabalho. O anunciante tem de ficar atento agora até o final do ano, tem de colocar suas marcas no ar, porque ninguém vai querer que marcas líderes sejam superadas por outras. Isso pode acontecer porque existe muita gente do primeiro time que está fora da mídia há muito tempo.

DINHEIRO ? Qual é a sua expectativa em relação ao resultado dessa iniciativa?
AMADO ?
Queremos restabelecer a discussão sobre a necessidade de investimentos. Estamos perseguindo a manutenção do crescimento da indústria este ano. Temos crescido dois dígitos nos últimos cinco anos. Crescemos 12% no ano passado em relação a 1999. Este ano, em razão da crise da Argentina, do racionamento de energia, da desaceleração da economia americana, tivemos uma perda de 6% nas receitas publicitárias no primeiro semestre. Acredito que vamos conseguir fechar este ano com um crescimento de 1% a 3%. Se empatar já é gol. Se crescer 1% é pra comemorar. Nosso projeto é mostrar com otimismo, com seriedade, que podemos crescer um dígito este ano, o que é extremamente significativo.

DINHEIRO ? Para crescer um dígito este ano será preciso reverter o primeiro semestre e ainda alavancar um pouco mais. O sr. não está otimista demais?
AMADO ?
Estou e tenho motivos para isso. Começamos a perceber sintomas de aquecimento em agosto. Tevês, revistas, jornais, outdoors e rádios já registram aquecimento. Tenho falado com as principais agências do mercado e com os principais veículos da mídia e todos têm sentido uma mudança de percepção. Saímos da passividade para a produtividade.

DINHEIRO ? A verba que não foi gasta em propaganda está represada ou já foi realocada em outras áreas?
AMADO ?
Essa verba está represada por dois motivos: primeiro porque as empresas que estão com problemas de realização de números no mercado mundial estão cortando custos e esses ajustes repercutem nas corporações no mundo inteiro. Mas chega um ponto em que você não pode cortar mais. E há o outro lado da moeda, pois as empresas têm de cumprir os seus números regionais. Para atingir as metas, têm de cumprir um programa de investimento de mídia. Estamos percebendo que nos mercados emergentes, como Brasil, México, Índia, China e parte da Ásia há uma grande pressão das múltis para que a gente entregue um pouco mais de resultados, para compensar as perdas dos mercados em crise nos EUA e na Europa. Esse é o novo jogo.

 

DINHEIRO ? O meio publicitário sempre
foi pouco unido. Como é que vocês
estão conseguindo aglutinar todas as facções desse mercado em torno
de um mesmo objetivo?
AMADO ?
Só aceitei ser presidente da Abap depois que tive o apoio das 30 principais agências brasileiras para transformá-la em uma entidade política, representativa de 75% dos R$ 15 bilhões de faturamento anual do setor. A Abap hoje já é uma entidade inserida no processo da economia nacional. Somos uma força e temos que ser ouvidos.

DINHEIRO ? Quais são os principais objetivos da Abap?
AMADO ?
O primeiro é o fortalecimento político da entidade. Estabelecemos uma linha direta inédita com Brasília. Abrimos um canal com o governo para discutir, por exemplo, a possibilidade que havia de edição uma Medida Provisória para taxar os comerciais de 15 e 30 segundos.
A medida estava sendo gestada por um lobby da indústria cinematográfica, que queria que pagássemos até R$ 1 mil por comercial para financiar a produção nacional de cinema. O nosso negócio é propaganda e não temos que financiar nada. Acreditamos que o governo não vai levar essa Medida Provisória adiante. Além disso, criamos uma comissão para discutir a alteração da lei
de licitações. É um absurdo você escolher uma agência como
quem compra cimento. Vamos trabalhar politicamente no
Congresso e no Senado para defender as mudanças na lei.
Estamos mais fortalecidos, até porque temos hoje uma auto-regulamentação do setor através das normas do Comitê
Executivo de Normas Padrão, o Cenp.

DINHEIRO ? O setor da propaganda está respeitando
as regras do Cenp?
AMADO ?
O Cenp é a maior conquista do mercado publicitário nos últimos 20 anos. Estávamos sofrendo uma pressão extraordinária dos anunciantes na negociação das remunerações e isso fez com que a nossa rentabilidade tivesse uma queda de mais de 50% nos últimos anos. Fomos responsáveis por essa política de negociação porque cedemos onde não deveríamos ceder de forma exagerada, através de um processo competitivo equivocado, e só olhamos para o nosso umbigo e não para dentro do nosso negócio. O Cenp estabeleceu regras para que possamos negociar melhores posições com nossos anunciantes. Devemos isso ao Petrônio Corrêa, presidente do Cenp, que com a sua força, conhecimento e sabedoria, tem conduzido esse processo com eficiência.

DINHEIRO ? O que levou a essa crise que assola o mercado publicitário internacional?
AMADO ?
Quando o gigante se move, sacode muita pedra. Foi o que ocorreu com a economia americana. Isso desestabilizou os grupos que não estão fortalecidos. Com a WPP, dona da Ogilvy, que fatura US$ 15 bilhões, não aconteceu nada.

DINHEIRO ? Como ocorreu a virada na Ogilvy?
AMADO ?
Quando assumi, a companhia era muito grande,
pesada, sem foco em novos negócios. Contei muito com apoio
da Shelly Lazarus, presidente mundial da Ogilvy, que me deu
carta branca para promover as mudanças necessárias. Tínhamos 75% dos negócios com clientes multinacionais e 25% com
empresas nacionais. Hoje, é o contrário. Não tínhamos nenhuma conta de governo e hoje temos uma participação de 5% a 8%
do nosso faturamento no governo federal. Outra mudança importante foi a estratégia de crescer através de aquisições.
Em 1997, só havia uma agência chamada Standard & Ogilvy. Hoje nós temos a Ogilvy, a Ogilvy One, a Ogilvy Health Care, a Ogilvy Interactive, a DataSource e a Denisson Brasil, que acabou de ser fundida com a usina. São sete novas companhias. Estamos negociando a compra de mais três empresas nas áreas de publicidade, promoção e marketing direto ainda este ano. Nós também renovamos a nossa força-tarefa em quase 100%. Atualmente, boa parte dos 450 funcionários do grupo no
Brasil tem 27, 28 anos.

DINHEIRO ? O sr. não tem medo de se tornar um gigante, pesado e com dificuldades de se mover após tantas aquisições?
AMADO ?
Não, porque o nosso modelo funciona com unidades independentes, que tem vida própria. Ao contrário, temos mais agilidade e flexibilidade. Então, o gigantismo é dosado pela independência das empresas. Sou um líder absolutamente descentralizador. Tenho um compromisso anual com cada um
dos negócios, e esse compromisso é ajustado a cada dois meses. Esse é um modelo que fascina as pessoas, pois dá a possibilidade
de tocar e expandir o negócio e ainda com o guarda-chuva da
marca Ogilvy. As pessoas têm que gostar de trabalhar aqui.
Fizemos uma grande festa, por exemplo, quando ganhamos o
Extra, uma conta emblemática para a nossa empresa, com uma verba de R$ 50 milhões. É uma conta de um grupo poderoso, brasileiro. Criamos uma agência dentro da agência só para
atender essa conta, a Ogilvy Extra.

DINHEIRO ? Ainda existe muito glamour em torno do negócio da propaganda no Brasil?
AMADO ?
Sim, e por causa disso, às vezes, não gosto de ser publicitário. Essa exposição demasiada, essa premiação exagerada cria um cenário fictício e fantasioso sobre o nosso negócio, que é igual a outro qualquer. Trabalho 14 horas por dia e janto em casa com minha família todas as noites. Reunião para mim não tem que levar mais de 20 minutos. A Ogilvy Brasil é a única agência em que a sala do presidente fica na entrada, logo na recepção, com a porta sempre aberta. Eu vejo quem entra e quem sai. Às vezes tem um cliente importante que chega e fica parado na recepção. Vou até lá, pergunto com quem ele vai falar e o levo até o local onde está sendo aguardado. Qual é o glamour nisso? Estou apenas fazendo a minha parte como executivo de uma empresa.