DINHEIRO – Um analista afirmou que o HSBC taxia, mas não decola no Brasil. É verdade?
CONRADO ENGEL –
(Risos). Temos que olhar o banco no Brasil sob um contexto global. O HSBC é um dos maiores bancos do mundo e é o mais global dos bancos internacionais. Essa é a nossa vantagem competitiva. Vamos nessa direção, conectando o Brasil em nossa estrutura internacional, oferecendo algo diferente aos nossos clientes. Se quiserem fazer negócios com a China, o Oriente Médio, o Casaquistão – o presidente Lula acaba de voltar de lá -, podem contar conosco. Conhecemos esses mercados localmente, conhecemos as empresas e temos estrutura de distribuição lá.

DINHEIRO – Depois do boom de 2007 e da crise de 2008, como está a Ásia em 2009?
ENGEL –
A China continua crescendo muito mais voltada para o mercado interno. O programa de incentivo do governo, de US$ 600 bilhões, está funcionando, principalmente em infraestrutura e incremento do consumo interno. Vai crescer 8% este ano. A Índia está indo na mesma direção, tem um mercado interno forte e deve crescer 5%. Os países mais dependentes de exportação são os que sofrem mais. Em Taiwan, o PIB deve cair mais de 6% e o desemprego continua crescendo. Em Cingapura, o comércio é o principal fator do PIB, que deve cair mais de 10%. O Japão e a Coreia também sofrem.

DINHEIRO – Qual é o peso da Ásia no HSBC?
ENGEL
– Como a participação de mercado do HSBC é muito grande, principalmente em Hong Kong, e a marca é forte, a Ásia continua sendo a principal fonte de receitas do grupo. Obviamente, a crise tem dois efeitos. O primeiro é a compressão de margens, especialmente nos depósitos de varejo. Em alguns países, como Índia e Indonésia, houve um pequeno aumento da inadimplência. Mesmo assim, os resultados até maio ainda estão acima de nossas previsões.

DINHEIRO – Qual é a estratégia do banco no mundo?
ENGEL
– Ter uma participação maior nos mercados emergentes. A meta é ter 60% das receitas nos emergentes e 40% nos desenvolvidos. Historicamente, cada grupo respondia por 50%. Nascemos na Ásia e nossa vocação está nos emergentes.

DINHEIRO – A crise pode resultar em mais protecionismo nos países. Como isso vai afetar as atividades do banco?
ENGEL
– O protecionismo é um risco dessa crise. Os governos estão preocupados com isso e estão discutindo bem a questão nos fóruns internacionais, como a reunião do G-20, em Londres, e a recente reunião dos Brics. Ficou claro nessa crise que é importante ter mercados internos fortes, mas também a interconectividade global é irreversível. A China não produz tudo o que precisa e, quando cresce, compra suprimentos fora. O mesmo acontece com a Índia, que vai investir fortemente em infra-estrutura. Isso vai abrir um bom caminho para empresas de construção, de máquinas e até de commodities. O mundo está interligado e não é possível ser autossuficiente.

DINHEIRO – O que mudou?
ENGEL
– Antes os grandes mercados de consumo ficavam nos Estados Unidos e na Europa e as demais regiões produziam para eles. Agora, os consumidores estão mais distribuídos, há grandes mercados internos no Leste e em grandes países populosos, como o Brasil. É onde o HSBC está – em alguns lugares, como Ásia e Oriente Médio, há mais de 100 anos. Na China continental, estamos há 140 anos. Crescemos mais nos últimos dez anos com a compra de 20% do Bank of. Communications. Temos 17% de participação na maior seguradora chinesa, a Ping An, e uma rede de agências focadas no mercado de alta renda. Somos o maior banco internacional na China.

DINHEIRO – De que maneira isso vai ajudar sua estratégia no Brasil? Um executivo do Carrefour na China afirmou que os empresários brasileiros ainda não descobriram o país.
ENGEL –
Essa é a nossa vantagem competitiva. Temos quase cinco mil funcionários diretos na China. Estamos nos mercados de varejo, atacado, de pequena e média empresa. Nossa capacidade de aproximar as partes é muito grande. Muitas pessoas na Ásia já trabalharam na América Latina e conhecem o ambiente. O Sandy Flockhart, presidente da Ásia- Pacífico, ocupou esse cargo na América Latina. As principais empresas brasileiras já são nossas clientes, queremos aproximá-las dos nossos clientes asiáticos.

DINHEIRO – O pior da crise internacional já passou?
ENGEL
– Sim, mas a recuperação global vai ser mais lenta. O Brasil tem uma posição relativamente boa, os juros estão em queda. Crescimento ligeiramente negativo ou zero em 2009 é uma coisa boa nesse ambiente. Em 2010, o Brasil vai crescer 4%. O que vamos ver agora? Solavancos, sobe-e-desce da bolsa durante muito tempo.

DINHEIRO – O HSBC vai acelerar o crédito no Brasil?
ENGEL
– Nossos empréstimos para pessoa jurídica cresceram quase 30% no primeiro trimestre deste ano, comparados ao mesmo período do ano passado. Continuamos ativos. O que vimos foi uma redução muito forte no final do ano passado, pois as empresas ficaram um pouco mais receosas. Agora, a situação está praticamente normal.

DINHEIRO – Seu antecessor, Shaun Wallis, diz que o HSBC tem uma cozinha só, mas vários restaurantes. O que tem no cardápio brasileiro?
ENGEL
– O cardápio brasileiro são os pratos internacionais. O desafio é colocar o Brasil no radar da Ásia e do Oriente Médio, fazer que as empresas pensem no Brasil quando pensarem em fazer negócios, que os investidores pensem também em ações brasileiras ao investir. Há um espaço grande para crescer. A América Latina está no radar, vamos focar nessa conectividade. Temos um serviço chamado International Banking Center para ajudar as empresas a abrir conta e fazer negócios na China. Na pessoa física, qualquer cliente Premier é atendido como no Brasil. Empresários brasileiros que mudam para a China ou a Índia chegam já com a conta aberta e até mesmo crédito imobiliário encaminhado. As transferências de dinheiro entre os países são muito fáceis. Estamos em 80 países e temos uma série de serviços que auxiliam as pessoas que se movimentam pelo mundo.

DINHEIRO – O ministro Guido Mantega insiste que os bancos podem reduzir suas margens nas operações de crédito e, com isso, o spread.
ENGEL –
Um estudo da Febraban mostra que a taxa média de juros é de 22% ou 23%. É um negócio bastante razoável. O Banco Central fala em 28%. Tem um componente de situações para reduzir a taxa no Brasil. A inadimplência é uma parte importante do spread. Os bancos fazem uma previsão de perda futura.

DINHEIRO – E não dá para apertar margem de lucro?
ENGEL –
A rentabilidade dos bancos brasileiros está na média internacional. A taxa vai cair em função de algumas coisas, como o bureau positivo de crédito. As taxas já são menores para clientes que financiam um automóvel do que para os que emprestam no cartão de crédito. No consignado, as taxas são muito baixas. Já fazemos diferenciação de taxas em diversos países em que há informação. O preço é menor quando o risco é menor.

DINHEIRO – Shaun Wallis passou somente um ano no Brasil. O que ele conseguiu fazer nesse período?
ENGEL
– O mercado mudou muito rapidamente com a crise. Sean ficou um bom tempo focado no gerenciamento do banco nessa transição. Isso ele fez muito bem, foi uma grande contribuição. Outra mensagem forte que deixou foi como colocar o cliente em primeiro lugar.

DINHEIRO – Quais serão as novidades na sua gestão?
ENGEL
– Vamos investir forte no segmento de alta renda, o Premier, voltado para as classes A e B. Estamos abrindo 30 novas agências exclusivas e vamos terminar o ano com mais de 100. Em 2007, eram 32. Há uma migração de renda importante entre as classes de renda no Brasil e isso vai continuar acontecendo. Essa agência tem uma cara global, o nível de treinamento das pessoas é semelhante, há um suporte para acessar sua conta em qualquer lugar do mundo.

DINHEIRO – Como vê a concorrência entre os bancos no Brasil?
ENGEL –
Houve uma consolidação muito grande nos últimos dois anos. Vejo imensas oportunidades. Competimos com nosso tamanho global, não apenas local. Podemos trazer investidores de qualquer lugar do mundo para uma empresa que abre capital. Temos 6% a 7% de participação no mercado local, é um bom tamanho para competirmos.

DINHEIRO – O Citigroup é uma carta fora do baralho global?
ENGEL
– Não. O Citi é um grande brand (marca), tem uma presença global muito importante.

DINHEIRO – O que mudou na sua visão pessoal do Brasil após 2,5 anos na Ásia?
ENGEL
– A percepção do Brasil lá fora é muito boa, a importância que as pessoas dão ao nosso país é muito grande. Sinto orgulho de ser brasileiro.