Aos 36 anos, Marcos Scaldelai acaba de assumir o comando de uma indústria que fatura R$ 1,5 bilhão por ano e tem o nome associado a itens de limpeza – a lã de aço é o seu produto mais famoso. A missão desse jovem executivo, que foi diretor de marketing, comercial e de P&D na Bombril, não é fácil. A começar pela situação financeira da companhia, que ainda se recupera de uma quase falência em 2006. ?Se tudo der certo, quitaremos toda a dívida em 2017?, afirma Scaldelai, que está implementando ações de rejuvenescimento da marca. Com o objetivo de se aproximar das mulheres da nova classe média, a empresa entrou no segmento de cosméticos. ?Queremos ser a Natura do varejo?, afirma o executivo, que recebeu a DINHEIRO na sede da empresa, em São Bernardo do Campo. Na entrevista, Scaldelai revela os planos da Bombril e faz uma avaliação positiva da economia brasileira. Ruim mesmo, diz ele, é a logística do País, que pressiona os custos de transporte.

DINHEIRO – Com qual missão o sr. assumiu a presidência da Bombril?
MARCOS SCALDELAI –
Ciente do potencial que tem essa marca, o primeiro passo era crescer de forma acelerada. E nós fizemos isso, trabalhando aos sábados e domingos. Obter esse crescimento era importantíssimo para mostrar ao mercado o tamanho da Bombril. Estamos com crescimento acumulado de 21% até setembro, o dobro do setor, e vamos fechar o ano com um faturamento de R$ 1,5 bilhão. Mas não foi fácil. Em 2006, como a empresa estava quebrada, enxugamos investimentos em processo e máquinas, e agora, para crescer, a minha missão é melhorar a produtividade.

DINHEIRO – O que explica o setor de produtos de limpeza crescer 11% neste ano?
SCALDELAI –
É a migração da população para a nova classe média, que passou a ter mais condições de experimentar novos produtos de limpeza. No Norte e Nordeste, que são os maiores consumidores de esponja de aço, as pessoas não tinham panelas. Agora, uma casa com um jogo completo de panela tem de lavar mais louça. Amaciante de roupas já não é mais considerado um item de luxo numa casa, é uma commodity.

DINHEIRO – Como é a concorrência com as multinacionais?
SCALDELAI –
Traçamos um plano para desenvolver a Bombril numa condição em que os varejistas percebessem a empresa como estratégica. Num setor com multinacionais que dominam várias categorias, os varejistas acabam vendo a companhia nacional como oportunidade. A Bombril é a grande opção frente às multinacionais. Ter a Bombril na gôndola obriga as multinacionais a serem mais flexíveis nas negociações, o que é bom para os varejistas.

DINHEIRO – Como entraram os cosméticos na história da Bombril?
SCALDELAI –
Temos um grande desafio que é rejuvenescer a empresa. Se você conversar com qualquer pessoa com mais de 40 anos, ela vai recomendar a nossa empresa porque viveu a nossa história. Mas o público mais jovem não tem essa ligação tão emocional. Essa consumidora não conhece as mil e uma utilidades. A forma de rejuvenescimento foi entender a mulher da classe média brasileira, que é quem movimenta o PIB. Fomos conversar com essas consumidoras e levantamos a bandeira de valorização da mulher. Olhamos as categorias que as mulheres jovens valorizam e daí criamos a Bril Cosméticos, que é o nosso braço para os produtos cosméticos. Os próximos passos são o segmento de pet, porque já faz parte da família brasileira, e o automotivo, pois a mulher valoriza muito um carro bem cuidado, que é um objeto valioso da família. Quando a Bombril abraçar esses quatro segmentos, em 2015, ela vai valorizar 100% a mulher.

DINHEIRO – Nos cosméticos, há uma associação dos produtos com a marca Bombril?
SCALDELAI –
Não. Essa área faz parte do mesmo grupo, mas é da Bril cosméticos. Tem uma equipe própria e uma linguagem diferente. E não é o momento ainda de fazer essa unificação, pois haveria um ruído para o público jovem. Mas, hoje, estamos mais amadurecidos nisso. Em 2011, afastamos nosso garoto-propaganda Moreno, colocamos mulheres com humor, Marisa Orth, Dani Calabresa e a Mônica Iozzi, e o mais importante agora, em cosméticos, é construir cada uma das marcas.

DINHEIRO – Esse mercado de cosméticos é mais atraente do que o de limpeza?
SCALDELAI –
Sim, é o dobro do tamanho. Enquanto o segmento de limpeza representa R$ 14 bilhões, cosméticos são quase R$ 28 bilhões. A Bombril vai entrar no valor agregado, não vamos brigar com Unilever e Proctor&Gamble, que estão no mercado de massa. Compramos a marca Ecology, que tem xampu por R$ 18 em perfumaria e farmácia.

DINHEIRO – Qual é a ambição nessa área?
SCALDELAI –
A Bombril quer ser a Natura do varejo, na parte de cosméticos.

DINHEIRO – Haverá mais fábricas?
SCALDELAI –
Sim. Temos uma fábrica em São Bernardo do Campo, que é responsável por 70% da nossa produção, uma planta no Recife, que faz 20%, e uma em Minas Gerais, com 10% da produção. Nosso desafio é aumentar nossa participação no Norte e Nordeste, mas para isso temos de ampliar nossa capacidade, com parceiros e uma nova planta. Queremos até o final do ano que vem iniciar o processo de construção da nova unidade. Existe um gargalo no Norte e Nordeste que é a logística. Por isso nosso objetivo é ter uma planta no Norte.

DINHEIRO – A Bombril exporta?
SCALDELAI –
Apenas 5% da produção. Por outro lado, importamos muita matéria-prima, como insumos para fazer detergentes.

DINHEIRO – Então o câmbio é uma variável importante?
SCALDELAI –
Claro, importantíssima. Nós torcemos pela valorização da moeda. Não tem jeito, o setor inteiro sofre. Este ano, diante da alta do dólar, tivemos de repassar alguns custos para os preços.

DINHEIRO – Quando o dólar bateu em R$ 2,45, em agosto, houve preocupação?
SCALDELAI –
Sim, não tinha o que fazer.

DINHEIRO – Por que não faz uma operação financeira para se proteger?
SCALDELAI –
A Bombril não faz, ainda. Mas já estamos estudando essa possibilidade de hedge.

DINHEIRO – Qual é a sua previsão para a economia brasileira em 2014?
SCALDELAI –
Sou brasileiro, otimista sempre. A Bombril está numa situação muito diferente do que o mercado está pintando. Como nós representamos 10% do setor, nosso espaço é muito grande para avançar. Nossa meta para o ano que vem é crescer dois dígitos. No ano passado, nós crescemos 16% e o mercado, 3,5%. Este ano estamos com 21%, e o mercado, 11%. Esperamos para o ano que vem, no mínimo, 12%.

DINHEIRO – De forma lucrativa?
SCALDELAI –
Sim. O primeiro momento da Bombril foi em 2006, quando a empresa voltou para as mãos do empresário Ronaldo Sampaio Ferreira. Naquele momento, todos os recursos ficaram limitados. Os clientes nos ajudaram e pagaram à vista. E isso levantou a empresa. O segundo momento era de mostrar para o mercado que a empresa tem condição de ser muito maior do que é. Agora, chegou um outro momento que requer uma preparação interna para continuar crescendo e melhorar em 20% o resultado de Ebitda. Mas a empresa tem um passivo de quase R$ 20 bilhões que pagamos por ano, por causa de dívidas do passado. Então o dinheiro que captamos no mercado é para isso. Se tudo der certo, quitaremos essa dívida em 2017.

DINHEIRO – Qual é a sua visão sobre a inflação no Brasil?
SCALDELAI –
Não podemos dizer que estamos sossegados, mas se você conversasse comigo há quatro meses a preocupação era enorme. Estávamos bastante receosos na hora de montar as estratégias para 2014, mas agora conseguimos uma estabilidade e os planos estão otimistas.

DINHEIRO – A falta de mão de obra é um problema para vocês?
SCALDELAI –
É um grande problema. Em regiões como Recife, o problema é mais agudo. Hoje é muito difícil ter um profissional que queira ser registrado e fazer um plano de carreira. Hoje, ao planejar uma nova fábrica, o calcanhar de aquiles é como conseguir pessoas. É o caso da região Norte. Nós vamos conversar na região para entender se isso pode complicar nossa instalação. Hoje temos departamentos na planta do Recife que, ao longo do ano inteiro, não conseguem preencher vagas operacionais.

DINHEIRO – A carga tributaria é um peso para a Bombril?
SCALDELAI –
Sim, para o setor inteiro. Um peso de 40% para uma categoria que é commodity é muito complicado.

DINHEIRO – E a logística?
SCALDELAI –
Também, porque nós transportamos ?água? por estradas e cabotagem. Transportamos, por exemplo, detergente para louça, que é mais barato do que uma garrafinha de água. Como operacionalizar um transporte desse com rentabilidade? É difícil transportar detergente com esse custo de logística É por isso que a produção local, perto dos mercados, é necessária.

DINHEIRO – O sr. imagina que um dia poderá usar ferrovias?
SCALDELAI –
Para mim isso é algo muito distante. A nossa realidade está muito mais em resolver os problemas de transporte na localidade, montando uma planta, do que depender das concessões.

DINHEIRO – A Bombril acredita no Brasil?
SCALDELAI –
Muito. Além de ser nacional, a Bombril criou um vínculo no coração dessa consumidora que nenhuma marca tem. As oportunidades são grandes porque 40% do mercado de limpeza ainda é informal.