A entrada do general Luiz Eduardo Ramos Pereira no comando da Secretaria de Governo pode significar uma mudança de rumo na comunicação da gestão de Jair Bolsonaro. Seu antecessor, Carlos Alberto dos Santos Cruz, caiu, entre outros motivos, por ser contrário à liberação de verbas para publicidade das ações do governo e de um maior contato do presidente com a imprensa. O desafio do general Ramos é justamente não cometer os mesmos “erros”.

O general sinaliza que não tem as mesmas resistências de Santos Cruz. Ainda cauteloso, afirmou ao Estado considerar o relacionamento da imprensa com o presidente “fundamental”. “Vamos defender o estado democrático e os valores. Eu sou muito do meio”, disse. “Se chover muito é ruim, mas se não chover, seca. A natureza é assim. Eu tento seguir a natureza”, afirmou, em relação às verbas publicitárias.

As mudanças na comunicação não devem se resumir à troca do ministro. O Estado apurou que o general terá a missão de resolver um impasse na estrutura da área. Atualmente, o relacionamento com a imprensa é feito tanto pela Secretaria de Comunicação (Secom), comandada por Fábio Wajngarten, quanto pelo porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros. Este último responsável por repassar diariamente aos jornalistas as opiniões do presidente. Ambos serão chefiados por Ramos.

A relação entre Rêgo Barros e Wajngarten não é “harmoniosa”. O porta-voz, que integra a ala militar do governo, é afinado com o agora ex-ministro Santos Cruz. Ele assumiu várias funções que seriam do chefe da Secom devido a um vácuo que existia antes da chegada de Wajngarten, a ponto de organizar cafés da manhã de jornalistas com o presidente, o que está longe de ser uma função clássica de um porta-voz. Desde que chegou, a equipe de Wajngarten tenta retomar esse papel.

Para evitar a sobreposição de funções, o governo estuda uma nova estrutura que transfere a comunicação para a Secretaria-Geral da Presidência, hoje comandada pelo general Floriano Peixoto, também militar.

O estilo de Santos Cruz fez com que Bolsonaro ficasse “enclausurado” no Palácio do Planalto, o que afetou sua popularidade, no entendimento de Wajngarten. No comando da Secom, mesmo contrariando seu então chefe, Santos Cruz, o secretário promoveu a participação do presidente em programas populares no SBT e a entrevista para a revista Veja, a primeira desde que assumiu o mandato.

Também foi Wajngarten quem aconselhou o presidente a voltar a ser o Bolsonaro “intuitivo” para reconquistar popularidade. Os conselhos levaram o presidente a dar “escapadas” recentes, como quando caminhou a pé do Palácio da Alvorada até o Congresso e a pilotar uma moto no Guarujá, no litoral de São Paulo, no feriado de Páscoa.

Ideologia

A briga na comunicação reflete uma disputa que atinge outras áreas do governo. De um lado estão os ideólogos, liderados pelo vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), filho do presidente, e o escritor Olavo de Carvalho. Os dois atacaram fortemente Santos Cruz, da ala militar, por “esconder” o presidente. Embora Wajngarten negue ser ligado à ala ideológica, eles concordam neste ponto.

Já Rêgo Barros, antes de assumir o posto foi assessor do ex-comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, um dos poucos militares no Palácio do Planalto a rebater publicamente os ataques de Olavo. Na ocasião, referiu-se ao guru do bolsonarismo como “Trotski de direita”.

O presidente já disse em mais de uma oportunidade que deve a Carlos, o filho “02”, a vencedora estratégia de comunicação que o levou à Presidência.

‘Não serei um general da ativa no governo’

“Soldado não escolhe missão; ele cumpre”, assim reagiu o general Luiz Eduardo Ramos Baptista Pereira à sua nomeação para ser o ministro-chefe da Secretaria de Governo. Ele reuniu os subordinados ontem no Comando Militar do Sudeste (CMSE) e começou a se despedir. Aos generais reafirmou por escrito seu “comprometimento com o Exército Brasileiro e com o Brasil, cumprindo sempre todas as ordens que lhe forem determinadas”. Amigo do presidente Jair Bolsonaro, Ramos vai se licenciar do Exército. Leia a entrevista:

General, o senhor é o segundo general da ativa nomeado por Bolsonaro e o primeiro do Alto Comando. Como fica a relação do senhor com o Exército?

Está havendo muita confusão. Não serei um general da ativa no governo. Estarei licenciado, não usarei farda e não participarei de nenhum processo decisório no Alto-Comando do Exército. Na próxima semana, vou a Brasília e me apresentarei ao comandante, general (Edson) Pujol, de quem receberei a missão. Prestarei continência ao comandante. Essa é a liturgia. Na terça-feira (18), estarei em trajes civis começando as reuniões.

O senhor já conversou com o presidente sobre a Secretaria de Comunicação e sobre as relações com o Congresso? Como o senhor vai atuar nessas áreas?

Não, ainda não. Vou encontrá-lo hoje (ontem, 14) no Aeroporto (Bolsonaro assistiria ao jogo Brasil e Bolívia, a abertura da Copa América, no Morumbi). Acabei de ser nomeado. Vou conhecer primeiro a estrutura da Secretaria de Governo antes de emitir qualquer juízo de valor sobre qualquer questão.

Como foi para o senhor substituir o general Santos Cruz?

Conversei com o Santos Cruz. Somos amigos. Ele entendeu que recebi uma missão e vou cumpri-la. Sou um soldado. E soldado não escolhe a missão. Estava apaixonado pelo comando em São Paulo, mas acredito que minha ida a Brasília é mais importante, agora, para o governo e para o Brasil. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.