A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, indicou nesta terça-feira, 23, um novo procurador para atuar na Operação Zelotes, que investiga esquema de corrupção no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), tribunal que julga recursos de multas aplicadas pela Receita. A decisão ocorre um dia após o jornal O Estado de S. Paulo revelar que procuradores a acusaram de desmontar a força-tarefa que atua na investigação e foi tomada sem consulta ao coordenador da investigação, o que é incomum.

O escolhido por Raquel é o procurador da República do Município de Angra dos Reis Igor Miranda da Silva. No dia 1.º de julho, Miranda acompanhou o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro, em uma audiência com o ministro da Justiça, Sérgio Moro. Apesar disso, o nome dele não consta da agenda do ministro, apenas o do senador.

Quem teve acesso ao teor da conversa no gabinete de Moro afirmou que os dois apresentaram um pedido em comum: o fortalecimento da Polícia Federal em Angra. O encontro com o ministro ocorreu quando o procurador já era o responsável pelo inquérito civil que apura a anulação da multa ambiental de R$ 10 mil aplicada pelo Ibama a Bolsonaro por pesca em unidade de conservação em 2012, quando o presidente era deputado.

Questionado sobre a audiência com Moro e Flávio Bolsonaro, Miranda disse que o encontro “tratou de aumento de efetivo policial na região (de Angra dos Reis)”. Flávio, segundo ele, participou da reunião “como representante do Estado do Rio”. “Não sou amigo do atual ministro da Justiça e do senador mencionados”, afirmou Miranda.

A indicação do novo procurador foi mal recebida por ala de procuradores do Ministério Público do Distrito Federal, que a classificou como “absurda”.

A expectativa entre procuradores era de que Raquel prorrogasse a permanência do procurador Alexandre Ismail na operação. Por determinação dela, ele foi transferido para Roraima, sua unidade de atuação após trabalhar um ano na Zelotes. Raquel alega que atendeu a um pedido da Procuradoria da República de Roraima.

Conforme o jornal mostrou nesta terça, dos quatro procuradores que atuavam na Zelotes apenas Frederico Paiva permaneceu. Ele recebeu autorização para continuar a trabalhar no caso mesmo morando nos Estados Unidos, onde faz mestrado. É a primeira vez que isso ocorre. O trabalho remoto o impede de participar de audiências. Paiva disse a interlocutores que, apesar das dificuldades em acumular as duas tarefas, não pretende deixar as investigações por ser o coordenador do caso.

Paiva também tem se mostrado preocupado com o desmonte da força-tarefa diante da complexidade da operação e defendido a permanência de Ismail no caso. Procurado na terça-feira, ele não ligou de volta. A Zelotes já resultou em 20 denúncias e 113 réus e apurou prejuízo de R$ 50 bilhões em impostos não recolhidos por empresas acusadas de pagar propina para anular débitos na Receita.

Entre os réus está o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele é acusado de tráfico de influência e lavagem de dinheiro nas negociações que levaram à compra de 36 caças Gripen pelo governo brasileiro. A defesa do petista nega envolvimento dele no esquema. Filho mais novo de Lula, Luís Cláudio Lula da Silva também foi denunciado na Zelotes acusado de participar de esquema de venda de medida provisória em troca de patrocínio para um torneio de futebol americano. Os casos foram revelados pelo Estado.

O ministro do Tribunal de Contas da União Augusto Nardes também é investigado na Zelotes. Ele é suspeito de receber propina para beneficiar empresa com dívida no Carf. O ministro sempre negou a acusação.

Greenfield

A Zelotes não é o único gargalo da Procuradoria-Geral da República. Raquel ainda não atendeu a pedido da força-tarefa da Operação Greenfield, que apura crimes envolvendo fundos de pensão, de prorrogar a permanência do procurador Frederico Siqueira nas investigações. Ele é o principal condutor da investigação intitulada Circus Maximus, um dos braços da Greenfield que foca em suposto esquema de corrupção no Banco de Brasília.

A crise na Procuradoria ocorre no momento em que Raquel tenta ser reconduzida ao cargo. O presidente Jair Bolsonaro disse que vai anunciar sua decisão em agosto. O nome da procuradora-geral não consta da lista tríplice da categoria, que tem sido respeitada pelos presidentes da República desde 2002 para a indicação do nome. As forças-tarefa da Zelotes, Lava Jato e Greenfield publicaram nota defendendo a escolha do sucessor de Raquel dentro da lista. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.