As ações da gestora de recursos Reag Investimentos afundaram cerca de 23% por volta das 11h50 desta quinta-feira, 28, refletindo a megaoperação Carbono Oculto da Polícia Federal (PF) deflagrada no início da manhã do mesmo dia. Durante as primeiras horas de pregão, os papéis chegaram a entrar em leilão. Por volta das 12h os papéis engataram um rali e passaram a atenuar a queda, que é de 13% às 12h30.

+Como o PCC usou fintechs e fundos de investimento para lavar dinheiro no setor de combustíveis

operação da PF envolveu 1,4 mil agentes de vários órgãos públicos e cumpriu diversos mandados de busca e apreensão – incluindo um deles na Reag Investimentos, com sede na Alameda Gabriel Monteiro da Silva, no bairro Jardim América, em São Paulo (SP).

A operação mira um esquema bilionário de fraudes e lavagem de dinheiro no setor de combustíveis – contemplando os postos de gasolina vinculados à facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), problema que já era citado há tempos por representantes do setor, que cobravam uma ação mais enérgica do Estado nesse sentido.

Ultrapar, Vibra e Raízen sobem cerca de 5% com a notícia no final da manhã, informa o Brazil Journal.

Esse esquema, segundo as investigações, incluiria a participação de fundos de investimento e fintechs, que usariam suas operações para lavar dinheiro.

Em Fato Relevante arquivado na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a Reag declarou que a busca e apreensão ‘trata-se de procedimento investigativo em curso’.

“As Companhias esclarecem que estão colaborando integralmente com as autoridades competentes, fornecendo as informações e documentos solicitados, e permanecerão à disposição para quaisquer esclarecimentos adicionais que se fizerem necessário.”

Além da sede da Reag, a CiabraSF – controlada pela gestora em questão – também teve sua sede inclusa na lista de mandados de busca e apreensão.

Quem é a Reag Investimentos?

A gestora Reag Investimentos foi fundada há mais de uma década, em meados de 2012, e ganhou notoriedade pelo seu crescimento expansivo e vertiginoso dentro do ambiente de mercado de capitais.

Desde maio de 2021, a gestora tem ações listadas na bolsa de valores, negociadas sob o ticker REAG3.

A gestora de recursos é certificada pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) e controlada pela Reag Capital Holding S/A, que também controla outra holding independente, a Ciabrasf, além de seguradoras e financeiras.

A companhia se apresenta como a maior gestora independente do país – ou seja, a maior que não está atrelada a nenhum banco ou instituição financeira – com uma cifra de R$ 299 bilhões sob gestão.

Na plataforma da própria gestora, são apresentados um total de 625 fundos administrados com R$ 238 bilhões de patrimônio líquido, sendo 579 fundos ativos com R$ 204 bilhões.

A companhia cresceu no mercado, em certa medida, ao avançar com aquisições – incluindo a das gestoras Quasar, Empírica, Hieron, Berkana e outras.

Nesse sentido, a Reag ampliou sua atuação com fundos multimercado, de crédito estruturado, private equity e gestão de fortunas.

Afora isso, a companhia também ganhou holofotes ao se tornar a maior patrocinadora do Belas Artes, um dos cinemas mais tradicionais de São Paulo.

Em janeiro de 2024 a gestora adquiriu os naming rights do cinema, que passou a se chamar então REAG Belas Artes.

Entenda a operação Carbono Oculto

As autoridades cumprem 200 mandados de busca e apreensão em dez Estados, com a participação de 1.400 agentes. O alvo são 350 envolvidos em atividades ligadas à produção e comercialização de combustíveis, parte sob influência do PCC.

Entre os pontos de maior destaque, 42 alvos estão concentrados na Faria Lima, onde funcionam fundos, corretoras e empresas de investimento.

No total, 255 companhias entraram na mira da investigação.

A BK Bank, instituição de pagamentos, teria movimentado R$ 17,7 bilhões de forma suspeita. A Receita Federal calcula que os tributos federais não pagos somam R$ 1,4 bilhão. Já o CIRA/SP pede à Justiça o bloqueio de bens para recuperar mais de R$ 7,6 bilhões em impostos estaduais.

A lista de todas as empresas atingidas pelos mandados não foi divulgada, mas alguns nomes confirmaram envolvimento.

Segundo as apurações, os acusados teriam usado diferentes estratégias ilegais, que vão de adulteração de combustíveis e crimes ambientais até lavagem de dinheiro ligada ao tráfico de drogas. Também aparecem fraudes fiscais, estelionato e esquemas para esconder patrimônio e participação societária.

Parte do setor de etanol, gasolina e diesel teria sido dominada por grupos ligados ao PCC. Investigações apontam ainda que o dinheiro movimentado financiava operadores suspeitos de lavar recursos para Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola.

Decisão judicial determinou a indisponibilidade de quatro usinas de álcool em São Paulo, além de cinco fundos de investimento, cinco redes de postos de gasolina com mais de 300 unidades, 17 distribuidoras, quatro transportadoras, dois terminais portuários, seis refinadoras, duas instituições de pagamento e até uma rede de padarias.

Outro ponto de atenção está no Porto de Paranaguá (PR), usado para a entrada irregular de metanol. O produto não chegava aos destinatários oficiais. Era desviado para abastecer postos e distribuidoras ligadas ao esquema, o que permitia adulterar gasolina e gerar ganhos elevados.

A força-tarefa também investiga a relação dos suspeitos com a compra de usinas sucroalcooleiras no interior de São Paulo. O setor de petróleo e gás representa cerca de 10% do PIB nacional, movimenta R$ 420 bilhões por ano e recolhe mais de R$ 130 bilhões em tributos, segundo o IBP. Com esse peso econômico, o grupo buscava ampliar influência no mercado financeiro da Faria Lima, onde promotores e fiscais vasculham fundos e escritórios em dezenas de endereços.

O núcleo principal dos investigados é ligado a Roberto Augusto Leme da Silva, conhecido como Beto Loco, e a Mohamad Hussein Mourad, antigos sócios do grupo Aster/Copape. Eles teriam se unido ao Grupo Refit (ex-Manguinhos), de Ricardo Magro. A acusação é de que expandiram negócios em toda a cadeia de combustíveis com recursos ilícitos, o que lhes permitiu reforçar poder econômico e político em Brasília.

Como atuavam fintechs e fundos de investimentos

Parte das transações era feita em dinheiro vivo ou por meio de maquininhas nos postos. Esses valores acabavam em contas controladas pela rede criminosa, muitas vezes em fintechs, que, segundo os investigadores, eram escolhidas justamente para dificultar o rastreamento.

Os recursos não paravam por aí. Havia reinvestimento em fundos de investimento, tanto multimercado quanto imobiliários, usados para disfarçar a origem do patrimônio. O órgão já identificou cerca de 40 fundos operados pelo grupo, com ativos estimados em R$ 30 bilhões.

Em paralelo, uma fintech de pagamentos chamou atenção por funcionar como uma espécie de banco do grupo. Entre 2020 e 2024, essa empresa teria movimentado R$ 46 bilhões.

O mais incomum foi a entrada direta de dinheiro em espécie: somente entre 2022 e 2023, ocorreram mais de 10,9 mil depósitos em papel-moeda, somando R$ 61 milhões. Para a Receita, esse tipo de prática não se enquadra no perfil de uma instituição de pagamento.

Além dessa, outras empresas menores do setor também eram usadas para multiplicar barreiras de ocultação. O uso de fintechs, de acordo com os auditores, aproveitava lacunas regulatórias que impediam que órgãos de fiscalização tivessem uma visão clara de quem movimentava os valores.

Uma norma aprovada em 2024 tentou corrigir essa brecha, mas acabou revogada meses depois, em meio a pressões e desinformação.