Leonardo da Vinci merece ser objeto de estudo pelos novos comandantes econômicos brasileiros, Geraldo Alckmin (no Ministério da Indústria e Comércio) e Fernando Haddad (na Fazenda). O ex-governador paulista, quando tirou um período sabático, em 2019, foi dar aulas. O ex-prefeito paulistano, advogado de formação, mestre em Economia e doutor em Filosofia, sempre deu aulas. Pois aos dois professores fica o recado do mestre Da Vinci. O principal deles: arte e ciência andam juntas. Dito de outra forma, a inovação é filha do conhecimento consistente com a criatividade. E o que isso tem a ver com reerguer a desconstruída economia nacional? De certa forma, tudo.

Antes vale lembrar que o mercado, por meio do Relatório Focus divulgado na segunda-feira (26), já prevê piora nos principais indicadores de 2023. O PIB parou de crescer. A projeção de inflação pegou a curva oposta e voltou a subir. Assim como a previsão para a taxa básica de juros. Na visão do mercado, teremos economia avançando insuficientes 0,79% – o famoso pibinho –, IPCA a 5,23% – acima da meta (3,25%) e do teto da meta (4,75%) – e Selic na casa dos 12% (a previsão da semana anterior era de 11,75% e há um mês, de 11,50%). Isso no Focus. No mercado concreto, de negociação de títulos, a inflação implícita medida pela Anbima já navegava na segunda-feira (26) em quase 6,31% e o juro de um ano em 13,50%. Aquela taxa básica de 2,0% que parece tão distante existiu até março do ano passado. E não deve retornar em anos.

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Quem ganha com isso? Poucos, mas poderosos. Basicamente, corporações que passam a ser os credores da dívida pública e os afortunados para quem sobra dinheiro a cada fim de mês, dindim que vai parar lá nos fundos, no Tesouro Direto. Para eles, Selic elevada também é lida como retorno elevado. O grosso da população brasileira não consegue. Somos 8,4% de Miseráveis (pessoas que têm até US$ 1,90 por dia). Se a linha for a da Pobreza (quem tem até US$ 5,50 por dia) já bate em 29,4%. O rendimento médio familiar per capita foi de R$ 1,350 mil no ano passado. Pegue quatro pessoas, chame de família e coloque R$ 5,4 mil na conta. Pague alimentação, moradia, água & energia, transporte, saúde, escola e veja quanto sobra. Dá para comprar Tesouro Direto e viver de renda? Não, né?

Por esse motivo Alckmin e Haddad precisarão reinventar a roda com muito mais talento. E fazer uma combinação à moda Da Vinci. Com muito estudo, muita observação e muita criatividade. Lembrando 65 mil segundos por dia (deixei seis horas de sono para cada um) que sanear o cotidiano do brasileiro do chão resolverá o restante da economia. De certa forma, o que fez Fernando Henrique Cardoso na metade dos anos 1990. Isso significa, pelo lado da Fazenda, zelar estrondosamente – para que o mercado não tenha dúvidas – pelo endividamento sob controle e o gasto responsável. Pelo lado da Indústria & Comércio, afugentando o indefectível lobby das isenções fiscais, das porteiras de mercado que criam fortunas e ferram o consumidor, e buscando soluções para a nova indústria na qual a economia criativa tenha espaço proporcional ao ativo brasileiro nesse campo, e não apenas olhar para a reconstrução da velha indústria.

A Florença em que Leonardo da Vinci foi alimentado era um lugar único no mundo, e poucas vezes outra cidade na história se igualou àquele momento. Riqueza & Elegância. Ciência & Arte. Um centro financeiro e nas artes. O florim, a moeda local, era equivalente ao euro hoje, aceito por onde importava no continente. Igualmente era um lugar criativo e inovador. Tanto nas artes (nasce a perspectiva) quanto no comércio (nascem padrões contábeis que impulsionam as transações comerciais). Lugar em que havia mais artesãos que açougueiros. “Combinação de tecnologia (os arquitetos e engenheiros florentinos), design, química e comércio”, na definição de Walter Isaacson, um dos biógrafos de Da Vinci. Disscepolo dela Sperientia, assinou certa vez Da Vinci. Esse é o recado a Alckmin e Haddad. Será preciso inventar esse Renascimento à Brasileira.