A convocação do presidente Nicolás Maduro de uma Assembleia Constituinte deu uma guinada inesperada no conflito político que sacode há um mês a Venezuela, com uma onda de protestos que resultaram na morte de quase 30 pessoas.

Veja a seguir o que se sabe desta crise:

– A faísca: o Supremo Tribunal

Em 29 de março, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ), próximo ao poder, retirou a foro privilegiado dos deputados do Parlamento, o que os deixou expostos a possíveis penalizações.

Essa decisão representou uma sanção contra o poder legislativo, o único controlado desde o final de 2015 pela oposição antichavista, assim nomeada por causa do presidente falecido Hugo Chávez, que governou o país de 1999 a 2013.

O Supremo Tribunal reforçou os poderes do chefe de Estado, que poderia intervir utilizando todas as medidas necessárias, sob a justificativa de assegurar a “estabilidade democrática”.

No dia seguinte, o STJ decidiu assumir as prerrogativas do Parlamento, permitindo assim ao regime presidencial venezuelano a concentração de todos os poderes: executivo, militar, judiciário e legislativo.

A decisão foi qualificada pela oposição como sendo “golpe de Estado”, e culminou em tamanha indignação diplomática que o tribunal recuou em sua resolução após 48 horas da deliberação.

E nesta segunda-feira a crise sofreu uma nova escalada com a decisão de Maduro de convocar uma Assembleia Constituinte “popular”, com representantes eleitos não por voto universal, mas por setores oficiais (operários, camponeses, indígenas) e comunidades.

Maduro afirma que busca reforçar a Constituição de 1999, impulsionada por seu mentor Hugo Chávez (1999-2013). A oposição assegura se tratar de um “golpe” e uma “fraude constitucional”.

– O objetivo: eleições antecipadas

A oposição se fixou em um objetivo principal: conseguir a saída de Nicolás Maduro do poder antes do final do seu mandato, em dezembro de 2018.

A oposição solicitou eleições gerais antecipadas por não ter conseguido realizar um referendo revogatório como era esperado inicialmente.

De acordo com pesquisas do Venebarometro, sete em cada dez venezuelanos querem a saída do presidente em exercício.

Mas a convocação de Maduro da Constituinte afasta a possibilidade de eleições.

– O custo: mortos e prisioneiros –

Quase todas as manifestações resultaram em confrontos, roubos, chuva de gás lacrimogêneo e coquetéis Molotov, envolvendo os manifestantes e as forças de ordem, que se somam à violência exercida por milícias armadas de civis encapuzados.

Há registros de 28 mortes, de acordo com informações da Procuradoria, que também informa sobre centenas de feridos e detidos por distúrbios e saques.

“Essas ações de resistência em relação ao ditador (Maduro) têm um custo muito elevado: mortos e prisioneiros”, declarou o vice-presidente parlamentar Freddy Guevara, cujo partido Voluntad Popular tem seu líder encarcerado desde 2014, Leopoldo López.

Assegurando que seguirá nas ruas, a oposição anunciou uma “mega” marcha de protesto para esta quarta-feira.

– O futuro: negociações ou eleições –

Maduro convidou a oposição a retomar o diálogo que estava congelado desde dezembro, chamando o papa Francisco para “acompanhar” essa discussão, mesmo após o fracasso da mediação do ano passado, sob auspício da Santa Sé.

As eleições para governadores que deveriam acontecer em 2016, devem ser realizadas este ano e a presidencial no final de 2018. Uma Constituinte levanta questões sobre o calendário eleitoral.

“Querem diálogo? (…) Querem eleições? Poder Constituinte”, clamou Maduro, que afirmou que a Assembleia assumirá o poder político da pátria e fará triunfar a paz.

A Assembleia Constituinte, uma vez instalada, poderá estar acima de todos os poderes do Estado, o que gera inúmeras dúvidas sobre os rumos que o país tomará.