10/05/2024 - 8:03
A crise do clima é um dos principais desafios a serem abordados neste ano pelo G20, o grupo das 19 maiores economias do mundo mais União Europeia e União Africana, no momento presidido pelo Brasil.
A análise é da economista Luciana Servo, presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que coordena o T20 Brasil, grupo de cerca de 80 think tanks encarregados de debater e encaminhar recomendações e propostas a serem abordadas neste ano pelo G20.
A tragédia das enchentes que afetam o Rio Grande do Sul serve como alerta para a urgência em se encontrar soluções para deter o aquecimento global e chegar a um modelo econômico sustentável com inclusão social, uma das prioridades declaradas da presidência rotativa brasileira do fórum multinacional.
“Há emergência em se pensar a questão climática para além da questão de atingir uma meta de carbono, mas também incluindo uma discussão social, empresarial e a necessidade de você criar um diálogo para acelerar esse processo”, afirma Servo à DW. A coordenação do T20 é exercida no momento pelo Ipea junto da Fundação Alexandre de Gusmão e do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri).
Servo esteve em Berlim nesta semana para participar do Global Solutions Summit, uma conferência que reúne anualmente na capital alemã representantes de organizações internacionais e da sociedade civil global para discutir soluções para um multilateralismo sustentável e propostas a serem encaminhadas ao G20, cuja próxima cúpula ocorre em novembro no Rio de Janeiro.
Nesta entrevista, ela fala sobre o desafio de propor soluções para os principais problemas globais, como desigualdade, pobreza e transição energética, considerando a dificuldade em se chegar a consensos dentro de um grêmio tão multifacetado como o G20.
Segundo a especialista, a rota para a solução das questões globais deve passar pelo aperfeiçoamento dos sistemas multinacionais de decisão. “Tornar o sistema multilateral eficiente é fundamental para que as políticas internacionais sejam implementadas”, afirma.
Quais os temas de mais destaque sendo trabalhados nesse momento pelo T20?
Luciana Servo: As prioridades da presidência brasileira do G20 são trabalhadas pelo T20. A desigualdade, pobreza, inclusão social, a discussão sobre transição energética e climática e o que se chama de reforma do sistema multilateral, que é pensar como a gente pode fortalecer esses sistemas – como o sistema ONU e outros sistemas multilaterais –, para que essa polarização que a gente está vendo acontecer no mundo não influencie as políticas públicas que precisam ser implementadas. Ou para que, pelo menos, existam espaços de diálogo eficientes e efetivos, porque senão você faz com que algumas políticas sejam travadas por conta dessa divisão geopolítica.
Tornar o sistema multilateral eficiente é fundamental para que as políticas internacionais sejam implementadas. Para além disso, a gente também tem toda uma discussão sobre transformação digital, que precisa ser inclusiva. A transformação digital precisa incluir a população e produzir trabalhos decentes, produzir oportunidades para a população. Como financiar isso é outra agenda importante, e a discussão de como essas coisas se conectam, em processos de transição, seja demográfica, energética, climática, e digital, de transformações tecnológicas também são importantes na discussão no T20.
Esse evento em Berlim serve como um fórum de discussão de problemas globais. Quais propostas ao G20 podem sair desse encontro e como é esse processo de encaminhamento?
O Global Solutions Summit, como evento promovido pela Global Solutions Initiative, foi criado [em 2017] durante a presidência alemã do G20. A ideia é acompanhar a cada ano as discussões que estão acontecendo no G20 e no T20, para ir ganhando escala.
Eles produzem esse fórum todo ano, convidando não só os think tanks, mas outras instituições, outras lideranças políticas, para ver se o que está sendo discutido na presidência dos países tem ressonância nessas lideranças. É um espaço intermediário de discussão durante a presidência do G20 e com think tanks e lideranças políticas.
Depois a gente tem a chamada Conferência de Meio-Termo, que vai acontecer no Brasil em julho. E aí, sim, a gente vai entregar as recomendações para o governo. E o governo vai decidir quais dessas recomendações ele vai incorporar ou não. Em seguida temos mais seis meses de trabalho. A presidência brasileira vai até 1° de dezembro, final de novembro desse ano. Em 1° de dezembro a próxima presidência do G20 já passa para a África do Sul.
Aliás, com a série Indonésia, Índia, Brasil e África do Sul, o G20 tem quatro presidências seguidas de países em desenvolvimento…
Isso. As pautas importantes e contextualizadas nos países em desenvolvimento estão sendo trazidas para o debate dos think tanks e do G20.
Quais as questões principais durante essas reuniões em Berlim?
Há urgência em se pensar a questão climática para além de uma questão só de atingir uma meta de carbono. Tem que passar por uma discussão social e empresarial, e considerar a necessidade de se criar um diálogo para acelerar esse processo. Esse foi um dos temas mais relevantes, como a gente faz com que todo mundo entenda que a questão climática não é só uma questão de temperatura, mas que ela tem várias urgências sociais e para o mundo empresarial, que precisam ser incorporadas no diálogo entre os setores sociais.
Não é só uma questão de governo, envolve vários setores: empresas, sociedade civil organizada, população daqueles territórios, institutos de pesquisa, cientistas. Mas por ser um mundo muito dividido, seja nacionalmente seja internacionalmente, isso dificulta a implementação de políticas.
A discussão de como a gente faz com que essas pessoas se unam em torno de um objetivo, em face de tanta polarização, é um outro grande desafio que foi discutido. Como criar confiança de que o que você está propondo vai ser implementado, que a população possa confiar.