25/01/2022 - 22:04
Em vigor desde novembro de 2017, a Reforma Trabalhista voltou à tona nos últimos dias depois que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva mencionou a revogação da reforma que ocorreu na Espanha. Ele criticou a nova legislação brasileira e cogitou realizar o mesmo movimento no Brasil, caso eleito neste ano. Ciro Gomes, que também é pré-candidato à presidência, sinalizou que estuda uma nova reforma.
A pauta já gerou diversas polêmicas e divide opiniões. Uma das mudanças impostas pela nova legislação é em relação às negociações salariais. Segundo levantamento do Dieese, quase metade das negociações salariais do setor privado perderam para a inflação em 2021. Esse foi pior resultado em quatro anos, desde que o Dieese começou, em 2018, a avaliar as negociações inseridas na base de dados do Mediador do Ministério do Trabalho.
Especialistas divergem sobre a eficácia da reforma em seu principal ponto: gerar empregos. O objetivo da flexibilização da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), com o modelo de trabalho intermitente, por exemplo, era abrir novos postos de trabalho. Para o sócio trabalhista do Bichara Advogados, Jorge Matsumoto, a reforma atingiu bons resultados no aspecto jurídico e na redução da litigiosidade da Justiça do Trabalho, já que reduziu consideravelmente as disputas jurídicas.
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Já a advogada especialista na área do Direito do Trabalho, Karolen Gualda Beber, afirma que houve frustração do mercado no quesito geração de empregos. “Acredito que não poderia ser diferente, já que a criação de vagas de emprego não advém, somente, da flexibilização das normas trabalhistas. Assim, na criação de vagas de emprego – grande promessa da reforma – esta falhou e obviamente falharia”, completa.
A presidente do Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro (Corecon-RJ), Flávia Vinhaes, explica que a aprovação da reforma já aconteceu em um período em que o Brasil estava entre a recessão e estagnação da economia, além da pandemia. Por isso, é difícil isolar os aspectos da reforma do cenário geral. “Além do principal argumento da reforma, que era gerar empregos, foi destacada a modernização que ela iria promover. Mas, as medidas tiveram desdobramentos sociais catastróficos e essa modernização só dá vantagens econômicas para os empresários”, diz.
Efeitos para empresas
Segundo Matsumoto e Karolen, a reforma produziu efeitos reais para as empresas pois incentivou a responsabilidade por parte dos empregados no ajuizamento de ações trabalhistas. Além disso, tornou-se comum para as empresas utilizar medidas tais como a rescisão por mútuo acordo, homologação de acordos extrajudiciais e fracionamento das férias.
Já Flávia Vinhaes, acredita que os empresários não estão considerando a demanda agregada. “Como imaginar que os trabalhadores de diversos setores, com maior instabilidade nas relações de trabalho e menores rendimentos, terão algum nível de poder aquisitivo para consumir os produtos feitos por esses próprios empresários. Eu não acredito que as empresas estejam satisfeitas com isso”, ressalta.
Insegurança Jurídica
Mais uma vez, os dois especialistas em direito do trabalho concordam que a revogação da reforma trabalhista pode sinalizar um retrocesso e insegurança jurídica para o setor produtivo e de investidores no Brasil. “Falarmos em revogação da reforma, a meu ver, é dar um passo atrás, na direção da instabilidade social e insegurança jurídica num País já tão castigado por esses dois fatores. O País já vive esse cenário considerando que modificações ainda não puderam ser implementadas pelos empregadores por conta da insegurança jurídica trazida por questionamentos judiciais de vários artigos da reforma”, complementa Karolen.
No entanto, para a presidente do Corecon-RJ o País já vive um período de insegurança jurídica. “Na minha percepção nós já temos um problema estrutural. Revogar a reforma trabalhista seria uma possibilidade de arrumar o estrago que já foi feito. Alguns pontos precisam ser revogados como o final dos sindicatos. Alguns podem ser mantidos e outros terão que ser criados pensando em uma nova legislação trabalhista para novos fenômenos como o teletrabalho”, explica.
Negociação salarial
O processo de negociação salarial, com a reforma trabalhista, passou a fazer uso de acordos individuais. A figura do sindicato continua presente na discussão sobre condições de trabalho e reajuste salarial, mas os órgãos só são responsáveis pelos acordos coletivos. Os especialistas também divergem neste ponto. Para Matsumoto e Karolen, as negociações individuais podem ser benéficas já que são aplicadas somente aos chamados trabalhadores hipersuficientes, ou seja, aquele empregado que possui autonomia de negociação dos termos e condições de trabalho.
Porém, Flávia ressalta que o processo prejudica a aplicação do direito do trabalho e a atuação do sistema público de proteção. “A gente não tem mais Ministério do Trabalho ou a atuação dos sindicatos. Essas mudanças destroem o arcabouço institucional que dava uma proteção ao trabalhador e deixaram de existir. Isso coloca o trabalhador em uma negociação com forças distintas, já que ele precisa do seu emprego para sobreviver e as vezes se submete às condições do empregador”, afirma.
O que esperar do próximo governo?
De acordo com Matsumoto, um próximo governo pode mudar as normas da reforma. “A depender do partido ganhador das eleições presidenciais e no Congresso isso pode mudar, já que a reforma teve seu alicerce infraconstitucional”, completa. Karolen, por sua vez, ressalta que a eventual alteração nessas condições devem ser parte do debate eleitoral e isso pode afetar as negociações entre mercado e trabalhadores como um todo.
“Recolocar o tema do trabalho na agenda é fundamental. É preciso entender qual é o mercado de trabalho se deseja para o Brasil e precisamos rever alguns pontos da reforma trabalhista. A questão da negociação coletiva e o papel das organizações sindicais é de extrema importância. Precisamos olhar para o crescimento econômico, pois ele é fundamental para a formação de empregos”, finaliza Flávia.