DINHEIRO ? Por que o chamado networking, essa rede de relacionamentos, se tornou tão importante no mundo dos negócios?
JOÃO DORIA JR.
? Isso se deve ao espírito latino. Os brasileiros e os latino-americanos valorizam muito o relacionamento pessoal. O olho no olho, o contato e uma relação afetiva representam um fator determinante para se fechar ou não um negócio.

DINHEIRO ? É uma peculiaridade latina?
DORIA
? Aqui ela é mais destacada. Nos países de origem anglo-saxã, a relação é mais fria e mais formal. Analisa-se o negócio em si e ponto final.

DINHEIRO ? Aqui é diferente?
DORIA
? Em parte. Sempre se analisa a viabilidade econômica, o custo-benefício, a capacidade de entrega e todos os fatores que cercam um negócio. Mas o bom relacionamento pode ser o fator de desempate. É a ponte que agiliza o entendimento entre as partes e que ajuda a corrigir os problemas que, circunstancialmente, podem surgir. Quando as partes se conhecem, elas sabem com quem tratar em caso de dificuldade, o que é muito melhor do que lidar com um ente frio ou abstrato.

DINHEIRO ? Dá-se preferência a quem já se conhece?
DORIA
? O empresário não fará jamais um negócio com uma pessoa de seu relacionamento pior do que aquele que ele faria com alguém desconhecido. Mas eu tenho 100% de certeza de que, em condições iguais, terá preferência aquela pessoa com quem o empresário se relaciona bem.

DINHEIRO ? Na hierarquia, vem então o bom negócio com quem se conhece, o bom negócio com quem não se conhece e só depois um negócio regular com um conhecido.
DORIA
? A escala é correta. Mas é difícil que o empresário faça um negócio regular só porque do outro lado da mesa está um amigo. Esse tempo já passou.

DINHEIRO ? Qual o melhor caminho para se criar uma boa rede de contatos?
DORIA
? O jeito mais fácil e eficaz é ser um membro atuante do Lide. Mas, brincadeira à parte, existem algumas regrinhas básicas. A primeira é freqüentar reuniões associativas ou empresariais. Um empresário, mesmo que seja o mais eficiente em seu setor, só tem a perder se decidir adotar uma postura omissa em relação aos interesses do seu segmento. Alguém estará atuando no lugar dele.

DINHEIRO ? Afora a presença nos encontros, qual a etiqueta básica para se relacionar bem?
DORIA
? Eu diria que retornar as ligações em no máximo três dias é essencial. A pessoa pode ser breve, mas tem que ser atenciosa. Pode ser objetiva, mas tem que responder. Isso é fundamental.

DINHEIRO ? E quando surge uma proposta de um negócio indesejado?
DORIA
? Seja sincero. A sinceridade nunca machuca. O que machuca é a falta de resposta. Isso gera desgaste. Ninguém fica incomodado em receber um não, desde que ele seja educado e franco.

DINHEIRO ? O que mais é importante?
DORIA
? Nunca incomodar sem que haja uma razão concreta para isso. O executivo ou empresário deve ter consciência da importância do tempo do outro. O negócio que se oferece ou o pedido que se faz devem ter legitimidade. O relacionamento só deve ser usado para algo que crie valor para os dois lados.

DINHEIRO ? E os concorrentes? Eles devem sentar à mesma mesa?
DORIA
? Os empresários devem exercer a concorrência na plenitude, devem disputar o mercado, mas devem ser leais. Para que a lealdade exista, é preciso que haja canais de comunicação. E, muitas vezes, existem assuntos de interesse comum que em nada desrespeitam o consumidor ou ferem os princípios da competição. É para isso que existem as entidades de classe.

DINHEIRO ? Como começou o Lide?
DORIA
? Foi há 11 anos. Nos intervalos do Show-business, meu programa de entrevistas com empresários, eu percebia que o executivo A gostaria de conhecer o B, que gostaria de conhecer o C, que gostaria de conhecer o D. Foi essa constatação que me deu o incentivo para realizar o primeiro encontro empresarial, que eu chamo de ?meeting?, em 1995. O Lide foi uma conseqüência disso e acabou nascendo há três anos, em junho de 2003, quando já havia massa crítica. E hoje há, pelo menos, um evento por mês. Até porque relacionamento é constância.

DINHEIRO ? Sem isso, esfria?
DORIA
? Claro. Isso vale para tudo. Até casamento.

DINHEIRO ? Há exemplos de aproximação no Lide que redundaram em negócios importantes?
DORIA
? Há vários. Um caso que eu posso citar, porque já foi mencionado publicamente num encontro nosso, foi a contratação do Paulo Zottolo, para chefiar operações da Philips na América Latina. O Marcos Magalhães, CEO da companhia, disse que conheceu o Zottolo no Lide. Mas o relacionamento vai além disso. Nos encontros, o empresário realiza negócios, viabiliza parcerias, mas também faz amigos. É um conjunto muito positivo de conquistas.

DINHEIRO ? Surgiram amizades?
DORIA
? Claro. Formaram-se parcerias para o tênis, o futebol, o golfe, a gastronomia, o vinho, e assim por diante. Ao se relacionar, a pessoa busca as suas identidades de comportamento, posicionamento político e postura de vida. Criam-se comunidades concretas. E, nesses encontros, alguns muito descontraídos, é possível captar todos os aspectos da personalidade do outro. Coisas que só são percebidas quando se conta uma piada ou quando se pratica um esporte.

DINHEIRO ? O sr. criou uma versão feminina do Lide. Qual o objetivo?
DORIA
? Na verdade, criamos o Lidem, grupo das mulheres líderes empresariais. Ele surgiu para valorizar, através das mulheres, a liderança delas no setor privado e no setor público. Elas são sensíveis, leais e mais justas do que os homens. Além disso, temos o Empresários para o Desenvolvimento Humano, o EDH.

DINHEIRO ? Na sua empresa, há uma predominância de mulheres.
DORIA
? A participação é de 92%.

DINHEIRO ? Quase um harém.
DORIA
? Um harém de eficiência.

DINHEIRO ? Qual o papel do EDH?
DORIA
? A idéia é somar a força das empresas pelo bem. Antes, tínhamos muitas empresas com ações pulverizadas. Agora, estamos focando as iniciativas em educação básica, com a supervisão da Viviane Senna e do Instituto Ayrton Senna.

DINHEIRO ? Você identificaria segmentos empresariais onde o networking amadureceu mais?
DORIA
? Essa prática é mais adensada no setor de serviços, um segmento que, nos últimos anos, se comportou de forma mais dinâmica do que a indústria e o comércio, que têm tradição centenária.

DINHEIRO ? Todos os setores da economia já têm suas entidades de classe. Qual a importância do relacionamento entre empresários de setores distintos?
DORIA
? A miscigenação é o que explica grande parte do êxito do Lide. Conosco, não existe um setor dominante, o que é altamente positivo. Empresas de serviços atuam para a indústria, que vende para o comércio. E, assim, criam-se oportunidades.

DINHEIRO ? O banqueiro André Esteves, do Pactual, fez sua primeira aparição pública no Lide. O que ele ganha com isso?
DORIA
? Ele se realiza participando do Lide. O relacionamento só não é bom para quem já está aposentado. O André tem 38 anos, é jovem, brilhante e bem-sucedido. Agora, será presidente do UBS Pactual e terá, no mínimo, mais 20 anos de vida empresarial útil. É um homem cheio de planos e que realizará mais se estiver bem relacionado. Ele poderia passar o resto da vida num iate, mas é uma pessoa que quer empreender. Ele não é alguém que trabalhe por dinheiro. Ele trabalha pela realização. É um belíssimo exemplo.

DINHEIRO ? Isso é um traço comum nos empresários de sucesso?
DORIA
? É comum nos empresários com os quais eu me identifico. Quem trabalha para realizar é alguém que ganha muito e é feliz. Quem trabalha só para ganhar pode até ganhar, mas tem grande chance de ser infeliz.

DINHEIRO ? O sr. vê espaço para expandir o Lide em outros países?
DORIA
? É possível sim, explorando identidades regionais. Uma possibilidade concreta é criarmos um grupo de líderes do Mercosul.

DINHEIRO ? Ao se relacionar, o empresário faz negócios. Mas qual a importância para o executivo?
DORIA
? Faz enorme diferença. O executivo não só traz benefícios para a sua empresa como também extrai benefícios para si. E isso de forma ética e legítima, sem nenhuma deslealdade para com a empresa. O bom relacionamento é algo que ele carregará por toda a vida.

DINHEIRO ? O sr. também tem se engajado politicamente, organizando eventos de apoio ao candidato Geraldo Alckmin, do PSDB. Por que essa opção?
DORIA
? O empresário não deve se omitir. Eu tenho apoiado o Geraldo porque quero um Brasil mais decente, com maior crescimento econômico.

DINHEIRO ? Mas muitos palestrantes são do PT.
DORIA
? Claro. A minha preferência política não deve afetar a pluralidade de opiniões. O nosso próximo palestrante será o ministro Guido Mantega.