A Argentina, no segundo mandato de Cristina Kirchner, entra numa fase de relações belicosas, tanto no campo comercial como no político. Abriu frente de batalha, mais uma vez, com a Inglaterra pelas Ilhas Malvinas e ameaçou com fechamento dos portos, boicote a embarcações britânicas e denúncia vaga de militarização do eixo do Atlântico Sul. Com o Brasil, resolveu rasgar contratos, como virou rotina, e estabelecer a ferro e fogo que ele compre mais e melhor de seus fabricantes locais. Diz Kirchner que a Argentina produz muita coisa que o Brasil prefere encomendar de outros países. Exige mudanças nesse comportamento, sob pena de retaliações veladas – já adotou a morosidade dos processos, por exemplo. 

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Repetindo seus antecessores, Kirchner ignorou sem cerimônia os acordos firmados na base de compromisso bilateral e passou a pedir mais na esperança de que o governo brasileiro – como já ocorreu em ocasiões anteriores – ceda a suas investidas. Essa relação nada profissional, na base da conveniência de um único lado envolvido, tem gerado enormes prejuízos para fabricantes brasileiros. Há poucas semanas, a mesma Argentina passou a impor que toda e qualquer importação, antes de aprovada, siga um trâmite burocrático que inclui a elaboração de uma espécie de declaração juramentada antecipada à Receita Federal local. O procedimento retarda ainda mais o fluxo do comércio e, em certos casos, inviabiliza o negócio, dado o vencimento do prazo de vigência das mercadorias, que acabam se estragando na alfândega. 

 

Até pela desproporção das economias, as compras entre os dois países são historicamente desiguais. Os argentinos produzem mercadorias de menor valor agregado e, em muitas situações, com padrão de qualidade inferior ao de outros fornecedores que vendem para o Brasil. Por essas e outras razões, não é crível montar, seja com qualquer parceiro, uma via comercial bilateral baseada na regra da igualdade de demanda e oferta. Na escalada protecionista a que se propôs, Kirchner tenta salvar o parque industrial local empurrando a conta para os outros. Tem poucas chances de sucesso nessa empreitada. No plano das discussões diplomáticas ninguém está mesmo disposto a ceder espaço para atender um mandatário que não cumpre com o combinado. O Brasil não pode ser o primeiro.