Há um ano, a descoberta de que provas haviam sido roubadas na gráfica contratada para imprimir o Exame Nacional do Ensino Médio transformou a maior avaliação do País em caso de polícia. Há uma semana, erros de impressão em 20 mil exemplares dos testes voltaram a colocar a credibilidade do Enem na berlinda. 

E os desdobramentos da história foram dramáticos para os estudantes. A Justiça Federal do Ceará suspendeu os 3,3 milhões de provas aplicadas para resguardar os alunos prejudicados. Sob pressão, o ministro da Educação, Fernando Haddad, pronunciou, confiante, que o exame não será anulado. 

Mas o estrago já estava feito. No governo, voltou a rondar o fantasma do prejuízo de R$ 140 milhões decorrente da invalidação do exame de 2009. “A prova do Enem é tecnicamente sustentável sob todos os pontos de vista, e vamos defender isso até a última instância”, declarou Haddad, na segunda-feira 8.

 

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Fernando Haddad: o ministro da Educação reconhe o erro, mas diz que a prova não deve ser anulada

 

Para o MEC, aplicar um novo Enem representaria um prejuízo ainda maior do que o absorvido no caso do roubo das provas. Essa edição custou aos cofres públicos R$ 182,9 milhões em contratos que abrangem um esquema de segurança do Exército, logística, elaboração das provas e serviços de impressão – onde ocorreu o erro. 

 

A falha técnica da gráfica, porém, teve origem dentro do MEC, no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), responsável pelo Enem. Coube ao órgão indicar servidores para checar provas pré-impressas do exame e a impressão final dos cadernos de questões e de respostas. 

 

Um dia depois do exame, o presidente do Inep, José Joaquim Soares Neto, chegou a admitir falha nas revisões, mas sem revelar onde ocorreu o problema. Nem precisaria. Logo depois, a gráfica R.R.Donnelley assumiu a culpa pela falha de impressão e garantiu que cobriria todos os prejuízos gerados pelo problema. 

 

Criado para avaliar a qualidade do ensino médio, o Enem evoluiu na gestão de Fernando Haddad para um exame de acesso ao ensino superior. Todas as 59 universidades federais aproveitam as notas da avaliação para selecionar seus alunos. Ao todo, são mais de 48 mil vagas selecionadas a partir de notas tiradas na avaliação. “As falhas que ocorreram não foram tão graves, há muito estardalhaço. Mas a pressa por uma solução é fundamental”, disse Antônio Carbonari, diretor da Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior (ABMES).

 

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Polêmica: 20 mil exemplares da prova do Enem foram impressos com erros

 

Desde que passou a classificar alunos para ingressar no ensino superior, o exame trouxe a perspectiva de redução de gastos para universidades e faculdades, o que poderia até eliminar os vestibulares. Como o Enem avalia conhecimentos gerais e aplica prova de redação, não haveria necessidade de aplicação de avaliações próprias. 

 

Carlos Monteiro, especialista em educação da CM Consultoria, estima que os vestibulares custem R$ 50, em média, por candidato. “Temos 2,5 milhões de alunos nas faculdades privadas. Se 1 milhão vier pelo Enem, temos uma economia de R$ 50 milhões”, ilustra. Nesse cenário, o Brasil se aproximaria do sistema em vigor nos Estados Unidos, conhecido como SAT.

 

Criado em 1901, ele passou por crises. Em 2005, uma falha nos cartões de respostas resultou em notas mais baixas para 4,4 mil estudantes. Depois de dois anos de disputa, o College Board, organizador da avaliação, aceitou indenizar os alunos em US$ 2,8 milhões. Há, contudo, duas diferenças entre o sistema americano e o Enem. O SAT é aplicado sete vezes ao ano.

 

Essa desconcentração é vista por especialistas como uma possível alternativa ao gigantismo do exame brasileiro. A segunda é conhecida como Teoria de Resposta ao Item (TRI), um sistema que garante que as provas aplicadas, mesmo diferentes, tenham o mesmo nível de dificuldade.

 

Por ser recente, porém, o Enem ainda não tem parâmetros que garantam isonomia. O presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino e reitor da Universidade Federal de Goiás, Edward Madureira Brasil, minimiza a polêmica. “É um percentual muito pequeno”, diz. A Justiça decidirá.