19/04/2022 - 2:50
A Rússia lançou dezenas de ataques na madrugada desta terça-feira (19) no leste da Ucrânia, horas depois que Kiev anunciou o início da grande “batalha pelo Donbass”, região na qual Moscou concentra seus esforços após quase dois meses de guerra.
“Estamos implementando gradualmente nosso plano para libertar as repúblicas populares de Donetsk e Lugansk”, os territórios separatistas pró-Rússia no leste da Ucrânia, disse o ministro da Defesa, Serguei Shoigu, que acusou os países ocidentais de “prolongarem” o conflito entregando armas para Kiev.
Mais cedo, seu ministério anunciou que o Exército havia neutralizado 13 posições ucranianas no Donbass, incluindo a cidade-chave de Sloviansk, e bombardeado “outros 60 alvos militares”, alguns na linha de frente oriental.
Ao todo, 1.260 alvos militares foram atingidos por mísseis e artilharia nas últimas horas, durante as quais as forças russas também destruíram dois depósitos de mísseis e abateram um caça ucraniano nas regiões do leste do país, acrescentou.
Além disso, o ministério lançou um aviso “aos militares do Exército ucraniano”: “Não testem a sorte, tomem a decisão certa, a de encerrar as operações militares e depor as armas”.
Mas as autoridades ucranianas, que começaram a receber na segunda-feira (18) os últimos US$ 800 milhões em ajuda militar aprovada pelos Estados Unidos, não parecem dispostos a atender às exigências de Moscou.
“Não importa quantos soldados russos sejam trazidos para cá. Nós vamos lutar. Vamos nos defender”, alertou o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, depois de anunciar o início da batalha pelo Donbass.
Essa região de mineração parcialmente controlada por separatistas pró-russos daria a Moscou uma faixa de terra da costa sul da Ucrânia até a península da Crimeia. Esta última foi anexada pela Rússia em 2014.
O grande obstáculo nessa ambição continua sendo a cidade portuária de Mariupol, sitiada há semanas. Nela, as últimas forças ucranianas entrincheiradas no vasto complexo industrial de Azovstal receberam um novo ultimato de Moscou.
Horas depois de exigir sua rendição, o Exército russo afirmou ter aberto um corredor humanitário nesta terça para retirar os soldados ucranianos presentes em Azovstal.
“As forças russas abriram um corredor para permitir a saída de militares do Exército ucraniano e dos combatentes de formações nacionalistas que depuserem as armas voluntariamente”, anunciou o Ministério russo da Defesa, acrescentando que este dispositivo começou às 14h locais (8h em Brasília).
– “Vão embora!” –
O aumento dos bombardeios no Donbass levou as autoridades ucranianas a suspenderem, pelo terceiro dia consecutivo, a implantação de corredores humanitários seguros instalados para a retirada de civis.
“Hoje, 19 de abril, infelizmente não há corredor humanitário. Os bombardeios intensos continuam no Donbass”, disse a vice-primeira-ministra ucraniana, Iryna Vereshchuk, assegurando que “os russos se recusam a abrir um corredor”.
Apesar da ausência dessas rotas de retirada seguras, as autoridades locais instaram os civis a fugirem da zona onde, segundo um oficial de defesa dos Estados Unidos, a Rússia adicionou 11 grupos de batalhões táticos aos 76 já implantados no país.
“Vão embora!”, declarou o governador da região de Lugansk, Sergii Gaidai, nesta terça.
No dia anterior, ele havia relatado a ocorrência de combates “incessantes” em várias localidades e a perda da pequena cidade de Kreminna. Situada a cerca de 50 km de Kramatorsk, trata-se da capital “de facto” do Donbass ainda sob controle de Kiev.
“Milhares de habitantes de Kreminna não tiveram tempo de fugir e agora são reféns dos russos”, denunciou Gaidai, cujas afirmações sobre a queda desta cidade foram desmentidas por um assessor da Presidência ucraniana.
Na região vizinha de Donetsk, também no Donbass, os russos bombardeiam “na direção de Marinka, Ocheretyne e Avdivka”, disse seu governador, Pavlo Kirilenko, observando que a situação “é difícil, mas sob controle”.
– “Não há locais seguros” –
Sem corredores, fugir é impossível para muitos civis apanhados nos combates por semanas.
“Não temos mais dinheiro, não temos gasolina, não podemos sair”, lamentou Nadia, uma moradora de 65 anos da cidade de Novodruzhesk.
“Estamos sendo bombardeados por todos os lados. É um milagre que ainda estejamos vivos”, desabafou esta mulher, com a voz trêmula.
Deste povoado a uma dúzia de quilômetros de Kreminna, as forças ucranianas atacaram, ontem, a cidade vizinha de Rubizhn com artilharia e morteiros.
Embora o foco esteja no Donbass, a Rússia também atacou outras partes do país. Na segunda-feira, bombardeios mortais foram registrados em Kharkiv (nordeste), a segunda maior cidade do país, e em Lviv, a grande cidade ocidental que se tornou um refúgio para os deslocados.
“Hoje (segunda-feira), entendemos claramente que não há lugares seguros na Ucrânia. É muito perigoso”, disse a bancária Natalia à AFP, nesta cidade, onde pelo menos sete pessoas morreram.
O conflito já provocou quase cinco milhões de refugiados em outros países e mais de sete milhões de pessoas deslocadas internamente, segundo as Nações Unidas.
O Donbass está na mira de Moscou há muito tempo. As forças separatistas receberam seu apoio desde o início da guerra contra Kiev em 2014 e, pouco antes de lançar sua invasão em 24 de fevereiro, o presidente Vladimir Putin reconheceu as autoproclamadas repúblicas de Donetsk e Lugansk.
Coincidindo com a intensificação da ofensiva russa no leste, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, convocou uma reunião com seus aliados, para esta terça-feira, para analisar a situação na Ucrânia.
Na véspera, a União Europeia (UE) condenou os bombardeios “indiscriminados” contra civis ucranianos e denunciou “ataques particularmente intensos” no leste, no sul e em Kharkiv.
Em sua tentativa de se aproximar de Bruxelas, o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky disse ontem que espera obter, “em algumas semanas”, o “status” de candidato à adesão à UE, depois de entregar ao embaixador do bloco na Ucrânia, Matti Maasikas, dois expedientes com o pedido para adesão.
burs-bgs/oho/je/dbh/bl/mr/tt