Com grande alvoroço global desde que foi lançado, o ChatGPT impacta asa mais diversas atividades humanas. Para entender se ele também tornará as bancas de advocacia desnecessárias no futuro, o escritório Viseu Advogados decidiu ir além das perguntas básicas e decidiu testar a capacidade da inteligência artificial para gerar contratos reais, com validade jurídica, na área de Direito Societário.

O projeto envolveu alguns clientes do escritório, que toparam ver o resultado. Segundo o sócio Manoel Monteiro, a receptividade dos clientes foi boa e o resultado surpreendentemente positivo. “Explicamos que pretendíamos utilizar a inteligência artificial incorporada aos processos do time e o cliente demonstrou curiosidade para avaliar os resultados”, disse Monteiro.

Após definirem o escopo de trabalho, eles jogaram as informações para obter o primeiro draft do contrato. De imediato, notaram que, para garantir o resultado, primeiro era preciso fazer as perguntas certas e da forma mais assertiva possível ao ChatGPT. Após alguns testes, foram adotados critérios bem definidos como precisão na pergunta; uso moderado de termos técnicos, para facilitar a localização de conteúdo; perguntas bem específica sobre o tema, para evitar interpretações ambíguas, e detalhamento para buscar respostas mais concisas. “É essencial que se use palavras-chave na elaboração de perguntas a fim de obter boas respostas”.

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Com tudo definido, o resultado foi um enorme ganho de tempo na elaboração do contrato, na avaliação do advogado. A ferramenta ofereceu um draft em poucos segundos, o que poupou a carga horária que a equipe teria para pesquisas prévias e elaboração manual do documento. “Mas as informações não vêm prontas para serem entregues ao cliente final. É preciso que o advogado revise minuciosamente tudo e faça os ajustes”, afirmou. A conclusão foi que a ferramenta cumpriu o que era esperado: gerar um draft.

Mesmo com o resultado satisfatório, Monteiro avalia que, por ser uma ferramenta recente, ainda há espaço para melhorias. “Nossa expectativa é que o ChatGPT auxilie nos trabalhos rotineiros, uma vez que ele oferece sugestões de textos, relatórios, contratos e outros documentos de forma rápida e eficiente, dando ao advogado tempo para se concentrar em assuntos mais estratégicos.”

Cautela

Mas é preciso ainda cuidado no uso do poderoso robô, pertencente à empresa Open AI, dotado de inteligência artificial para o processamento de linguagem natural. Apesar de conseguir manter uma conversa por escrito com um ser humano sobre qualquer assunto, ele ainda está em fase experimental. A inovação está aberta para qualquer pessoa que tenha interesse, por meio do site. E, a cada dia, ele ganha mais e mais adeptos em busca de respostas rápidas para as suas perguntas. O que levanta outro questionamento: como ficam os plágios?

Segundo o próprio ChatGPT, plágio é o ato de utilizar o trabalho ou as ideias de outra pessoa sem dar o crédito ao autor original. No Código Penal, o plágio está especificado como um crime de direito autoral no art. 184, com pena de detenção, de três meses a um ano, ou multa. O assunto é preocupante, principalmente nas escolas e universidades. Uma pesquisa do portal de educação do Study.com revelou que, de 200 professores do ensino fundamental e médio, mais de 50 já pegaram pelo menos um aluno utilizando o ChatGPT em seus deveres.

Diante disso, o mesmo estudo quis saber se a solução deveria ser proibida, ao passo que dois terços acreditam que não. Contudo, 70% dos educadores expressam preocupação com o plágio. Para o especialista em marketing digital Filipe Bento, CEO da Br24, esse tipo de receio já existiu antes, em 2001, com o lançamento do Wikipédia: “Toda vez que uma tecnologia promete alterar processos, ela tira as pessoas da ‘zona de conforto’ e demanda uma discussão a respeito do assunto, o que é super saudável”. Mas, segundo ele, como ferramentas elas podem ser usada para o bem, ou para o mal e é preciso cuidado tanto das pessoas como das empresas com os plágios. A conscientização sobre o uso de novas tecnologias é essencial.

Para evitar dores de cabeça, Bento acredita ser importante que as empresas tenham políticas claras e alertem seus profissionais, assim como as escolas seus alunos, sobre seu uso salutar do ChatGPT para acelerar as atividades. “Mas nunca um conteúdo gerado pela ferramenta deve ser compartilhado da forma bruta, sem revisões e checagem de informações falsas ou com viés que podem trazer um risco à imagem e à credibilidade do negócio”, afirma Bento.

As discussões ainda continuarão intensas, na opinião do advogado do Viseu. A Lei de Direitos Autorais Brasileira estabelece em seu artigo 11 que o autor é a pessoa física criadora de uma obra, seja literária, artística ou científica. “A eventual solução sobre a autoria do material produzido a partir do uso de ferramentas de AI deve ser legislativa”, disse ele, acrescentando que o assunto é muito relevante especialmente quando a Microsoft anuncia que lançará sua versão do Office com a integração de uma ferramenta de AI.