Na terça-feira (5), a Arábia Saudita anunciou que vai prorrogar o corte voluntário de produção de petróleo bruto de 1 milhão de barris por dia até o final do ano. Isso significa em torno de 10% de redução. Existe a promessa de que a decisão, iniciada em julho e renovada agora, será rediscutida mês a mês. Mais 1,6 milhão de barris por dia já têm sido cortados de forma voluntária por outros membros da Opep+. Na Rússia, por exemplo, o facão em setembro é de 300 mil, o que deve continuar até o fim do ano. Com isso haverá muitos desdobramentos no jogo geopolítico. E na economia.

O primeiro é inevitável. Menos produção, preço maior. E petróleo mais caro significa mais dinheiro chegando a Moscou para alimentar seus planos de guerra na Ucrânia. A consequência inercial frustra a política externa (comprovadamente equivocada) do presidente americano Joe Biden, de que conseguiria convencer o planeta a boicotar os russos. Sem adesão maciça — só pegaram esse bonde parceiros tradicionais e ainda irrelevantes globalmente, como a Austrália, e os europeus — o que Washington conseguiu foi dar um indesejado empurrãozinho extra na Europa em direção à uma inflação ainda mais elevada. Porque os cortes às importações vindas de Moscou impactaram obviamente preços de energia e alimentos. O remédio deverá vir, em alguns países, por meio de recessão. Um clássico ‘obrigado por nada, míster Biden’.

Em outubro passado, o presidente Biden tentou convencer o governo saudita ­— aliado-chave e quase único para os Estados Unidos no mundo árabe — a não fazer cortes da produção de petróleo. O governo de Riad é quem manda na Opep, mas ignorou os apelos de Washington.

Este ano, o país reiterou que as pressões americanas não seriam bem-vindas e nem teriam sucesso. Num recado incomum, e duro, no fim de maio, o príncipe saudita Abdulaziz bin Salman, que é também o ministro da Energia, disse que “os especuladores” deveriam se preocupar. “Não preciso mostrar minhas cartas, não sou jogador de pôquer… Mas diria para tomarem cuidado.” Para quem apostou que se tratava de blefe, a decisão anunciada na terça-feira mostrou que não foi. Até porque os cortes estão fora da política oficial da Opep.

Os efeitos colaterais da decisão saudita podem respingar até mesmo na próxima reunião do Copom, no fim do mês (dias 19 e 20), que decidirá sobre novos cortes da Selic.

Preços do petróleo pressionados alimentam políticas de juro restritivas do BC europeu e, em especial, do Fed, fazendo com que as taxas sigam elevadas. Inevitavelmente, isso reflete na decisão de cortes aqui.

Até porque nossa inflação de agosto (0,28%) veio acima do previsto (o mercado projetava 0,17%, ou 65% menos). Junte-se na foto uma responsabilidade fiscal que existe somente na cabeça de Fernando Haddad, e não nos gestos e atitudes do governo Lula III. Em resumo, o petróleo sobe lá, a gente paga o pato aqui. Para quem não acredita em Efeito Borboleta, ou nas máximas de Adam Smith, a ‘real economik’ mostra suas lições diariamente.