DINHEIRO ? Na transição da fotografia clássica para a digital, a Kodak parece ter sido mais atingida do que as concorrentes. Dizem eles que foi porque a Kodak era muito dependente da venda de filmes. A empresa errou ao concentrar os ovos numa única cesta?
FALCON
? Não, a Kodak não errou. Basta ver os resultados recentes da companhia. Estamos na liderança dos segmentos em que atuamos. No Brasil, somos líderes há três semestres e crescemos ininterruptamente.

DINHEIRO ? Mas vocês fizeram cortes maiores do que a concorrência…
FALCON
? Todas as empresas da área tiveram de se mexer. Qualquer empresa que sofre uma ruptura de tecnologia tem de ser ágil e reagir. Soubemos fazer isso. Muitas das empresas que passaram por processos semelhantes não existem mais.

DINHEIRO ? Como foi viver a transição do modelo analógico para o digital?
FALCON
? Na verdade, ainda estamos vivendo. As novidades tecnológicas levam algum tempo para chegar em países emergentes, entre dois e três anos em relação aos mercados maduros, e estamos nessa fase. O mercado de fotografia clássica continua forte no Brasil. Só 35% da população tem câmera tradicional e 10% tem câmera digital. Nosso principal mercado continua sendo a fotografia clássica.

DINHEIRO ? A empresa prioriza um modelo na hora de definir a estratégia?
FALCON
? Não, vendemos os dois conceitos ao mesmo tempo. Temos consumidores que continuam fiéis à fotografia clássica e consumidores que já estão na fotografia digital. Esse é o grande desafio da Kodak e no qual nos tornamos um caso de transformação empresarial. Olhamos com cuidado os dois mundos, que são completamente diferentes. Tecnologia é um dos produtos mais perecíveis que existe. Depois de três meses, o produto já é passível de ser trocado e a empresa tem de acompanhar esse ritmo. Já na fotografia clássica há toda uma infra-estrutura de suprimentos, logística e estratégia de colocar os produtos no mercado.

DINHEIRO ? Que mudanças esse processo de transição trouxe para o Brasil?
FALCON
? O País se tornou o único lugar, fora da China, onde se fabricam câmeras digitais. A produção começou a ser feita em Manaus, em junho. Produzimos aqui a C-360, com 5.0 megapixels de definição, por R$ 899.

DINHEIRO ? Mas a empresa teve de fazer demissões…
FALCON
? Tínhamos, até o ano passado, duas fábricas. Em São José dos Campos, fazíamos acabamento e embalagens de filmes e papel, bem como a cobertura do papel com componentes sensibilizados, além de Manaus. Em função do balanceamento da demanda global, decidimos transferir a parte de acabamento e embalagens para Manaus. Aquela unidade supre o mercado nacional, a América Latina e serve como uma planta backup para outros mercados globais.

DINHEIRO ? A fábrica de São José foi fechada?
FALCON
? Como fábrica sim. Mas a planta foi transformada em área de distribuição e logística e abriga toda a parte administrativa, que cuida da operação do Brasil, Chile, Uruguai, Argentina e Peru. Transformamos a fábrica num centro empresarial e permanecemos na cidade com responsabilidade adicional, que é trazer outras empresas para dentro dessa área. Já alugamos um dos prédios para uma fabricante de válvulas industriais. Colocamos os espaços para alugar e estamos trabalhando em parceria com a prefeitura de São José dos Campos.

DINHEIRO ? E os funcionários?
FALCON
? Com o encerramento da manufatura, reduzimos por volta de 600 pessoas, dos 1,3 mil funcionários. Mas, antes de fechar a fábrica, em outubro, fizemos uma feira de profissionais. Como tínhamos certeza de que poderíamos oferecer excelente ativo no mercado, que eram profissionais treinados, chamamos várias empresas, cujos departamentos de RH montaram estandes na feira. Nossos funcionários apresentaram seus currículos e por volta de 70% deles já se recolocaram. Ao mesmo tempo, a Kodak se empenhou em ajudá-los em outras demandas. Muitos preferiram abrir seu próprio negócio e a empresa ajudou no treinamento, por meio de uma parceria com o Sebrae. Outros queriam entender mais de computadores, por exemplo, e a empresa os treinou.

DINHEIRO ? O processo aconteceu após as demissões?
FALCON
? Não, bem antes. O anúncio do encerramento da linha de produção foi feito sete meses antes para que as pessoas pudessem se preparar para o futuro. Esse é um ponto essencial no processo pelo qual passamos. Tentamos evitar ao máximo surpresas, principalmente as ruins. Nosso lema é: ?Comunicação, comunicação, comunicação.? Todo fato novo que tivemos, durante esse processo, comunicamos aos funcionários.

DINHEIRO ? Antonio Perez, presidente mundial da Kodak, comparou o processo que a empresa atravessou a tirar um cavalo arredio de um estábulo. Num primeiro momento, ele se move lentamente, mas depois ganha velocidade, trota e galopa. Foi o que aconteceu no Brasil?
FALCON
? Em época de Festa do Peão de Barretos, eu diria que o cavalo está andando, nós descemos e subimos, laçamos o garrote e continuamos cavalgando, mas com o cavalo sempre sob nosso controle.

DINHEIRO ? Quanto tempo levará a migração completa para a fotografia digital?
FALCON
? Essa é a pergunta de um milhão de dólares. Mesmo em mercados maduros, a fotografia clássica não desapareceu completamente. É importante ressaltar que essa migração foi feita também em outros segmentos. Uma das áreas mais importantes para a Kodak é a de comunicação gráfica, na qual foram feitas aquisições de US$ 2,6 bilhões. O resultado é que somos hoje a empresa que tem a solução mais completa nessa área de comunicação gráfica. Também estamos vendendo serviços como o de digitalização dos documentos das Casas Bahia. É uma área que está crescendo bastante e a Kodak quer participar desse mercado cada vez mais.

DINHEIRO ? Mas a empresa pretende sair da área de saúde.
FALCON
? Nesse segmento, temos soluções fantásticas de equipamentos, softwares de gerenciamento e gestão de tratamento das imagens. Mas nesse momento está sendo feita uma análise estratégica sobre a venda ou aquisição de parte do negócio por um investidor. Não há clareza sobre como ficará essa área nos próximos seis meses. Ao mesmo tempo, temos outras mudanças acontecendo.

 

DINHEIRO ? Como?
FALCON
? Uma delas foi a incorporação da Kodak Policrome Graphics, a KPG, que era uma empresa separada e trouxemos para dentro da Kodak. Somada a todas essas mudanças, também lançamos um novo logotipo, que dá ênfase à nova fase digital. Ainda atuamos forte na área de cinema, em produtos industriais e aéreos e raio X de equipamentos. Todo esse processo ainda vai virar um caso de MBA.

DINHEIRO ? Uma reclamação da indústria fotográfica diz respeito ao contrabando. Muita gente traz máquinas digitais do Exterior e há muita oferta no mercado informal. Como a Kodak lida com isso?
FALCON
? Posso garantir que não se encontra câmera Kodak no contrabando. O consumo interno é muito maior do que o trazido de fora. O parque de máquinas é totalmente legalizado porque a política de preços é muito agressiva e temos um controle muito bom. Com a ajuda de nossa rede de lojas e parceiros, conseguimos detectar rapidamente se ocorre comércio ilegal, que é rastreado até a fonte e eliminado.

DINHEIRO ? O crescimento dos celulares com câmera é uma preocupação para a empresa?
FALCON
? Ao contrário. Um de nossos maiores objetivos é aumentar a impressão. Infelizmente, as câmeras de celular ainda não têm a mesma resolução das máquinas digitais e a fotografia também não é o principal objetivo dos telefones. Ninguém consegue prever qual será o modelo final da convergência, mas não estamos lutando contra ela e sim atendendo à demanda do consumidor.

DINHEIRO ? Em qual medida a impressão é importante para a Kodak?
FALCON
? Estamos focando muito forte na implantação de quiosques. A grande novidade é a conveniência. Imprimimos direto da máquina, do celular, de e-mails ou de CDs.

DINHEIRO ? A política de preços nessa área também é agressiva?
FALCON
? A impressão está barateando cada vez mais, por causa do volume. Tentamos evangelizar o consumidor no sentido de que ele pode perder partes importantes de sua memória se não imprimir suas fotos. Nessa área, estamos, inclusive, resolvendo o problema da caixa de sapatos com fotos. No Kodak Online é possível armazenar gratuitamente certo número de imagens. Estamos testando softwares de catalogação de fotos e reconhecimento de imagens. Por trás disso, está o lema do George Eastman: você aperta um botão, tira a foto e nós cuidamos do resto. Se mudar a tecnologia, nós acompanhamos para você.

DINHEIRO ? Essa migração da empresa para oferecer quiosques, ser hospedeiro de fotos e oferecer outros serviços é uma tentativa de não depender apenas de uma área, como aconteceu com os filmes?
FALCON
? Temos um portfólio que pretende oferecer diversas soluções. Um de nossos objetivos, inclusive, é ganhar capilaridade com a cadeia Kodak Express e trazer o consumidor para imprimir cada vez mais.